quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Vou-me embora...

Diz-nos o ano de 2016 que se vai embora. Que parta. Mas eu sei que, com a sua ida, estou mais velho. Por um lado, não queria vê-lo fugir, porque assim me leva mais 365 dias e vida e igual tempo a menos para andar por cá. Por outro, com a esperança de que os novos tempos sejam melhores dos que os actuais e os passados, espero vê-lo pelas costas. Dilemas. Mas e vida é toda ela um eterno problema, uma viagem entre a realidade que muitas vezes dói e a esperança de novos dias que tragam mais alegria e mais esperança no futuro. 2016 vai-se embora. Adeus. 2017 que venha aí. Mas bom. Se é para isso, apareça. Se é para ser aborrecido, que fique onde está. Num tempo que nem sei se o quero a andar se que fique parado, aqui por terras de Oliveira de Frades, esperamos sempre que o amanhã seja melhor do que o hoje. Talvez assim volte a acontecer... Viva então o novo ano de 2017!...

terça-feira, 20 de dezembro de 2016

20 anos da Confraria dos Gastrónomos da Região de Lafões

Há vinte anos, precisamente no dia 20 de Dezembro de 1996, nascia, oficialmente, no Cartório Notarial de Oliveira de Frades, a Confraria dos Gastrónomos da Região de Lafões, de que me orgulho de ter sido mais um de seus fundadores. Antes, em reuniões preparatórias, andara-se pelos três concelhos, Oliveira de Frades, S. Pedro do Sul e Vouzela, em busca de aderentes a esta causa que teve no saudoso Chefe Silva o seu impulsionador inicial e principal. Para a história, ficaram as reuniões em Oliveira de Frades, Sejães, Monte Castelo, Casa dos Caçadores (Vilarinho-Manhouce), onde houve a cerimónia inaugural e a tomada de posse dos novos órgãos sociais, entre muitos outros locais. Como primeira sede, há a referir a generosidade do então Confrade Benjamim, de Oliveira de Frades, que disponibilizou a sua casa para esse fim. Anos depois, a CM de Vouzela, da presidência do também saudoso Confrade Paulo de Figueiredo, cedeu as instalações onde agora esta se encontra, bem no centro histórico desta vila. Vinte anos depois, hoje é dia de festa de aniversário e de duas dezenas de velas. Uma vida para outras se seguirem...

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Vésperas de Natal muito negras

Já não sei que diga: este mundo está mesmo virado do avesso, com problemas continuados na Síria, uma chaga bélica e social no nosso mundo, com o assassinato do Embaixador da Rússia na Turquia, com possíveis ataques premeditados em Berlim-Alemanha e em Zurick-Suíça, não sabemos onde tudo isto vai parar. Por cá, dia bom para os lesados do BES. E sê-lo-á para todos nós? Não irá sobrar um bocadinho para os nossos impostos? Seja. Aqui, por estas terras de Oliveira de Frades, o costume de pagar desmandos da banca já é prática bem conhecida e azarenta. Logo, o que vier se verá...

domingo, 18 de dezembro de 2016

A riqueza social das nossas terras e a Cornucópia

Eu seu que a Cornucópia é um Grupo de bom Teatro que nasceu e vingou na cidade de Lisboa. Sei também que, agora, passa por algumas dificuldades e aflições. Sei isso e sei que lá passou, em tempos de morte anunciada, o nosso Presidente da República, o afectuoso Marcelo Rebelo de Sousa, que teve todo o meu apoio e só o tenho visto a aumentar de consideração. Mas eu sei também que momentos difíceis passam instituições sem fim por este nosso País fora. Apoios, todas precisam. E uma visitinha ou um empurrão Presidencial vem sempre a propósito. Mas é preciso que distribua esses abraços por todo o lado. Por todo o nosso Portugal. Aqui, nestas terras de Lafões, Oliveira de Frades, S. Pedro do Sul e Vouzela, cá o esperamos...

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Gastronomia tradicional e Estrelas Michelin

Sou natural e vivo numa região, Lafões, onde a doçaria e a gastronomia tradicional têm um enorme peso social, cultural e mesmo económico. Aqui se come a melhor vitela, os melhores pastéis, os de Vouzela, a melhor sopa, a seca, a de Alcofra, o melhor frango, o do campo, de Oliveira de Frades, o melhor cabrito na brasa, o do Salva Almas, S. Pedro do Sul, não parando a lista de muitas e boas iguarias de fazerem crescer água na boca. Não vejo, porém, que nenhuma delas venha a adquirir uma, uma sequer, Estrela Michelin. Essas ficam para aqueles pratos de onde se debica uma qualquer muito boa novidade, mas que fica muito longe da cozinha que por aqui existe. Sem pensar em que essas classificações são coisa menor, continuo com a minha ideia: não destronam as nossas ementas e até as valorizam. Quem vier em busca de tomar contacto com essas pitéus estrelados, não deixa de, para comer bem, dar uma saltada a uma casa que tenha os bons manjares tradicionais. Proponho, por isso, aos agentes que promovem a escolha dos restaurantes para as tais Estrelas que venham até aos locais onde os saberes antigos têm mais sabor e muito mais encanto. Fica o desafio...

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Guterres nos caminhos da ONU e um imposto, por cá, que não cheira bem

Esta semana começou em cheio com o Juramento da CARTA DA ONU pelo nosso António Guterres, num estrondoso momento histórico para Portugal e para o mundo. Prometendo mudança, mostrou ser a pessoa certa para aquele honroso, mas espinhoso lugar. Numa espécie de programa de acção, falou na forma de se lançar mão de novas políticas na abordagem dos problemas que tanto afectam a nossa humanidade, sobretudo em locais de conflito, nas manchas de pobreza e miséria, nas constantes discriminações de toda a ordem, nas intolerâncias, na dura marcha dos refugiados, sem esquecer a atenção a dar à minimização das alterações climáticas. Assim tenha meios para actuar, que ideias e vontade, saber e coragem lhes não faltam. BOA SORTE. Entretanto, por cá, isto continua e descambar: agora, aparece uma voz a propor um novo imposto para pagar a dívida, em cima de uma carga enorme que já suportamos há tempo demais. Creio que Rui Rio, um reputado economista, se enganou, ou tropeçou nas suas próprias ideias. Ou então não as explicou bem: isto é, se conseguir fazer secar outros impostos, talvez esta sugestão não seja descabida de todo. Mas é preciso, então, cortar noutros lados, a fundo, para que a malta fique a ganhar alguma coisa. Se é para a balança não mexer, que fique muito quietinho, ou mesmo calado...

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Infelizmente, mensagens de ontem e de hoje...

Tecido económico da região de Lafões mudou tudo Um novo ambiente se respira na nossa zona desde que a economia nos trouxe alterações de fundo: em ciclos e em reboadas diversas, o panorama agrícola virou-se de alto a baixo, primeiro endogenamente, até como resultado de uma pirâmide etária que lhe não era favorável, depois porque a CEE, agora União Europeia, veio impor regras e limitações que, vistas à distância de mais de duas décadas, também não foram a melhor solução, mas fizeram grossa razia nesse sector. Por fim, uma crescente industrialização sentenciou uma nova fase, não a perca total dos trabalhos no campo, mas este a converter-se em esquema complementar, como função e como fonte de rendimento. Num olhar para trás, para as últimas dezenas de anos do século e milénio anterior, descobre-se facilmente uma nova ordem económica e social nestas nossas terras. Com a agricultura em segundo plano, ganharam a dianteira, numa primeira viragem, a avicultura essencialmente, seguindo-se-lhe a indústria no seu sentido mais lato, ou mais específico. Com a vinda do antigo IP5, actual A25, isto alterou-se como que da noite para o dia, sobretudo no concelho de Oliveira de Frades e várias franjas de Vouzela e S. Pedro do Sul. Ultrapassando o turismo, como elo estrutural que também deveria ser, a indústria arrancou ao solo uma percentagem altíssima de mão-de-obra. Por volta de 1980, o sector primário, a agropecuária, cifrava-se em cerca de 70% das funções desempenhadas pela população activa, ou mesmo mais. Despontavam alguns serviços, para apoiarem a citada avicultura, sendo a Cooperativa Agrícola de Lafões, a Uniávila e um punhado de outras empresas um vivo exemplo desta tese, mas pouco mais se ia daí para diante. Com um comércio que nunca foi pujante, com um incipiente turismo, excepto, como é óbvio, as Termas de S. Pedro do Sul, eram escassas as saídas profissionais, sendo a emigração dos anos sessenta e a fuga para os grandes centros o corolário desse quadro apagado em que por aqui se vivia. Com a “vinda” da indústria, tudo se inverteu e, hoje, esse mesmo sector primário é praticamente residual. Já agora, importa dizer-se que, para agravar o panorama pré-industrial, até a resinagem se perdeu, assim como a venda de vinho americano – uma razoável fonte de receita clandestina ainda há décadas – e o gado também se escapou, mercê, talvez, da falta de feiras (quem se não lembra dos Carvalhos e outros comerciantes do sector a carregarem comboios e camiões de bovinos em dias de feira de Oliveira, ou da feira dos 8, ou dos 20?...), factores que se tornaram fonte de empobrecimento de nossas gentes rurais. Felizmente, para o tecido social e económico em que nos suportamos, que hoje podemos falar em 150 maiores empresas (PME) nos três concelhos, cinquenta por cada um. Isso é um prazer como notícia e um alento como ponte para o futuro. Mas não nos sossega, de todo. Com as dificuldades que se abatem sobre todos nós, com a Banca a cortar no crédito de uma forma abrupta e perigosa, com a crise que congela, ou atrasa o consumo, não são risonhos os tempos que para aí vêm. Apesar destas graves constatações, é consolador verificarmos a pujança que estas páginas retratam e nelas se fala apenas de PME – Pequenas e Médias Empresas, sendo que este nosso território tem algumas das maiores e mais destacadas firmas, a uma outra escala superior, que marcam pontos positivos dentro e fora de portas, em muitas áreas de topo e de ponta. Se essa é conversa para outro serão, em termos de PME, não trepando ao céu, podemos declarar que vamos indo no bom caminho, assim a austeridade violenta que se vive não lhes venha cortar as pernas. Se isso acontecer, então tudo vai por água abaixo e reanimar a nossa débil economia será tarefa de meter medo. Esperemos que assim não aconteça. Como não nos queremos alongar muito nestes comentários, terminamos com estas considerações: com um bem haja a quem ainda tem o arrojo de investir, criando riqueza e emprego no meio de tantas adversidades; com um pedido às entidades que têm responsabilidades nestes sectores no sentido de não deixarem esmorecer o ânimo que por aqui se vai notando. E com uma saudação calorosa e carinhosa a todas as micro-empresas que são forte pilar do nosso dia a dia e que não constam desta tabela, onde também se não nota a presença de milhares e milhares de “empresários” de sempre, os nossos agricultores, que, como gestores tantas vezes de parcos recursos, fizeram maravilhas em suas casas, sustentando famílias e tendo o campo a sorrir de vida e produção. Finalmente: que se olhe, de vez e em força, para as PME e as não deixemos morrer na avalanche assustadora de grandes superfícies e marcas brancas que, sendo boas para os consumidores, são a ruína deste tecido económico e social. Em nome ainda da economia social, um outro bem haja a esta gente que inscreve nas suas condutas o pilar da solidariedade que tão útil é a quem mais precisa. Carlos Rodrigues, Janeiro, 2012, in “Notícias de Vouzela”

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Nestas terras de Lafões ainda há bons costumes...

Nas Benfeitas, concelho de Oliveira de Frades, a festa de Nossa Senhora da Conceição é uma tradição que, ano a ano, se celebra na sua capela cheia de arte em pinturas no tecto e de muita devoção popular. Este ano, em modo simples, assim aconteceu. Pessoalmente, tenho de juntar sempre a este evento um agradável convite familiar que ali me leva, bem como à minha família para em família, perdoem-se as propositadas repetições vocabulares, vivermos mais um dia de festa e convívio. Infelizmente, somos cada vez menos, fruto da lei da vida que nos tira aqueles que nos eram muito queridos e agora ali não comparecem. Mas estão sempre presentes. Como estes acontecimentos trazem sempre boa gastronomia, ali, nas Benfeitas, a tradição é o que é, sempre: entre as muitas iguarias, há um divinal cozido à portuguesa, caseiro em tudo, que é jóia rara nestes tempos. Por isso, tem um sabor tão especial que a sua magia se estende de Portugal à Suíça. Com a agenda sempre preenchida desta forma tão cativante em cada dia 8 de Dezembro, em 2017, se Deus quiser lá estarei de novo. O convite já foi feito e aceite, sem pestanejar...

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Boa gastronomia em Lafões

Sem qualquer dúvida, na região de Lafões a gastronomia tem lugar destacado em termos de imagem e de muito bom proveito. Com 20 anos de existência, a Confraria local acabou de publicar, com apresentação no passado domingo, dia 4, a Carta Gastronómica da Região de Lafões, uma notável obra de recolha, pesquisa e divulgação de receitas e ementas, a que se ligam textos vários sobre estas terras, seus saberes e identidades, tudo isto combinado com um requintado painel de fotografias. Se era bom e fácil escolher, por aqui, boas iguarias, agora essa tarefa está ainda mais facilitada com este guião. Vale a pena folheá-lo e tê-lo como ponto de referência e GPS obrigatório para estas questões da boa mesa. Por aqui, garante-se que há tudo do melhor...

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Requiem e esperança, o verso e o reverso da medalha humana

Nestes últimos dias, muito se falou em Cuba e na morte de Fidel Castro. Sei que se perdeu, digamo-lo com franqueza, um mito, um símbolo e um homem com todos os seus defeitos e virtudes. Aqueles e estas foram, porventura, bem evidentes. Eu sei que naquela Ilha houve progressos imensos em educação, saúde e noutros aspectos das nossas sociedades. Mas seria injusto comigo e com a minha consciência se olvidasse os atropelos àquilo que muito prezo: a liberdade, passe o pleonasmo, de se SER livre. O pão é óptimo. Mas pão sem a possibilidade de usar a palavra e o direito de me manifestar não me sabe bem. Atravessa-se na garganta. Eu sei Que Fidel numa Cuba amordaçada e espezinhada pelos EUA, que não podem lavar as mãos quanto ao que de mal por ali foi acontecendo, talvez não tivesse muitos caminhos a seguir. Mas havia um que nunca podia ser tapado: calar as suas gentes foi a pior solução que encontrou. Se me custou perder um Homem, como historiador que gosto de ser, não ponho de lado tudo quanto envolveu a sua vida. Rija foi esta. Mas não isenta de muitas culpas que podia ter evitado. RIP. Contrariamente, numa outra vertente, ao que se chegou a temer, da Áustria nos chegou uma boa notícia - desta vez a extrema-direita não se colou ao poder. Ainda bem. Mas, num dia com contradições, da Itália aportaram nos nossos portos dúvidas sem fim, com um referendo que, sendo expressivo, fez o Primeiro-Ministro cumprir a sua palavra, demitindo-se. O pior são as incertezas que vêm por aí. Já agora, da OPEP e da sua decisão de cortar na produção de petróleo não se augura nada de bom para as nossas economias caseiras. Se o Pai Natal nos não vem salvar, não sei onde é que isto vai parar. Não sei, não...

terça-feira, 29 de novembro de 2016

Minha terra, Oliveira de Frades, com Quartel da GNR renovado

Ontem, dia 28, o concelho de Oliveira de Frades foi dotado, com a sua inauguração, de mais um bom equipamento social. Tratou-se da inauguração das obras de grande restauro e ampliação do velho Quartel da GNR, agora com mais espaço, mais conforto, muito mais qualidade e funcionalidade. O antigo tinha começado a funcionar em 1969, tendo sido beneficiado com pequenas reparações, mas o seu estado inspirava cuidados. Foi então que entrou em cena uma parceria entre o Município e o Ministério da Administração Interna, este a custear os trabalhos, a rondarem 400 mil euros, e aquela a ceder o espaço, em contrato de comodato, por trinta anos. Às cerimónias em causa presidiu a Ministra do MAI, Constança Urbana de Sousa.

domingo, 27 de novembro de 2016

Um dia triste, mas...

Quando se acorda e se dá com a notícia da morte de um Primo, está logo o dia estragado. E triste. Foi o que me aconteceu hoje. Tentando espairecer, veio a vitória do SLB e esbocei um sorriso. Caiu o Presidente da CGD e senti que, finalmente, acaba uma dolorosa novela para o cerne da banca portuguesa. Já nem quero saber se há culpados, mas que os há, há e de certeza. Se se aprender com esta lamentável lição de má governação, seja como no póquer: pagar para ver. E nunca mais repetir cenas desta natureza. Por mais que me digam em contrário, ali houve mão governamental a prometer o que não devia, nem podia. Seja. Agora, é preciso dar a volta a isto e pôr a CGD a funcionar. Vamos a isso!...

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Covas do Monte, uma terra do concelho de S. Pedro do Sul em que são rainhas as cabras e rei o seu restaurante

Pelas serras em busca de iniciativas novas Há dias, andámos pela Pena e por lá vimos como se vai dando vida a uma terra que chegou quase a ter a pior das sentenças: ficar vazia de gente e, por isso, morrer aos poucos. Felizmente que esse mau presságio está a ser contrariado em cada dia que passa. Deixámo-la ficar para trás. Mas antes olhámos para uma mensagem escrita em lousa e aqui a estampamos, antes de seguirmos viagem: “ Vale a pena vir à Pena/E ficar com a saudade/Escrever-lhe uma quadra/Dizer adeus à cidade” – A. Almeida. Verdade. Valeu a pena. Mas o “Notícias de Lafões” pede-nos que não fiquemos por aqui. Manda-nos avançar e é isso que vamos fazer. Por sinal, não sairemos da antiga freguesia de Covas do Rio, hoje uma União com S. Martinho das Moitas, uma enorme asneira que, um dia, aqui e noutros lados, foi posta em marcha. Má hora foi essa, repetimo-lo vezes sem conta. Estas são terras pequenas, são, de certeza. Mas têm a sua identidade e os caminhos para se ir para qualquer lado não são dos mais fáceis. No território, agora abrangido pelo novo modelo de divisão administrativa, as distâncias são enormes e a autarquia de proximidade perdeu muito de seu interesse e encanto. Não queremos com isto criticar ninguém que aqui manda, apenas constatamos um facto. Mais nada. E já não é pouco. Num buraco da Serra, mãe de todas as riquezas, desde a água às pastagens, encontra-se a aldeia de Covas do Monte. O nome diz tudo, tal como em Covas do Rio. Encravada lá no fundo, por entre penhascos com cerca de 1000 metros de altitude, a povoação, onde pernoitam cerca de 2500 caprinos e bovinos e poucas dezenas de pessoas, fica a 450 metros acima do nível do mar, este lá tão longe e tão perto ao mesmo tempo. Certo, certo é que dali é impossível enxergá-lo, por mais que se estiquem os pescoços. Falámos em pernoitar e não o fizemos por acaso. Tem esta frase toda a intencionalidade possível. Aquela multidão de cabras, muitas cabras e algumas ovelhas, a que se juntam também algumas vacas, só desce aos currais para dormir, que o resto de sua vida é feito em pleno monte à cata de alimentos naturais, daqueles que ali nascem e crescem apenas para sustentar estes animais. Não se estranha por isso que a sua carne e o seu leite tragam, em si, toda a pureza do mundo. Por outro lado, de salto em salto, a gordura também não pesa no corpo destas reses. Logo, de seu corpo só sai o que é bom, agradável ao gosto e ao paladar e benéfico para a saúde, que ali não há pitada de adubos nem pesticidas. Foi com base nesta riqueza natural que surgiu uma das ideias e iniciativas que aqui nos trouxe: o seu Restaurante, de que falaremos daqui a pouco. Antes, porém, digamos que os “pobreiros”, à vez, vão cuidando desta tarefa e responsabilidade diária, levando pela Serra acima esses milhares de cabras e ovelhas. Livres como passarinhos, só há que as não deixar fugir para locais perigosos, sendo que a erva tenra, a carqueija e outros pastos estão, em todo o lado, à mão de semear, antes, à ponta da língua para os tragar. O pior é quando os incêndios dão cabo disto tudo e então é que a porca torce o rabo. Manhã cedinho, é a saída. Pela tardinha, em dias muito mais curtos de Inverno, quase com computadores na cabeça, logo seguem, como relógios suíços, pelos carreiros abaixo, direitinhas, cada uma delas, aos seus currais. Sem atropelos, nem buzinadelas, o seu trinar típico anda sempre no mesmo tom. Assim procedessem os homens e o mundo estaria muito melhor!... Dos animais ao restaurante Este enorme rebanho de 2500 animais tem a prioridade absoluta. Deixá-los ir no seu passinho certeiro é o que se pede a cada um de nós. Com a sentença escrita logo à nascença, o seu destino está traçado: dar leite e carne para satisfação dos seres humanos. Sabendo que assim é, em modo de produção e comercialização de proximidade, valorizando as suas potencialidades e saberes, acumulados de geração em geração pelos séculos fora (com o seu isolamento até há décadas a ser um mal e um bem, simultaneamente, um mal porque travou estas terras do desenvolvimento sustentado a que têm direito, um bem na medida em que fez cimentar uma identidade que, ainda hoje e por muitos e bons anos, perdura e é a sua indestrutível imagem de marca), lá veio a nascer o Restaurante típico, num sábio aproveitamento da antiga escola primária, fruto da constituição da Associação dos Amigos de Covas do Monte. Bom passo foi este. Acessível, sobretudo, por marcação, ali se degustam os produtos locais em ementas tradicionais que estão inscritas no livro do conhecimento local e que se não têm perdido. Dotando esta aldeia de um particular carinho, muitos são os visitantes e viandantes que ali têm matado a fome e tomado contacto com boas preciosidades à mesa. Entretanto, outros projectos aqui têm sido semeados, como a criação da Eco-Aldeia, no âmbito do “Criar Raízes” que vingou durante alguns anos no concelho de S. Pedro do Sul, em que se pretendeu dar-lhe um estatuto de coisa rara como, na realidade, é, sempre em diálogo com as populações locais. Foram estas também, que, ao som dos chocalhos, juntaram a sua voz para indicar as obras individuais e colectivas que, durante dez dias, em 2013, cem voluntários, dinamizados pela área da Arquitectura da Universidade Católica – Pólo de Viseu, ali andaram a erguer, em termos da equipa “Terra Amada”. Acrescente-se que as Autarquias e o Estado, em geral, também colaboraram e cerca de 50 empresas particulares ajudaram a pôr de pé tudo quanto se projectou, respondendo a anseios e necessidades ali bem sentidos. Covas do Monte, povo rural, foi conquistando tudo a pulso, desde a estrada à água canalizada. Por esse facto, ali vivem o seu dia a dia umas dezenas de estóicos habitantes, que não deixam a sua terra por nada deste mundo. Bem haja por esse sentimento de pertença e orgulho em viverem tão sólida ligação com suas origens. Só assim se mantém coeso e solidário o nosso território nacional, sendo que lá por Lisboa estas questões são esquecidas demais. Perigosamente demais. Carlos Rodrigues, in “ Notícias de Lafões”, 24 de Novembro de 2016

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Se não puder vir a Lafões, dê, em Lisboa, um salto à sua Casa, na Rua da Madalena

É Lafões uma das regiões com mais interesse geral do nosso País,pelas paisagens, pelos monumentos, pela gastronomia e doçaria, pelas acessibilidades (A25 e A24),mas, muito em especial pelas fantásticas Termas de S. Pedro do Sul, as de maior frequência na Península Ibérica, e, ainda muito melhor, pela excelência das pessoas que aqui vivem. Por estas e muitas outras razões, este espaço merece ser visitado vezes sem conta, que há sempre boas novidades a descobrir. Já agora, para quem vive em Lisboa ou nos arredores, há nessa cidade, na Rua da Madalena, a nossa Casa de Lafões que é a "embaixada" natural destas nossas terras. Ir aí é já uma forma de se tomar contacto com aquilo que é e há na zona de origem. Sabendo que esta centenária Instituição está com vontade de ainda melhorar a sua imagem e os seus serviços, bom será que se comece a criar o hábito de por lá se passar. Verão que vai valer a pena...

terça-feira, 22 de novembro de 2016

Apre, já quase não posso ouvir falar da CGD e da CARRIS também não são boas as notícias

1 - Dia a dia, minuto a minuto, raro é o momento em que se não fale na celebérrima, aqui pelas piores razões, CGD. Estou cheio dessa conversa da treta, só porque há uns senhores que se julgam acima da lei e outros que lhes aparam todos os golpes. Consta que, no meio desta trapalhada toda e desde inqualificável impasse, há problemas sérios por e para resolver nesta nossa instituição financeira. Haja tino! 2 - Ainda esta procissão vai no adro e já sinto que, uma vez mais, a mim humilde cidadão do Interior despovoado e sem transportes públicas à altura das necessidades, me irão buscar ao bolso mais uma parte da monumental dívida que a CARRIS deixou: centenas e centenas de milhares de euros para o Estado pagar. Acrescentando: à CM de Lisboa foi dada a gestão desta CASA, mas só na parte do bom presunto, aquele que se come e de que se gosta. Os ossos, os couratos que ninguém quer, isto é, as dívidas, que as paguemos nós os 9500000 pessoas que da CARRIS pouco ou nada beneficiam. Se isto é coesão e solidariedade nacional, vou ali e já venho. À cautela, tenho de começar já a pensar onde vou buscar o dinheiro para mais esta conta que terei de pagar...

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Dependurado da CGD

Esta noite, já sei, vou ter insónias: a Administração da CGD vai discutir, amanhã, se acata ou não a decisão do Tribunal Constitucional e isso tira-me o sono e dá-me cabo dos nervos. Quero dizer que esta dança triste e desengonçada já cheira mal. Sim ou sopas, entendendo eu que se está a valorizar demais um episódio que tem vindo a chamuscar uma série de gente, desde os Administradores a quem os escolheu e a quem lhes dá conversa. Se a CGD fosse uma tasca de esquina, vá lá, agora, sendo um pilar fundamental do nosso sistema financeiro e uma instituição pública, é uma vergonha este impasse. Credibilidade? Onde andas? Tenho a impressão que já está abalada de todo. Por mim, já tinha tomado uma decisão e há muito tempo: querem, querem. Se não querem seguir as normas do nosso Estado, a porta da saída, larga quanto baste, já lhes teria sido franqueada.Depois, quando já se fala num plano B e em nomes concretos, isto raia a maluqueira total. É um absurdo completo. Quem assim fala é um "dependente" financeiro desta Casa, mas começa de ver que assim não se vai a lado nenhum, ou antes, caminha-se para o abismo e isso é que eu não quero.

terça-feira, 15 de novembro de 2016

Repescando uma viagem pelos restos da antiga linha de caminho de ferro do Vale do Vouga...

Linha do Vale do Vouga com feridas várias e muitos pontos fortes Num exercício de busca e tira-teimas, um dia saímos de Pinheiro de Lafões e fomos à descoberta do que resta da velha e inesquecível Linha da Caminho de Ferro do Vale do Vouga, no troço que mais nos diz respeito. Dadas umas voltas até S. Pedro do Sul, no sentido oposto, as conclusões gerais são as mesmas: há ali pista a aproveitar e quanto antes, de um lado e doutro. Sabedores de que anda para aí uma boa ideia, a de pegar este tema de frente e de vez, retomando até iniciativas de outros tempos, quisemos ver como estão as modas a esse respeito. Assim, de bloco na mão, fizemos de carro o percurso que vai da citada localidade até à Lomba, em Cedrim. E daqui não passámos, pelas razões que abaixo se verão. - Pinheiro de Lafões: perdida a Estação em favor de dois blocos de Habitação Social, mantém-se de pé. e em quadro de rara beleza, a Ponte, que, associada à Igreja Paroquial, é um verdadeiro postal ilustrado. Mais adiante, também a Ponte dos Melos nos encanta. Num piso aceitável, deparamos com o Apeadeiro de Nespereira, onde há, antes, um pequeno desvio, que muito nos agradou no seu aspecto e cuidado com que tem sido acarinhado. Alguns “metros” além, um bairro novo e um Nicho de Nossa Senhora, salvo-erro, dizem-nos que ali há vida, mesmo sem comboio. Mas quisemos procurar um outro Apeadeiro, o de Santa Cruz, e tivemos dificuldade nessa missão, talvez porque seja uma ruína e nada mais. Em sinal contrário, ganhámos um piso arranjado nalguns quilómetros, em operação que se não revela muito dispendiosa, mas cai bem. Parabéns a quem teve a gentileza de assim proceder. A seguir à Póvoa, lá estava um dos túneis que são uma constante aquém e além e que bem merecem um arranjo artístico, convertendo-o, este e os outros numa espécie de galerias, ou coisa que o valha. Ao entrar-se em Quintela, surge-nos um pouco de estrada alcatroada, devendo retomar-se a Linha, junto a uma casa branca, à direita. - Arcozelo das Maias – Aqui, sente-se um aproveitamento digno de nota, com a Estação a servir de Sede da Nova Geração, depois de devidamente restaurada. Compõe-se o quadro com um Polidesportivo e um bloco de Habitação Social. Feito mais um curto desvio, o percurso normal, à direita, não se faz esperar. Com piso renovado, outro bom retoque, com bermas limpas, ali não há problemas de maior em circular-se. - Ribeiradio – Ao cruzar com a também sofredora EN16, a Passagem de Nível tem, em frente, um estorvo, já anunciado: uma rede a vedar aquilo que foi “estrada” de ferro, parecendo-nos que ali pode haver solução possível e plausível, procurando-se o consenso para evitar problemas de maior. De qualquer maneira, logo adiante, deparamos com a recuperação da velha Casa do Capataz, também Sede de uma Associação e as magníficas instalações da mais do que centenária Banda Marcial Ribeiradiense, dois pontos que são o orgulho de seus autores e promotores e, um pouco, de todos nós. Vemos ainda um outro pólo de Habitação Social, sinal de vida própria para aquele espaço Nesta marcha, mais um portão a ter de ser repensado – aquele que ladeia o Parque Desportivo que, apesar de estar aberto, deve ser anulado, aqui também com a dose certa de diálogo e serenidade. Quanto ao Apeadeiro de Nossa Senhora Dolorosa, é uma lástima e um desatino aquilo que ali se vê. Entre Ribeiradio e Cedrim, o troço está num estado tal que se não aconselha. Salvam-se os dois túneis do Modorno, que não podem cair no esquecimento, nem a memória de um descarrilamento que ali houve há dezenas de anos. Como ponto de crescente interesse, ali temos a Barragem em todo o seu fulgor. Em termos de oportunidade para o arranque da entrada em funcionamento desta Linha, como pista turística, muito nos agrada a sugestão, que já vimos escrita, de a associar ao futuro – e ansiado, dizemos nós, sem cansar – lençol de água, um outro tempo do tempo que aí vem. - O inferno – Chegados perto do Extremo ( e este nome tem a ver com o fim de um distrito e início de outro, nesta caso, Aveiro e Viseu e Viseu e Aveiro) e dado o estado de abandono a que a Linha está votada, é de parar-se. Retome-se adiante, só para olhar o deserto que é o Apeadeiro de Cedrim, um monte de ruínas também. E de silvas e matagal. No lugar da Lomba, nesta freguesia, a via morreu. De todo. Cortada em grande parte, difícil será agora cosê-la pelas poucas pontas que restam. Mas, com engenho e arte, nada é impossível. Nem ali, onde o mal já está feito. Acabada aqui a nossa viagem, dali para baixo nada mais podemos dizer, por agora. Ficará para outra altura, claro. Partilhando este balanço, o nosso voto vai, inteirinho, para a necessidade de se fazer reviver a nossa velha Linha do Vale do Vouga, mesmo sem comboios, nem automotoras, que se perderam para sempre. Votamos nisso!... Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, há poucos anos

domingo, 13 de novembro de 2016

Pela Serra de S. Macário, S. Pedro do Sul, projectos com pés para andar, artigo publicado no "Notícias de Lafões", 10 Nov16

Sonhos e retornos com pés para andar Falar no fatalismo do despovoamento, sendo uma triste verdade, não ajuda nada a andar para a frente, a não ser como alerta e campainha que façam olhar essa preocupante conclusão em modo de lhe dar a volta. Com um decréscimo populacional de 2232 habitantes, desde 2001 a 2011, com respectivamente, 19083 e 16851 (sendo que o pico máximo conhecido fora em 1950 com 25095 residentes), nota-se que toda esta quebra se dá já em pleno século XXI, quando se pensava que esse flagelo tinha sido uma circunstância dos fluxos migratórios dos anos sessenta e outros, sobretudo para a Grande Lisboa e para a Europa. Assim, ou se procuram sonhos que invertam esses quadros ou este Interior perde-se de vez dentro de algumas décadas, talvez não muitas. Andando em busca de exemplos positivos, que ponham o mundo a sonhar de que é possível ultrapassar estas dificuldades, fomos até a um dos pontos mais famosos deste concelho de S. Pedro do Sul, a Serra de S. Macário, com os seus 1054 metros de altitude, e logo descobrimos, num curto círculo em redor, dois casos que têm tudo para serem apontados como marcas de sucesso e paradigmas de desenvolvimento que vale a pena apreciar, estudar e, sobretudo, replicar noutros sítios, sempre à escala das possibilidades e criatividade de cada um desses outros locais e seus protagonistas de boas caminhadas empresariais. Hoje ficamos pelo Café Salva-Almas, em Macieira do Sul, e pela Aldeia da Pena. À sua maneira, em cada um destes espaços se vêm escrevendo bonitas páginas de empreendedorismo bem sucedido. Comecemos pelo Salva-Almas, uma designação que, só por si, é um compêndio de como criar imagem e boas impressões apenas pelo nome. Isto é, ao saber-se da existência de tal estabelecimento comercial, soa bem a sua marca distintiva, o que faz despontar a vontade de por lá passar em busca de um qualquer encanto que seja mesmo salvífico. Olhando da estrada que, serpenteando, sobe pela Serra acima, logo se nota, nos arredores de Macieira do Sul, junto a um Parque de frondosos castanheiros, uma casa de prestação de serviços ligados à restauração. Parando e desfrutando desse espaço, desfazem-se as dúvidas: é mesmo ali o Salva-Almas. Ainda a mesa não tem nada que nos mitigue a fome e a sede e a alma começa de contentar-se com a arte escultural, com os baixos-relevos, com obras de diversa índole, onde não falta uma pontinha de boa maldade, tudo isto fruto da criação de José de Almeida, fundador e pai de outro Zé, o actual proprietário. Está aberta a ementa para uns momentos e uma refeição bem apetitosa. Da fama da água fresquinha que matava a sede e enchia a alma, veio o nome para esta casa. O resto foi-se fazendo aos poucos até ganhar fama e não ficar a dormir à sua sombra. Pouco depois de se pedir os comes e bebes, lá podem chegar a vitela, o cabrito assado em forno de lenha, a cabidela de galo, o bacalhau também especial e os vinhos a condizer com esses bons pratos. Pelo meio, há sempre uma conversa que muito ajuda a criar bom ambiente. Por experiência própria de há uns tempos, isto mesmo podemos testemunhar. Por leituras diversas, tal se confirma e recomenda. Posto isto, sobe-se mais um pouco esta Serra e vai-se na direcção da Pena. Como este paradisíaco lugar fica lá bem no fundo do monte e a estrada não é nem larga, nem em linha recta, muito pelo contrário, aconselha-se uma condução cautelosa. Se assim se proceder, essa será uma viagem sem qualquer problema e altamente agradável. Quando os pés estiverem colados ao chão desta Aldeia turística, apenas com meia dúzia de habitantes, não se desperdice um segundo sequer que, ali, tudo vale a pena ser visto e absorvido até à medula, pormenor a pormenor. Imperam, na construção das casas, o xisto e a lousa, em terra que ainda é rodeada de uns tantos campos agrícolas com mimos consunidos no local. Por entre estes, se pode vir a contemplar, no Ribeiro que por ali passa, a correr para Covas do Rio, o ponto, em penhascos de meter algum respeito, onde reza a lenda que o morto matou o vivo. Cientes de que ali havia condições para se viver uma vida em contacto com a natureza e em ameno diálogo com o ambiente que os rodeia, o casal Ana Brito e marido, um dia, resolveram fazer daquele seu naco de território, com tanta identidade e valor turístico, o local de eleição para continuarem suas vidas. Assim aconteceu, na verdade. Também António Arouca, ex-residente em Lisboa, tomou a mesma opção e lá se entretém a produzir mel e outras iguarias. Quanto à Ana e marido, criaram o seu comércio, incluindo o ramo da restauração, e lá vendem lembranças, petiscos e umas boas feijoadas, um arroz de cabidela, um cozido à portuguesa, vitela e borrego assados no forno que fazem a delícia de quem quiser saborear tão apetecíveis pitéus, que se completam com o doce de sopa seca e as filhós da Pena. Vendo nesta Aldeia uma rara preciosidade arquitectónica, a Câmara Municipal de S. Pedro do Sul e a Universidade da Beira Interior, Covilhã, através dos Professores Baptista Coelho e Luís Ferreira Gomes, de acordo com o jornal o “Público”, no ano de 2015, estabeleceram um protocolo para com ele se poderem potenciar todas as virtudes, em turismo da natureza, que ali são mais do que muitas, encontrando-se por todo o lado. Estes são alguns dos sonhos que podem dar corda aos sapatos para se alcançar um melhor futuro. Mas há mais por estas bandas, como veremos em próximas ocasiões. Carlos Rodrigues

sábado, 12 de novembro de 2016

Passarada na Vagueira

A Vagueira, terra de mar e praia, no concelho de Vagos, vive muito ligada a actividades que têm no Oceano a sua riqueza por inerência, tais como o lazer de Verão e o peixe fantástico que a Arte Xávega traz para a costa e faz chegar aos paladares de quem tão bem o aprecia. Por aqui, foi, nos últimos tempos, construído um Museu dedicado a essas artes. Curiosamente, neste fim de semana, foi a passarada que povoou aquele espaço em cantarola e animação que ali deram um outro ar de vida e de expressão daquilo que na natureza connosco convive. Tratou-se da XI Exposição de Aves, promovida pela AOCA, com o patrocínio da respectiva Câmara Municipal, em evento que veio a atrair a visita de quem se dedica à apreciação desta bicharada de asas e belo canto. Entre as pessoas que ali quiseram mostrar a sua arte e paixão, vimos o Alexandre com suas araras, cobras, bufos e corujas, da ASSOCIAÇÃO Animal Experience, que corre o País para divulgar esta sua missão: dar a conhecer os seres que, vivendo connosco, nem sempre são conhecidos, sendo até muitas vezes hostilizados e menosprezados. Dizendo isto, somos daqueles a quem os répteis metem uma certa confusão. Tivemos sorte: a cobra que nos foi mostrada estava em sossego total e não se dignou sequer olhar para nós. Ainda bem. A terminarmos, há que dizer que a Vagueira, com esta iniciativa, subiu ainda mais do mar e da terra aos céus de onde nos trouxe estas aves. Como diria S. Francisco de Assis, "vinde a nós bons irmãos da natureza"... Mesmo os répteis, que têm todo o direito a viver...

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Confesso: falhei, não fui aos EUA votar

Pronto. Caiu o pano sobre as eleições presidenciais nos Estados Unidos da América. Ganhou quem eu não queria, nem previa sequer. Perdeu quem eu achava que devia ocupar a Casa Branca. Para aqui vai Donald Trump e não fico descansado, a não ser que mude radicalmente as suas práticas para contrariar o que disse durante um ano. Tenho medo do que aí vem. Tinha dito que ali ia votar. Não fui. Peço desculpa por isso. Com o meu voto Hillary Clinton tinha mais um cidadão a juntar à maioria nacional que teve. Só que com o sistema de grandes eleitores que existe (em 11 dos 50 estados,por exemplo, podem ser conseguidos mais de 290 delegados, bem acima dos 270 necessários para se ser eleito), torna-se claro que nem tudo é linear nas conclusões a tirar. Mas, há que dizê-lo, é este o figurino eleitoral e temos de o aceitar. Não se fez a história que eu desejava, mas sim uma outra bem mais negra. É a vida, mas que me dói, dói mesmo. E muito. Muito mesmo... Creio, em conclusão, que o mundo democrático tem de saber tirar lições deste desaire: os males de que a política enferma foram os grandes causadores deste terramoto. Então, há que mudar e muito tudo quanto diga respeito a actos, omissões, valores agora distorcidos, criando maior afectividade entre eleitos e eleitores e maior proximidade, verdade e transparência. Ou seja: é preciso abanar tudo e traçar novos e atraentes rumos. Depressa, mas bem...

terça-feira, 8 de novembro de 2016

Hoje voto na América

Porque quero participar num momento histórico, que é o de eleger, pela primeira vez (como creio e espero) uma Mulher como Presidente dos EUA, hoje vou ali dar o meu voto a Hillary Clinton. Digo mais: pela importância deste acto e pelas repercussões que tem na esfera universal, sou mesmo de opinião que todos nós deveríamos ser chamados a votar em tais eleições. Eu cumpro o meu dever: dou o meu voto, sem espinhas, a quem pode protagonizar mais um dos tais momentos históricos que marcam a marcha das sociedades e da nações. Já agora, o que eu não quero, por entender que todo o mundo ficaria a perder, é que Trump alcance os objectivos com que sonha. Que, ao voltar, para a sua Torre, por lá fique descansado!... A Casa Branca precisa de outro tipo e estilo de gente.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Repensar os Bombeiros em S. Pedro do Sul

Pensar nos Bombeiros em tempo de calmaria Com um doloroso Verão por estas bandas do concelho de S. Pedro do Sul, em que houve dias de pavor e pânico verdadeiramente aflitivos para algumas das suas povoações e populações mais afectadas, nesta fase de rescaldo em acções e ideias, vamos hoje consagrar algumas linhas a uns protagonistas de excelência em matéria de agentes da Protecção Civil Municipal. Sem se andar com o coração na boca, agora que, passada essa aguda fase, somos obrigados a fazer um exercício que nos leve a que sobre ela se reflita e se tirem conclusões, importa que se tragam para a primeira linha os nossos Bombeiros. Digam o que disserem, eles são os pilares essenciais de todo o esforço colectivo que se faz para proteger pessoas e bens. Voluntários, mas com sólidas bases de conhecimentos técnicos, esquecer o seu contributo essencial é falsear todo e qualquer esquema que se monte para agir em situações de tragédia e catástrofe. Não se descurando o papel de outros intervenientes nestes Planos concelhios, vemo-los sempre como a sua base, ou, numa palavra, como um alicerce sem o qual nada se segura, por mais brilhantes que sejam os argumentos que se venham a escrever nos papéis e a editar em organogramas. Neste território de 348 km2 e de 14, (ou melhor) 19 freguesias, as respostas a este propósito vêm da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de S. Pedro do Sul, com mais de 130 anos de existência e saber acumulado, do Corpo de Salvação Pública da mesma cidade, de fundação mais recente, e da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Santa Cruz da Trapa. Falando-se, desde há anos, no futuro Agrupamento, por enquanto, esse objectivo pouco mais do que saiu do papel. Há mais de seis anos, em Fevereiro de 2010, apareciam, em nomeação, os primeiros dirigentes do recém-criado Agrupamento das Associações Humanitárias dos Bombeiros Voluntários de S. Pedro do Sul, apontando-se como primeira prioridade a construção de um novo Quartel comum. O que se sabe é que, até este momento, ainda não se vê nada de novo quanto a essa ambição. Como estamos, nestes tempos, em período cremos que de pausa, esta é a hora para se voltar a abordar esse complicado processo, se é que se pretende avançar com ele, continuando a juntar esforços e boas vontades. Quando as sirenes encheram os ares dos seus estridentes e apelativos, ainda que dramáticos, sons, nada, nessas alturas, há a fazer a não ser socorrer quem precisa de seus tão importantes e decisivos serviços. Então, qualquer conversa que se pretende serena e ponderada deixará de ter razão de ser. É daqui até Junho ou Julho, se nada houver em contrário, que o diálogo tem de vir ao de cima e ser produtivo. De contrário, será mais uma outra forma de se falar para o boneco, sem quaisquer efeitos práticos. Com missões e funções estruturantes na orgânica da Protecção Civil Municipal, no documento em que se abordam, em esquemas, os papéis de cada um de seus agentes, em 2015, refere-se que, na fase de emergência, cabe aos Bombeiros a prevenção e combate aos incêndios, a participação, em geral, nas diversas prestações de socorros, o transporte de acidentados e doentes, a colaboração em acções de aviso e alerta, bem como em tarefas de ordem mortuária, apontando-se ainda a promoção do abastecimento de água e a disponibilização de instalações para as populações, em caso de necessidade, estendendo-se também à distribuição de alimentos, assistência sanitária e social. No que respeita aos fogos, aquando da fase de reabilitação, devem executar acções de rescaldo, apoiar o transporte de regresso de pessoas desalojadas, seus bens e animais e assegurar o transporte de água potável, entre outros aspectos. Sempre em estreita coordenação e cooperação com os demais elementos e estrutura de comando, que compete ao Presidente da Câmara Municipal, ou em quem tais competências sejam delegadas, por estas enumerações se vê quanto de fundamental está nas mãos de nossos Bombeiros, neste caso, e ainda bem (pensamos nós), voluntários. Agora em que amainaram as suas funções, vai para eles uma palavra de gratidão e reconhecimento por tudo quanto fazem e fizeram, ainda que tudo isto tenha sido dito vezes sem conta. Mas nunca é demais repeti-lo. Por outro lado, parte daqui o nosso voto de estímulo a que prossigam, sempre com a mesma coragem e abnegação, a sua razão de viver no seio de nossas comunidades, em cumprimento dessa fantástico lema, “Vida por Vida”. Na forma como se encontram organizados ou em Agrupamento, desta valorosa gente o que se espera, afinal, é apenas isto e só isto: dar tudo em favor das terras e gentes onde se inserem e de quem, daqui ou dali, lhes bater à porta. Esta disponibilidade total não tem preço. É tudo isso que lhes devemos. Em cada momento e por toda a vida. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, Outubro, 2016

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Tradições religiosas em Campia - Vouzela

S. Miguel em Campia com festa rija Ao encerrar-se o mês de Setembro de cada ano, a freguesia de Campia veste o fato domingueiro, o melhor de todos eles, para vir para a rua festejar o seu Padroeiro, S. Miguel Arcanjo. Estabelecida esta data como feriado local, que sem o ser o é sempre, são vários dias de animação e de religiosidade a que ninguém, por aqui, fica indiferente. O calendário assim determina, a tradição faz permanecer vivo e revivificado este costume que o povo desta terra admira e venera. Por ser localidade importante no contexto concelhio, Campia não se contentou com um Santo qualquer, tendo escolhido um Arcanjo, o santo dos santos. É tão forte a crença em S. Miguel que várias doutrinas religiosas, tais como a judaica, a cristã e a islâmica, lhe prestam uma enorme atenção e todas o estimam nas suas crenças. Porém, a santidade fica apenas para os cristãos. Visto como líder designado por Deus para combater as forças do mal, associa-se, no imaginário e na estatuária, ao poder de esmagar o diabo, representado também pela serpente, tal como se pode ver na fachada da Igreja Paroquial de Campia, em local bem notório e bem ao alcance da vista de todos quantos ali vão ou por ali passam. Tido como Príncipe dos Exércitos, a sua função principal é estar ao serviço do bem do Povo, tudo fazendo para o defender e salvar. Na idade média, era patrono da respectiva cavalaria, havendo santuários a si dedicados desde o século IV, o que prova a longevidade do culto que lhe é tributado ao longo dos tempos. Rezam as crónicas que nem sequer chegou a ser canonizado, até porque já eram frequentes as referências a seu respeito no Antigo Testamento, isto é, muito antes de Cristo e, por isso, anteriores ao próprio cristianismo e á Igreja de Roma. Deste modo, tais cerimónias e designação papal não se aplicaram a S. Miguel. Na sua pessoa, aparece ligado ao bem-estar dos doentes, à protecção dos crentes na hora da morte, intercedendo pela sua entrada nos céus da felicidade eterna, pelo que, nestas múltiplas facetas, se torna mesmo o santo dos santos, para estas gentes da paróquia em festa e para tantas outras espalhadas por esse mundo fora. Se dissemos que é seguido em religiões diversas, as monoteístas, as igrejas católica, anglicana e luterana festejam-no a 29 de Setembro, sendo que noutras latitudes há datas diferentes. Neste mesmo dia, assinalam-se também as devoções a S. Gabriel e S. Rafael. Dada a sua importância e a fama de seus feitos, raramente se ficam por um dia apenas os seus festejos. Neste ano de 2016, como se nota pelo programa em causa, a tradição mantém-se, fruto do trabalho e dedicação dos Mordomos que têm como sua responsabilidade honrar e glorificar o seu Padroeiro, uma vez por ano. Por este ser tempo de colheitas, ao falar-se de S. Miguel, na cultura popular, a operação de cortar o milho e fazer as vindimas anda frequentemente associada ao fazer o S. Miguel agrícola. Este é mais um pormenor que aqui registamos. Com várias orações a seu respeito, terminamos com parte de uma delas: “ ... São Miguel, São Miguel, São Miguel/Aonde quer que eu vá/ Eu sou o seu amor, que me protege aqui e agora... “. Festa religiosa e popular, na união entre o sagrado e o profano, em Campia estes são dias de muita animação. Esta gente de trabalho bem merece estes “intervalos” na sua labuta. E a devoção ao seu Padroeiro dá-lhe ainda mais força para o ano que aí vem. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, 2016

Tópicos para a história da televisão em Oliveira de Frades

A televisão e Oliveira de Frades Em mais um aniversário assinalado pela Rádio Televisão Portuguesa, nascida em Março de 1957, queremos aqui trazer umas notas sofre esse notável facto que, em matéria de conhecimento e de lazer, veio mesmo mudar o mundo. E que razões nos levam a que associemos esta efeméride ao concelho de Oliveira de Frades? Poucas, mas significativas: é que o que hoje é uma banalidade e já não é sequer notícia sabermos que temos centenas de canais ao nosso dispôr, em 1957 não era nada assim. Por estranho que pareça, passados apenas (?) quase sessenta anos, nessa altura, a maior parte das terras deste município ficou de fora dessa nova conquista, por duas ordens de grandeza: em primeiro lugar, por falta de acesso à energia eléctrica e, em segundo, porque a marcha da cobertura pela nova Televisão foi muito lenta, demorando a chegar às diversas localidades. Fenómeno novo, em maravilha da técnica, tornou-se, desde logo, um bem escasso e mais um factor de negativa discriminação. Quem a tinha, estava em nítido avanço em relação com quem a ela não podia aceder. Lembramo-nos de ter sido com espanto que a espreitávamos nos poucos cafés que então a possuíam e a punham ao dispôr de seus clientes e ávidos mirones. Se a memória nos não trai, foi no saudoso Café Ideal, então da gestão e responsabilidade de Aureliano Gouveia, que assistimos, pela primeira vez, a um espectáculo de tourada com enorme abrir de olhos e alta curiosidade. Por pouco, não fugimos daquele mágico local, com medo de que o touro viesse ter connosco, por logo termos percebido que, a preto e branco, entre nós havia um vidro inquebrável e uma distância abismal. Em negócio do século, as casas comerciais, com destaque para os citados Cafés, enchiam-se muitas vezes para as pessoas verem TV, mais do que com o desejo de consunirem alguma coisa. Só que, fora alguns locais onde este “serviço” se pagava ( e sabemos que assim era, ainda que noutras terras, ou talvez também por aqui), atrás dessa espreitadela para o écran, lá vinham uns copos de vinho e uns acepipes quaisquer, o que resultava em lucro para os donos desses mesmos estabelecimentos comerciais. Com esta alta tecnologia a ser, durante décadas, repetimos, décadas, mais a excepção que a regra geral, vamos passar a ilustrar com dados algumas das localidades onde esse alto benefício só veio muito mais tarde. A luz em Oliveira de Frades Dez anos depois, em 1967, eis o panorama (parte), no concelho de Oliveira de Frades, em termos de fornecimento de energia eléctrica: este foi o tempo de nova iluminação pública na vila, quando presidia aos destinos da Câmara Municipal o Dr. António Lopes Ferreira, de Virela, que, aliás, por essa altura da vinda da TV, já tinha pedido a sua demissão; ao mesmo tempo, dava-se início aos trabalhos da electrificação em S. Vicente de Lafões, sendo que Postasneiros, Cajadães e ainda Vilarinho (Souto de Lafões) recebiam a comparticipação relativa à segunda fase desta obra e, em Abril, ali se viam já as linhas de alta tensão. Em Arcozelo das Maias, as queixas iam noutro sentido: falava-se na falta de luz ( e água) no edifício da Sede da Junta de Freguesia. Mas, em vários lugares de Ribeiradio e na freguesia de S. João da Serra, estava-se, depois de dois anos à espera de nova concessão, numa 2ªa fase; em Travanca, a dois passos da Vila, em S. João da Serra, Sejães e Reigoso era ainda apenas de projectos que se davam notícias. Com Dezembro a ser o mês de festa estrondosa em S. Vicente de Lafões, por ter podido acender as lâmpadas eléctricas e vir a ter a possibilidade de ver Televisão, ficariam ainda distantes tais benefícios em muitas outras localidades. Terras houve que só após o 25 de Abril, já com novos poderes locais, vieram a poder carregar no botão e verem acender-se, como que por milagre, as lâmpadas em cada casa e nas ruas. Em extensões para pontos mais distantes, tal aconteceu mesmo muito mais tarde. Para terminar, digamos que, nas Festas da Vila de 1976, a povoação de Travassós desfilou pelo arraial com lanternas a petróleo e tochas, porque de luz eléctrica nem o “cheiro” sentiam. Por tudo isto, aqui trouxemos este tema, em conversa que é como as cerejas. Recordando, melhor conhecemos as nossas origens e mais estimamos a nossa identidade e a dureza de outros tempos. Compará-los com a actualidade, é muito mais acentuada a diferença, imagine-se, que entre água e vinho. Isso é. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”

Um pouco de história da União Desportiva Sampedrense (UDS)

UDS com 70 anos de história Decorria o ano de 1946, quando, no dia 1 de Fevereiro, em S. Pedro do Sul se veio a criar a UDS – União Desportiva Sampedrense. Comemoram-se, então, em 2016, setenta anos de vida e história desta Associação. Nascida num período de agudas dificuldadades, por se ter saído da 2ª Grande Guerra apenas um ano antes, em 1945, foi nesse ambiente, ainda a ferver, que se deu este importante passo. Aliás, um pouco por toda a parte, assiste-se, por esta altura, a um certo incremento em termos de aparecimento destas novas formas de agir em sociedade. Embalados por essa nova onda de uma aragem passageira, as gentes desta terra não esperaram mais, dando corpo a esta iniciativa de carácter desportivo. Como todos os começos, também este não aconteceu num mar de rosas nem em berço de ouro. Foram, pelo contrário, muitas as dificuldades e os improvisos, o que facilmente se compreende. Em caminhada constante, um dia chegou a construir-se o Campo de Futebol na Pedreira, na margem esquerda do Rio Vouga, a curta distância do centro da então vila. Era mais um avanço, que, aliás, se tem mantido desde esses tempos, se bem que agora muito renovado e ampliado, a beneficiar, inclusivamente, de um relvado sintéctico e de condições gerais já bastante agradáveis. Recordamos que (ainda não se passaram assim tantos anos!), as respectiva Direcções fizeram chegar à Câmara Municipal as suas preocupações quanto ao estado menos positivo em que se encontravam os balneários, “doença” que motivou um certo e aceitável tratamento. Por algumas notícias e documentos a que tivemos acesso, viemos a descobrir que, nos anos cinquenta do século passado, deve ter havido uma série de problemas complicados e uma paragem nas suas actividades, uma vez que, em 1961, se dá como adquirido que houve necessidade de reanimar e revitalizar esta mesma UDS, falando-se mesmo numa sua refundação. Alguém confessou, a propósito desta injecção de sangue novo, que tal se deveu ainda à necessidade de se encontrar um guarda.chuva para certas actividades políticas, sociais e culturais, pelo que esta Instituição foi o meio de que se serviram para encobrir essas práticas que, nessa época, eram reprimidas a torto e a direito. Ou seja, duma só cajadada mataram-se dois coelhos. Habilidade? Sim. Mas da boa. Com um percurso recheado de sucessos desportivos e também de alguns fracassos, alimentando o futebol e, em tempos, ainda o andebol e o basquetebol, modalidades que emigraram para outras paragens e plataformas novas, entretanto, surgidas neste concelho, a vida da UDS tem sido sempre mais integrada nos escalões da Associação de Futebol de Viseu, mas com boas incursões em patamares superiores. Numa curta resenha, venceu-se o campeonato distrital da 1ª Divisão nas épocas de 1964/1965 e 1976/ 1977, pelo que se subiu, nessas duas vezes, à 3ª Divisão Nacional. Já mais perto dos nossos dias, o mesmo aconteceu em 2010/2011, por ter sido primeira na Divisão de Honra, e 2011/2012. Quanto a outras vitórias, ganhou a Taça da AFV em 1976/1977 e o campeonato distrital de Juniores também da AFV em 2006/2007. Em 2009/2010, sagrou-se vencedora da Taça Sócios de Mérito. Actualmente, milita na Divisão de Honra da AFV, tendo inciado a época de 2015/2016 com esta equipa: treinador – Rui Almeida; atletas – guarda- redes – Márcio Rodrigues e Bártolo; defesas – Jorgito, André Pereira, Luís, Márcio Anastácio, Miguel Vargas e Polaco; médios – Kiko Mendes, Jimmy, Fábio Gouveia, Bruno Regueira, Bebé, Henrique Gouveia, Baixote; avançados – Bruno Anciães, Chiquinho, Santiago, Marco e Dieng. Como forma de festejar os 70 anos de história, a 26 de Março passado, realizou-se um jantar comemorativo e o 2º encontro de seus antigos jogadores, em dinamização de João Heitor e Miguel Vargas. Com a cor preta no equipamento a ser a sua imagem de marca, a UDS, agora em casa mais apetecível, aí está para as curvas. Boa sorte lhe desejamos. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, 2016

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

CORRECÇÕES

Isto dos computadores prega-nos partidas: queria falar de despovoamento, em trabalhos feitos, e apenas me saiu a Casa de Lafões e os seus 100 anos. Azar, por um lado, benefício pelo outro, ao reforçar a vida desta Instituição centenária. Seja como for, o meu pedido de desculpa...

Despovoamento, mais tópicos

Centenário – Casa de Lafões Um tempo de reflexão e homenagem I – Das origens ao futuro Ao recuarmos cem anos, é nossa obrigação dirigir as nossas primeiras palavras e sentimentos para quem, em maré de tantas dificuldades e limitações, teve a ousadia, o arrojo, a missão e a visão de se lançar numa aventura que já dura há cem anos e ainda tem, assim o cremos, muito tempo pela frente, logo que haja força e determinação para, procurando inovar, não deixar perecer este nosso emblemático património. Esta Casa de Lafões nasceu do sonho de nossos dedicados antepassados. Mais do que, nesse momento, pensar em Lisboa, na capital que os acolheu, à mente vinha-lhes continuamente a terra lá tão distante, praticamente no fim do mundo de então. Desta forma, quando se procurava ampliar a rede ferroviária, hoje, infelizmente, objecto de severos tratos de polé, o Vale do Vouga não poderia ficar na gaveta do esquecimento, ou dos adiamentos sucessivos e Lafões era zona que não podia ficar de fora desse sinal de progresso, desenvolvimento e modernidade. Erguido à categoria de utopia, o comboio que, na hora da inauguração fora objecto de tanta tareia e desconfiança, povoava os sonhos e conversas dos lafonenses-lisboetas. Com destaque para o mundo do comércio, onde uns firmavam carreira como empresários e outros subiam essa corda a pulso e dor, aí se fazia escola, ágora de interesses locais, talvez até um pouco de conspiração e intriga, que todo isso faz parte do ser-se homem activo e criativo. No rescaldo de um mundo novo surgido com a agitada República, que acicatou cidadanias adormecidas – ou talvez não – e abriu portas ao debate e às reivindicações, esta Instituição começou por ser essa forma de exigência de condições de mobilidade e bem- estar para as gentes da terra-mãe. O Grémio Lafonense, que haveria de sustentar esta designação até ao ano de 1939, foi fruto do cruzamento entre o amor às origens e a necessidade de encontrar para esse espaço afectivo o melhor que pudesse ser alcançado. Como ponto de partida, constituiu-se uma Comissão Dinamizadora da Linha do Vale do Vouga com a participação de António Pinto de Azevedo, Daniel Gonçalves de Almeida, António Rodrigues Portinha, Estêvão de Vasconcelos e Manuel Rodrigues de Abreu. Escolhido o sítio adequado, que foi o estabelecimento comercial do citado Daniel, na Calçada do Garcia, n.ºs 44 a 46, a presidência dessas “conferências” estava a cargo de Alfredo Augusto Ferreira, associando-se ainda José Bento Gonçalves de Almeida e Benjamim Rodrigues Costa. Por curiosidade, diga-se que ali se abrigava já o “Grupo dos Amigos de Vouzela”. Foi em redor desta gente e com a ambição de conseguir que o comboio cruzasse Lafões, objectivo alcançado em pleno, que a via-férrea entrou em Ribeiradio, depois de ter servido Cedrim do Vouga, e foi por aí além até S. Miguel do Mato e Bodiosa, unindo os concelhos de Sever, Oliveira de Frades, Vouzela, S. Pedro do Sul e Viseu, apanhando, de uma só vez, Lafões inteiro. Grande mérito teve quem se aventurou a levar por diante a obra das obras de então. Com este trunfo na manga, um outro passo se impunha: agarrar nessas sinergias e pô-las a render e a criação de uma forma mais estável, credível e duradoura de exercer o prazer de uma cidadania activa estava ali, à mão de semear: a criação de uma Instituição a sério, que se veio a chamar Grémio Lafonense. Impõe-se que registemos o nome desses heróis de 1911, herdeiros, à nossa escala, dos novos ideais da República recém-nascida. Foram eles: Daniel Gonçalves de Almeida, António Pinto de Azevedo, Joaquim e Artur Alves Ribeiro, Alfredo Augusto Ferreira, Adelino Gonçalves de Almeida, Benjamim Rodrigues Costa, David Sul da Costa, Custódio de Sousa Melo, Daniel Dias Costa, António Rodrigues Gonçalves, Cap. António Ferreira Neves, Bernardino Henriques de Almeida, Eusébio Fernandes, Joaquim Rodrigues Lourenço, Manuel Rodrigues de Abreu, Bernardino José Marques, António Rodrigues Portinha, Daniel Bastos, Aires de Oliveira, António Ladeira e Álvaro P. Basílio. Se a primeira reunião aconteceu no Rés-do-Chão de um palacete situado ao lado da Igreja de Santa Isabel, da família de Alves Ribeiro, as Sedes andaram de um lado para o outro, nos anos de arranque: - 1912 – Rua Capelo, 6 – 1º - Freguesia dos Mártires - 1913 – Agosto – Travessa da Glória, 22A – 2º - 1915 – Dezembro – Rua da Madalena , 201(199?), 1º Com o acento tónico numa grande carga regional, tinha como suporte físico “ … A união do número indeterminado de indivíduos, moral e socialmente idóneos, naturais da Região de Lafões, residentes no continente ou fora dele, inclusive no estrangeiro” . Num parágrafo único, dizia-se: “ Os sócios da CL praticarão nas suas mútuas relações os preceitos da mais estreita fraternidade e terão por norma este princípio – Por todos e por Lafões”. Apontavam-se as suas finalidades, que se cingiam, sobretudo, a estes factos: “ … unir os esforços de todos os associados, incessantemente velar pelos interesses dos mesmos e da região e promover os seus progressos morais, materiais e económicos”. Como em todas as organizações humanas de carácter associativo, que se desenvolveu bastante com a Revolução Liberal de 1820, se concretizou na Constituição de 1822, com o seu conceito jurídico e social relacionado com estes temas, se ampliou na República de 1910, tendo cristalizado com o Estado Novo, para rebentar em força com o 25 de Abril de 1974, também este Grémio não foi imune às quesílias que, normalmente, surgem. Por razões da mais variada índole, quando o homem quer emperrar qualquer empreendimento, isso acontecerá quase de certeza. Neste caso, em 1915, o desentendimento teve origem, curiosamente, nos convites a fazer, sendo que um deles viria a recair sobre a filha do Dr. Afonso Costa, um fervoroso republicano, apoiada por uns, rejeitado por outros, para incendiar os ânimos de então, quando o comboio já circulava em grande pela Linha que todos tinham defendido, felizmente. Mas os problemas seriam ampliados ao tratar-se do poder, que, às vezes, mina os espíritos, mesmo os mais sensatos. Por essa altura, criam-se dois blocos: um liderado pelo Capitão António Ferreira Neves, outro, por Alfredo Augusto Ferreira e Benjamim Rodrigues Costa. Deste braço-de-ferro, saiu vencedora esta segunda opção, o que motivou, desde logo, uma aberta cisão: saem Joaquim Rodrigues Lourenço, José Bento Gonçalves de Almeida, David Saul da Costa, Manuel Rodrigues de Abreu e António Ferreira Neves, que fundam o Grémio Beira Vouga, o Grémio Beirão de 1917 e a futura Casa das Beiras, de 1933. Ou seja: a mãe, Casa de Lafões, iria dar à luz uma filha que, por estranho que pareça, era espaço bem maior e onde essa progenitora se situava. Paradoxo? Nem por isso. É que, em 1911, um desejo concreto e bem definido fora cimento bem mais sólido que qualquer interesse mais diluído, como era este de uma grande Beira, do mar à serra, do Oceano a Espanha. Há, porém, um velho provérbio que nos diz que “ o bom filho à casa torna”, facto que se cumpriu com vários dos dissidentes, que ao solo inicial acabariam por regressar, nomeadamente Joaquim Rodrigues Lourenço, alguns anos mais tarde, homenageado na sua terra-natal, Quintela de Ventosa, onde tem um Largo com seu nome desde 1951. Passou um ano sobre a primeira Acta de Reunião de Direcção, em 9 de Outubro de 1912, em que estiveram presentes Manuel Rodrigues de Abreu, Joaquim Ribeiro, Benjamim Rodrigues Costa e António Rodrigues Portinha…. Em matéria de Estatutos, podem citar-se alterações em 1915, 1917, 1926, 1927, 1928, 1931, 1979….. Neste emaranhado de acontecimentos, em 1924, o Governo Civil de Lisboa autoriza o funcionamento da sociedade de recreio Grémio Lafonense, pedindo-se que para ali seja enviado um exemplar do BI e de outro qualquer distintivo usado pelos sócios e que se comunique qualquer mudança de Sede, ou de corpos gerentes. Por outro lado, devem as portas ser franqueadas aos funcionários dessa Repartição ou qualquer agente de autoridade, sempre que tal se justificar. Assiste-se aqui a um crescente apetite das entidades oficiais em controlar estes movimentos da sociedade civil, postura que se acentua depois de 1926 e, sobretudo, de 1933 com o advento do Estado Novo. Já agora, deve anotar-se que, em virtude do disposto no Artº 11º do Decreto-Lei nº 29332, de 8 de Dezembro de 1938(?), acaba o Grémio e começa a Casa de Lafões, como atesta a Secretaria do Governo Civil de Lisboa em 4 de Setembro de 1939. Num campo de acção que sai de Lisboa para a região de origem, em 1940, parte-se para as Termas de S. Pedro do Sul, a fim de participar nas Festas do Oitavo Centenário da Fundação da Nação Portuguesa, colocando-se uma lápide na velha piscina, em homenagem a D. Afonso Henriques, 1º Rei de Portugal, que ali passou algum tempo de sua vida, em várias ocasiões. Em 1946, 47, 57 e 59, apoiam-se Cortejos de Oferendas em favor dos hospitais das Misericórdias de Oliveira de Frades e S. Pedro do Sul. No ano de 1951, como já dissemos, procedeu-se, em Quintela-Ventosa-Vouzela, ao destaque da entrega ao regionalismo por parte de Joaquim Rodrigues Lourenço, ali se registando, em designação toponímica, o seu nome para a posteridade, no Largo principal da aldeia, ainda ali bem presente, aliás. Com activas participações em eventos culturais e sociais de grande significado, são de relevar os Congressos Beirões, o 1º Colóquio Regional de Turismo e Termalismo de Lafões, no centro ideal, as nossas Termas, as maiores agora da Península Ibérica, uma organização que teve na sua génese, formatação e desenvolvimento um decisivo contributo do nosso Amigo e Sócio, o Dr. Carlos Matias. É ainda de referir-se a acção levada a cabo no Conselho Superior de Regionalismo. Por sua vez, em 1938, cria-se a Comissão de Beneficência e Auxílio aos Desempregados da Região de Lafões, enquanto em 1925 se inscreve a CL na Federação Portuguesa das Colectividades de Cultura e Recreio, tendo-lhe sido atribuído o nº 17. Cinco anos após esta decisão associativa, esquecem-se mágoas e diferendos, quando se entra no seio do Grémio Beirão/Casa das Beiras. Em campanhas de solidariedade, apoia-se a luta dos agricultores de Lafões quanto à defesa dos seus vinhos verdes, mormente em 1929 e 1932. Quando eram escassos os meios e formas de comunicação, já os responsáveis deste Grémio e Casa se dedicavam à edição de Boletins e Jornais, onde o regionalismo era nota dominante: Apareceu, em primeiro lugar, o “ Porvir de Lafões”…… …………………………………………………………………………………………. II - A actualidade vista à luz dos anos setenta em diante É inegável que, em termos de causa, o regionalismo, tal como fora vivido e apreciado durante décadas, se viria a ressentir dos novos fenómenos sociais. O primeiro abalo sofreu-o com outros pólos de migração, sobretudo essa Europa de sessenta em diante que suga a grande força activa das nossas gentes, fazendo com que a esponja, que era Lisboa, perdesse a primazia das deslocações. Mesmo assim, lá foi resistindo. Mas a machadada determinante, que quase abafou toda a costela regionalista, adveio com o avanço dos transportes e com a melhoria das vias de comunicação, mormente o IP5 e o actual A25, a sucederem-se ao A1. Desde então, Lisboa fica quase à mão de semear e a Casa de Lafões deixa de ser o porto de abrigo, o coração maternal, a praça da aldeia, que se visita, agora, com bastante facilidade. Acabara-se o desterro de viver na capital e, sobretudo, nos arredores, por anos e anos a fio, sem pôr pé em chão de origem. Acabara-se o tempo das despedidas em lágrimas, dos acenos de adeus prolongados e sonoros, ao ver o velho comboio partir, ou os carros de praça, esses mensageiros da estrada que uniram Lafões e Lisboa por métodos que a polícia perseguia, mas que as pessoas, que a eles acorriam, tanto elogiavam. Os Poças, os Arinhos, os Florindos, o amigo Zé “Galo”, a passar, neste momento, por uma grande tristeza familiar, e tantos outros, bem merecem o nosso muito obrigado. Mais tarde, muito mais, vieram os “Expressos” e então ainda se agrava mais a crescente distância entre os lisboetas-lafonenses e a sua Casa de Lafões. Com os auto-estradas, pronto, soou a campainha de alarme, à medida que a mobilidade crescia a uma velocidade estonteante, para não falarmos já da televisão, das novas tecnologias, das Internet e seus pares. São estas as razões que levaram às mudanças de paradigma e de filosofia desta nobre Instituição. Face a este novo contexto e à necessidade de dar vida a uma herança que se não pode perder, entenderam os seus vários responsáveis, todos eles - e ainda bem - e cada um à sua maneira, mas com uma boa cartilha comum, insuflar novo ar, renovar o sangue que nos corre nas veias e empurrar para a frente este projecto que agora faz cem anos. Nasceram assim os encontros e almoços no berço que todos une, acentuaram-se as idas a Lisboa de associações e grupos locais, criou-se uma nova esfera de intercâmbio, olhou-se um e outro espaço, curiosamente, de uma outra maneira: a capital perdeu a sua auréola de um mundo à parte, acima dos outros, Lafões perdeu a vergonha e apresentou-se ali de cara levantada, de igual para igual. Se recuarmos alguns anos atrás, todos somos testemunhas de quanto de” admiração” se tinha, no Verão, pelos nossos lisboetas. Enfeitava-se a aldeia, melhorava e aprimorava-se a gastronomia e culinária, vestia-se uma roupa melhor, para não parecer mal, evitava-se até o cruzamento com essa gente de fato bem cheiroso, sempre que se entendia que se não estava à altura de um diálogo a dois, sendo “conveniente” manter uma certa distância… Hoje, a esse nível, tudo mudou. Ao vermos quem chega e quem está, não se nota qualquer sinal distintivo. Nem na roupa, nem nos temas a tratar, nem nessa postura de um ponto acima, outro abaixo. Regressando às novas programações, eis-nos a ver Lafões na Feira Popular, no Teatro da Trindade, na Praça do Comércio e ruas da Baixa, nos Restauradores, no Rossio e muito mais na Praça da Figueira, na Rua da Madalena, em frutuoso diálogo com a Junta de Freguesia, sobretudo a partir da dedicação e visão de seu Presidente, Jorge Ferreira, no Monsanto e tantas outras zonas que se ganharam para a causa do regionalismo renovado. A Sede passou a ser palco privilegiado para Conferências, Palestras, lançamento de livros, actuações de grupos diversos, convívios, torneios de cartas e afins, sendo ainda, como que a resistir a tudo isto, um ponto de encontro de saudade de gerações que não perdem o hábito de ir com regularidade à Rua da Madalena. Por assim ser, esta Casa tem toda a legitimidade para estar viva, de pé e mesmo em força. Justificam-se, deste modo, outros e novos caminhos que se estão a procurar. Regionalistas quanto baste? Temos dúvidas. Suportes essenciais ao desbravar de pistas novas para sobreviver e prosperar, são isso tudo e muito mais: aos poucos até passam a saber que Lafões afinal existe e ali se mostra diariamente. Essas outras culturas que por aqui desfilam, o rock, as danças latinas e de salão, o forró, as febres de sexta à noite, a “metálica” pesada, afinal, são linguagens que trazem mundividência ao nosso regionalismo e lhe rasgam novos horizontes, numa troca onde todos ficam a ganhar. São a globalização ao vivo e a cores. III - E agora o futuro Aqui chegados, carregados de certezas, não deixamos também de estar repletos de dúvidas, até medos, porque, se o futuro a Deus pertence, cabe também aos homens engendrar os seus contornos. E esta Casa de Lafões tem de saber que esta regra é de ouro e não pode ser esquecida. Impõe-se que, em conjunto, possamos agarrar no presente para virmos a ter um futuro melhor, que deve radicar na tradição de cem anos, mas também de ser capaz de alavancar os tempos que aí vêm, misturando-lhe a modernidade e as exigências de uma época que, olhando para trás, precisa é de pisar trilhos de um devir que ninguém conhece, mas que vai aparecer, de certeza . É nossa convicção que “ A noção de identidade colectiva pode englobar ao mesmo tempo a imagem consciente que uma sociedade alimenta de si mesma e a imagem inconsciente que poderá ter idealizado ou recalcado” ( in “ O futuro da Europa…”, 2002) e esta verdade leva a que pensemos que o futuro passa por reavivar estas componentes de cada ser humano, criando um projecto de valores-chave onde encontramos, de certeza, o apego às raízes. Saindo de uma postura reivindicativa para um espaço de são e vivo regionalismo dos inícios do século XX, nos alvores de uma República agitada, mas prenhe de cidadania, a Casa de Lafões é um cimento que evita a pulverização de sentimentos de pertença e também um “tampão” contra os efeitos de uma globalização, cada vez mais galopante, que quer pôr toda a gente a entoar as mesmas e únicas canções, deixando de lado o nosso Hino, e a comer maçãs de um só calibre, quando as nossas árvores teimam em primar pela diferença e pela qualidade pura de um chão que nos é tão querido. Cada região dá aquilo que de melhor tem. Lafões não foge a essa regra. Assim, ofereceu a Lisboa gente e saber, braços e vontade, querer e vida, ambição e trabalho, criação e empreendedorismo, pelo que é chegada a hora - e este é o local certo! – de tributarmos a nossa homenagem a todos aqueles que, por circunstâncias várias, para aqui vieram, aqui se entregaram de alma e coração aos seus ofícios e desejos, aqui constituíram família e fizeram desta terra, Lisboa, uma terra de ninguém e de todos, uma terra dos outros e de nós mesmos. Este foi o passado e não deixa de ser o presente. Mas seria miopia ficar por aqui, de braços cruzados, a gozar louros conseguidos com sangue, suor e lágrimas, a bater palmas, ou a chorar sobre leite derramado. A ir-se por esse caminho, seriam cem anos ganhos por esses nossos queridos antepasssados (bem haja, Pai, pelo tempo que estiveste na “Portugal e Colónias”) e perdidos, por inércia de nossa parte, por falta de consideração por quem nos legou este património tão humano, tão vasto e tão rico. Mas não é isso que esta Casa quer fazer. Está-lhe na massa do sangue nunca enjeitar responsabilidades futuras, por mais difíceis que sejam. Carlos Rodrigues, 2011

Despovoamento, umas ideias

Centenário – Casa de Lafões Um tempo de reflexão e homenagem I – Das origens ao futuro Ao recuarmos cem anos, é nossa obrigação dirigir as nossas primeiras palavras e sentimentos para quem, em maré de tantas dificuldades e limitações, teve a ousadia, o arrojo, a missão e a visão de se lançar numa aventura que já dura há cem anos e ainda tem, assim o cremos, muito tempo pela frente, logo que haja força e determinação para, procurando inovar, não deixar perecer este nosso emblemático património. Esta Casa de Lafões nasceu do sonho de nossos dedicados antepassados. Mais do que, nesse momento, pensar em Lisboa, na capital que os acolheu, à mente vinha-lhes continuamente a terra lá tão distante, praticamente no fim do mundo de então. Desta forma, quando se procurava ampliar a rede ferroviária, hoje, infelizmente, objecto de severos tratos de polé, o Vale do Vouga não poderia ficar na gaveta do esquecimento, ou dos adiamentos sucessivos e Lafões era zona que não podia ficar de fora desse sinal de progresso, desenvolvimento e modernidade. Erguido à categoria de utopia, o comboio que, na hora da inauguração fora objecto de tanta tareia e desconfiança, povoava os sonhos e conversas dos lafonenses-lisboetas. Com destaque para o mundo do comércio, onde uns firmavam carreira como empresários e outros subiam essa corda a pulso e dor, aí se fazia escola, ágora de interesses locais, talvez até um pouco de conspiração e intriga, que todo isso faz parte do ser-se homem activo e criativo. No rescaldo de um mundo novo surgido com a agitada República, que acicatou cidadanias adormecidas – ou talvez não – e abriu portas ao debate e às reivindicações, esta Instituição começou por ser essa forma de exigência de condições de mobilidade e bem- estar para as gentes da terra-mãe. O Grémio Lafonense, que haveria de sustentar esta designação até ao ano de 1939, foi fruto do cruzamento entre o amor às origens e a necessidade de encontrar para esse espaço afectivo o melhor que pudesse ser alcançado. Como ponto de partida, constituiu-se uma Comissão Dinamizadora da Linha do Vale do Vouga com a participação de António Pinto de Azevedo, Daniel Gonçalves de Almeida, António Rodrigues Portinha, Estêvão de Vasconcelos e Manuel Rodrigues de Abreu. Escolhido o sítio adequado, que foi o estabelecimento comercial do citado Daniel, na Calçada do Garcia, n.ºs 44 a 46, a presidência dessas “conferências” estava a cargo de Alfredo Augusto Ferreira, associando-se ainda José Bento Gonçalves de Almeida e Benjamim Rodrigues Costa. Por curiosidade, diga-se que ali se abrigava já o “Grupo dos Amigos de Vouzela”. Foi em redor desta gente e com a ambição de conseguir que o comboio cruzasse Lafões, objectivo alcançado em pleno, que a via-férrea entrou em Ribeiradio, depois de ter servido Cedrim do Vouga, e foi por aí além até S. Miguel do Mato e Bodiosa, unindo os concelhos de Sever, Oliveira de Frades, Vouzela, S. Pedro do Sul e Viseu, apanhando, de uma só vez, Lafões inteiro. Grande mérito teve quem se aventurou a levar por diante a obra das obras de então. Com este trunfo na manga, um outro passo se impunha: agarrar nessas sinergias e pô-las a render e a criação de uma forma mais estável, credível e duradoura de exercer o prazer de uma cidadania activa estava ali, à mão de semear: a criação de uma Instituição a sério, que se veio a chamar Grémio Lafonense. Impõe-se que registemos o nome desses heróis de 1911, herdeiros, à nossa escala, dos novos ideais da República recém-nascida. Foram eles: Daniel Gonçalves de Almeida, António Pinto de Azevedo, Joaquim e Artur Alves Ribeiro, Alfredo Augusto Ferreira, Adelino Gonçalves de Almeida, Benjamim Rodrigues Costa, David Sul da Costa, Custódio de Sousa Melo, Daniel Dias Costa, António Rodrigues Gonçalves, Cap. António Ferreira Neves, Bernardino Henriques de Almeida, Eusébio Fernandes, Joaquim Rodrigues Lourenço, Manuel Rodrigues de Abreu, Bernardino José Marques, António Rodrigues Portinha, Daniel Bastos, Aires de Oliveira, António Ladeira e Álvaro P. Basílio. Se a primeira reunião aconteceu no Rés-do-Chão de um palacete situado ao lado da Igreja de Santa Isabel, da família de Alves Ribeiro, as Sedes andaram de um lado para o outro, nos anos de arranque: - 1912 – Rua Capelo, 6 – 1º - Freguesia dos Mártires - 1913 – Agosto – Travessa da Glória, 22A – 2º - 1915 – Dezembro – Rua da Madalena , 201(199?), 1º Com o acento tónico numa grande carga regional, tinha como suporte físico “ … A união do número indeterminado de indivíduos, moral e socialmente idóneos, naturais da Região de Lafões, residentes no continente ou fora dele, inclusive no estrangeiro” . Num parágrafo único, dizia-se: “ Os sócios da CL praticarão nas suas mútuas relações os preceitos da mais estreita fraternidade e terão por norma este princípio – Por todos e por Lafões”. Apontavam-se as suas finalidades, que se cingiam, sobretudo, a estes factos: “ … unir os esforços de todos os associados, incessantemente velar pelos interesses dos mesmos e da região e promover os seus progressos morais, materiais e económicos”. Como em todas as organizações humanas de carácter associativo, que se desenvolveu bastante com a Revolução Liberal de 1820, se concretizou na Constituição de 1822, com o seu conceito jurídico e social relacionado com estes temas, se ampliou na República de 1910, tendo cristalizado com o Estado Novo, para rebentar em força com o 25 de Abril de 1974, também este Grémio não foi imune às quesílias que, normalmente, surgem. Por razões da mais variada índole, quando o homem quer emperrar qualquer empreendimento, isso acontecerá quase de certeza. Neste caso, em 1915, o desentendimento teve origem, curiosamente, nos convites a fazer, sendo que um deles viria a recair sobre a filha do Dr. Afonso Costa, um fervoroso republicano, apoiada por uns, rejeitado por outros, para incendiar os ânimos de então, quando o comboio já circulava em grande pela Linha que todos tinham defendido, felizmente. Mas os problemas seriam ampliados ao tratar-se do poder, que, às vezes, mina os espíritos, mesmo os mais sensatos. Por essa altura, criam-se dois blocos: um liderado pelo Capitão António Ferreira Neves, outro, por Alfredo Augusto Ferreira e Benjamim Rodrigues Costa. Deste braço-de-ferro, saiu vencedora esta segunda opção, o que motivou, desde logo, uma aberta cisão: saem Joaquim Rodrigues Lourenço, José Bento Gonçalves de Almeida, David Saul da Costa, Manuel Rodrigues de Abreu e António Ferreira Neves, que fundam o Grémio Beira Vouga, o Grémio Beirão de 1917 e a futura Casa das Beiras, de 1933. Ou seja: a mãe, Casa de Lafões, iria dar à luz uma filha que, por estranho que pareça, era espaço bem maior e onde essa progenitora se situava. Paradoxo? Nem por isso. É que, em 1911, um desejo concreto e bem definido fora cimento bem mais sólido que qualquer interesse mais diluído, como era este de uma grande Beira, do mar à serra, do Oceano a Espanha. Há, porém, um velho provérbio que nos diz que “ o bom filho à casa torna”, facto que se cumpriu com vários dos dissidentes, que ao solo inicial acabariam por regressar, nomeadamente Joaquim Rodrigues Lourenço, alguns anos mais tarde, homenageado na sua terra-natal, Quintela de Ventosa, onde tem um Largo com seu nome desde 1951. Passou um ano sobre a primeira Acta de Reunião de Direcção, em 9 de Outubro de 1912, em que estiveram presentes Manuel Rodrigues de Abreu, Joaquim Ribeiro, Benjamim Rodrigues Costa e António Rodrigues Portinha…. Em matéria de Estatutos, podem citar-se alterações em 1915, 1917, 1926, 1927, 1928, 1931, 1979….. Neste emaranhado de acontecimentos, em 1924, o Governo Civil de Lisboa autoriza o funcionamento da sociedade de recreio Grémio Lafonense, pedindo-se que para ali seja enviado um exemplar do BI e de outro qualquer distintivo usado pelos sócios e que se comunique qualquer mudança de Sede, ou de corpos gerentes. Por outro lado, devem as portas ser franqueadas aos funcionários dessa Repartição ou qualquer agente de autoridade, sempre que tal se justificar. Assiste-se aqui a um crescente apetite das entidades oficiais em controlar estes movimentos da sociedade civil, postura que se acentua depois de 1926 e, sobretudo, de 1933 com o advento do Estado Novo. Já agora, deve anotar-se que, em virtude do disposto no Artº 11º do Decreto-Lei nº 29332, de 8 de Dezembro de 1938(?), acaba o Grémio e começa a Casa de Lafões, como atesta a Secretaria do Governo Civil de Lisboa em 4 de Setembro de 1939. Num campo de acção que sai de Lisboa para a região de origem, em 1940, parte-se para as Termas de S. Pedro do Sul, a fim de participar nas Festas do Oitavo Centenário da Fundação da Nação Portuguesa, colocando-se uma lápide na velha piscina, em homenagem a D. Afonso Henriques, 1º Rei de Portugal, que ali passou algum tempo de sua vida, em várias ocasiões. Em 1946, 47, 57 e 59, apoiam-se Cortejos de Oferendas em favor dos hospitais das Misericórdias de Oliveira de Frades e S. Pedro do Sul. No ano de 1951, como já dissemos, procedeu-se, em Quintela-Ventosa-Vouzela, ao destaque da entrega ao regionalismo por parte de Joaquim Rodrigues Lourenço, ali se registando, em designação toponímica, o seu nome para a posteridade, no Largo principal da aldeia, ainda ali bem presente, aliás. Com activas participações em eventos culturais e sociais de grande significado, são de relevar os Congressos Beirões, o 1º Colóquio Regional de Turismo e Termalismo de Lafões, no centro ideal, as nossas Termas, as maiores agora da Península Ibérica, uma organização que teve na sua génese, formatação e desenvolvimento um decisivo contributo do nosso Amigo e Sócio, o Dr. Carlos Matias. É ainda de referir-se a acção levada a cabo no Conselho Superior de Regionalismo. Por sua vez, em 1938, cria-se a Comissão de Beneficência e Auxílio aos Desempregados da Região de Lafões, enquanto em 1925 se inscreve a CL na Federação Portuguesa das Colectividades de Cultura e Recreio, tendo-lhe sido atribuído o nº 17. Cinco anos após esta decisão associativa, esquecem-se mágoas e diferendos, quando se entra no seio do Grémio Beirão/Casa das Beiras. Em campanhas de solidariedade, apoia-se a luta dos agricultores de Lafões quanto à defesa dos seus vinhos verdes, mormente em 1929 e 1932. Quando eram escassos os meios e formas de comunicação, já os responsáveis deste Grémio e Casa se dedicavam à edição de Boletins e Jornais, onde o regionalismo era nota dominante: Apareceu, em primeiro lugar, o “ Porvir de Lafões”…… …………………………………………………………………………………………. II - A actualidade vista à luz dos anos setenta em diante É inegável que, em termos de causa, o regionalismo, tal como fora vivido e apreciado durante décadas, se viria a ressentir dos novos fenómenos sociais. O primeiro abalo sofreu-o com outros pólos de migração, sobretudo essa Europa de sessenta em diante que suga a grande força activa das nossas gentes, fazendo com que a esponja, que era Lisboa, perdesse a primazia das deslocações. Mesmo assim, lá foi resistindo. Mas a machadada determinante, que quase abafou toda a costela regionalista, adveio com o avanço dos transportes e com a melhoria das vias de comunicação, mormente o IP5 e o actual A25, a sucederem-se ao A1. Desde então, Lisboa fica quase à mão de semear e a Casa de Lafões deixa de ser o porto de abrigo, o coração maternal, a praça da aldeia, que se visita, agora, com bastante facilidade. Acabara-se o desterro de viver na capital e, sobretudo, nos arredores, por anos e anos a fio, sem pôr pé em chão de origem. Acabara-se o tempo das despedidas em lágrimas, dos acenos de adeus prolongados e sonoros, ao ver o velho comboio partir, ou os carros de praça, esses mensageiros da estrada que uniram Lafões e Lisboa por métodos que a polícia perseguia, mas que as pessoas, que a eles acorriam, tanto elogiavam. Os Poças, os Arinhos, os Florindos, o amigo Zé “Galo”, a passar, neste momento, por uma grande tristeza familiar, e tantos outros, bem merecem o nosso muito obrigado. Mais tarde, muito mais, vieram os “Expressos” e então ainda se agrava mais a crescente distância entre os lisboetas-lafonenses e a sua Casa de Lafões. Com os auto-estradas, pronto, soou a campainha de alarme, à medida que a mobilidade crescia a uma velocidade estonteante, para não falarmos já da televisão, das novas tecnologias, das Internet e seus pares. São estas as razões que levaram às mudanças de paradigma e de filosofia desta nobre Instituição. Face a este novo contexto e à necessidade de dar vida a uma herança que se não pode perder, entenderam os seus vários responsáveis, todos eles - e ainda bem - e cada um à sua maneira, mas com uma boa cartilha comum, insuflar novo ar, renovar o sangue que nos corre nas veias e empurrar para a frente este projecto que agora faz cem anos. Nasceram assim os encontros e almoços no berço que todos une, acentuaram-se as idas a Lisboa de associações e grupos locais, criou-se uma nova esfera de intercâmbio, olhou-se um e outro espaço, curiosamente, de uma outra maneira: a capital perdeu a sua auréola de um mundo à parte, acima dos outros, Lafões perdeu a vergonha e apresentou-se ali de cara levantada, de igual para igual. Se recuarmos alguns anos atrás, todos somos testemunhas de quanto de” admiração” se tinha, no Verão, pelos nossos lisboetas. Enfeitava-se a aldeia, melhorava e aprimorava-se a gastronomia e culinária, vestia-se uma roupa melhor, para não parecer mal, evitava-se até o cruzamento com essa gente de fato bem cheiroso, sempre que se entendia que se não estava à altura de um diálogo a dois, sendo “conveniente” manter uma certa distância… Hoje, a esse nível, tudo mudou. Ao vermos quem chega e quem está, não se nota qualquer sinal distintivo. Nem na roupa, nem nos temas a tratar, nem nessa postura de um ponto acima, outro abaixo. Regressando às novas programações, eis-nos a ver Lafões na Feira Popular, no Teatro da Trindade, na Praça do Comércio e ruas da Baixa, nos Restauradores, no Rossio e muito mais na Praça da Figueira, na Rua da Madalena, em frutuoso diálogo com a Junta de Freguesia, sobretudo a partir da dedicação e visão de seu Presidente, Jorge Ferreira, no Monsanto e tantas outras zonas que se ganharam para a causa do regionalismo renovado. A Sede passou a ser palco privilegiado para Conferências, Palestras, lançamento de livros, actuações de grupos diversos, convívios, torneios de cartas e afins, sendo ainda, como que a resistir a tudo isto, um ponto de encontro de saudade de gerações que não perdem o hábito de ir com regularidade à Rua da Madalena. Por assim ser, esta Casa tem toda a legitimidade para estar viva, de pé e mesmo em força. Justificam-se, deste modo, outros e novos caminhos que se estão a procurar. Regionalistas quanto baste? Temos dúvidas. Suportes essenciais ao desbravar de pistas novas para sobreviver e prosperar, são isso tudo e muito mais: aos poucos até passam a saber que Lafões afinal existe e ali se mostra diariamente. Essas outras culturas que por aqui desfilam, o rock, as danças latinas e de salão, o forró, as febres de sexta à noite, a “metálica” pesada, afinal, são linguagens que trazem mundividência ao nosso regionalismo e lhe rasgam novos horizontes, numa troca onde todos ficam a ganhar. São a globalização ao vivo e a cores. III - E agora o futuro Aqui chegados, carregados de certezas, não deixamos também de estar repletos de dúvidas, até medos, porque, se o futuro a Deus pertence, cabe também aos homens engendrar os seus contornos. E esta Casa de Lafões tem de saber que esta regra é de ouro e não pode ser esquecida. Impõe-se que, em conjunto, possamos agarrar no presente para virmos a ter um futuro melhor, que deve radicar na tradição de cem anos, mas também de ser capaz de alavancar os tempos que aí vêm, misturando-lhe a modernidade e as exigências de uma época que, olhando para trás, precisa é de pisar trilhos de um devir que ninguém conhece, mas que vai aparecer, de certeza . É nossa convicção que “ A noção de identidade colectiva pode englobar ao mesmo tempo a imagem consciente que uma sociedade alimenta de si mesma e a imagem inconsciente que poderá ter idealizado ou recalcado” ( in “ O futuro da Europa…”, 2002) e esta verdade leva a que pensemos que o futuro passa por reavivar estas componentes de cada ser humano, criando um projecto de valores-chave onde encontramos, de certeza, o apego às raízes. Saindo de uma postura reivindicativa para um espaço de são e vivo regionalismo dos inícios do século XX, nos alvores de uma República agitada, mas prenhe de cidadania, a Casa de Lafões é um cimento que evita a pulverização de sentimentos de pertença e também um “tampão” contra os efeitos de uma globalização, cada vez mais galopante, que quer pôr toda a gente a entoar as mesmas e únicas canções, deixando de lado o nosso Hino, e a comer maçãs de um só calibre, quando as nossas árvores teimam em primar pela diferença e pela qualidade pura de um chão que nos é tão querido. Cada região dá aquilo que de melhor tem. Lafões não foge a essa regra. Assim, ofereceu a Lisboa gente e saber, braços e vontade, querer e vida, ambição e trabalho, criação e empreendedorismo, pelo que é chegada a hora - e este é o local certo! – de tributarmos a nossa homenagem a todos aqueles que, por circunstâncias várias, para aqui vieram, aqui se entregaram de alma e coração aos seus ofícios e desejos, aqui constituíram família e fizeram desta terra, Lisboa, uma terra de ninguém e de todos, uma terra dos outros e de nós mesmos. Este foi o passado e não deixa de ser o presente. Mas seria miopia ficar por aqui, de braços cruzados, a gozar louros conseguidos com sangue, suor e lágrimas, a bater palmas, ou a chorar sobre leite derramado. A ir-se por esse caminho, seriam cem anos ganhos por esses nossos queridos antepasssados (bem haja, Pai, pelo tempo que estiveste na “Portugal e Colónias”) e perdidos, por inércia de nossa parte, por falta de consideração por quem nos legou este património tão humano, tão vasto e tão rico. Mas não é isso que esta Casa quer fazer. Está-lhe na massa do sangue nunca enjeitar responsabilidades futuras, por mais difíceis que sejam. Carlos Rodrigues, 2011

Cem anos da Casa de Lafões, 2011

Centenário – Casa de Lafões Um tempo de reflexão e homenagem I – Das origens ao futuro Ao recuarmos cem anos, é nossa obrigação dirigir as nossas primeiras palavras e sentimentos para quem, em maré de tantas dificuldades e limitações, teve a ousadia, o arrojo, a missão e a visão de se lançar numa aventura que já dura há cem anos e ainda tem, assim o cremos, muito tempo pela frente, logo que haja força e determinação para, procurando inovar, não deixar perecer este nosso emblemático património. Esta Casa de Lafões nasceu do sonho de nossos dedicados antepassados. Mais do que, nesse momento, pensar em Lisboa, na capital que os acolheu, à mente vinha-lhes continuamente a terra lá tão distante, praticamente no fim do mundo de então. Desta forma, quando se procurava ampliar a rede ferroviária, hoje, infelizmente, objecto de severos tratos de polé, o Vale do Vouga não poderia ficar na gaveta do esquecimento, ou dos adiamentos sucessivos e Lafões era zona que não podia ficar de fora desse sinal de progresso, desenvolvimento e modernidade. Erguido à categoria de utopia, o comboio que, na hora da inauguração fora objecto de tanta tareia e desconfiança, povoava os sonhos e conversas dos lafonenses-lisboetas. Com destaque para o mundo do comércio, onde uns firmavam carreira como empresários e outros subiam essa corda a pulso e dor, aí se fazia escola, ágora de interesses locais, talvez até um pouco de conspiração e intriga, que todo isso faz parte do ser-se homem activo e criativo. No rescaldo de um mundo novo surgido com a agitada República, que acicatou cidadanias adormecidas – ou talvez não – e abriu portas ao debate e às reivindicações, esta Instituição começou por ser essa forma de exigência de condições de mobilidade e bem- estar para as gentes da terra-mãe. O Grémio Lafonense, que haveria de sustentar esta designação até ao ano de 1939, foi fruto do cruzamento entre o amor às origens e a necessidade de encontrar para esse espaço afectivo o melhor que pudesse ser alcançado. Como ponto de partida, constituiu-se uma Comissão Dinamizadora da Linha do Vale do Vouga com a participação de António Pinto de Azevedo, Daniel Gonçalves de Almeida, António Rodrigues Portinha, Estêvão de Vasconcelos e Manuel Rodrigues de Abreu. Escolhido o sítio adequado, que foi o estabelecimento comercial do citado Daniel, na Calçada do Garcia, n.ºs 44 a 46, a presidência dessas “conferências” estava a cargo de Alfredo Augusto Ferreira, associando-se ainda José Bento Gonçalves de Almeida e Benjamim Rodrigues Costa. Por curiosidade, diga-se que ali se abrigava já o “Grupo dos Amigos de Vouzela”. Foi em redor desta gente e com a ambição de conseguir que o comboio cruzasse Lafões, objectivo alcançado em pleno, que a via-férrea entrou em Ribeiradio, depois de ter servido Cedrim do Vouga, e foi por aí além até S. Miguel do Mato e Bodiosa, unindo os concelhos de Sever, Oliveira de Frades, Vouzela, S. Pedro do Sul e Viseu, apanhando, de uma só vez, Lafões inteiro. Grande mérito teve quem se aventurou a levar por diante a obra das obras de então. Com este trunfo na manga, um outro passo se impunha: agarrar nessas sinergias e pô-las a render e a criação de uma forma mais estável, credível e duradoura de exercer o prazer de uma cidadania activa estava ali, à mão de semear: a criação de uma Instituição a sério, que se veio a chamar Grémio Lafonense. Impõe-se que registemos o nome desses heróis de 1911, herdeiros, à nossa escala, dos novos ideais da República recém-nascida. Foram eles: Daniel Gonçalves de Almeida, António Pinto de Azevedo, Joaquim e Artur Alves Ribeiro, Alfredo Augusto Ferreira, Adelino Gonçalves de Almeida, Benjamim Rodrigues Costa, David Sul da Costa, Custódio de Sousa Melo, Daniel Dias Costa, António Rodrigues Gonçalves, Cap. António Ferreira Neves, Bernardino Henriques de Almeida, Eusébio Fernandes, Joaquim Rodrigues Lourenço, Manuel Rodrigues de Abreu, Bernardino José Marques, António Rodrigues Portinha, Daniel Bastos, Aires de Oliveira, António Ladeira e Álvaro P. Basílio. Se a primeira reunião aconteceu no Rés-do-Chão de um palacete situado ao lado da Igreja de Santa Isabel, da família de Alves Ribeiro, as Sedes andaram de um lado para o outro, nos anos de arranque: - 1912 – Rua Capelo, 6 – 1º - Freguesia dos Mártires - 1913 – Agosto – Travessa da Glória, 22A – 2º - 1915 – Dezembro – Rua da Madalena , 201(199?), 1º Com o acento tónico numa grande carga regional, tinha como suporte físico “ … A união do número indeterminado de indivíduos, moral e socialmente idóneos, naturais da Região de Lafões, residentes no continente ou fora dele, inclusive no estrangeiro” . Num parágrafo único, dizia-se: “ Os sócios da CL praticarão nas suas mútuas relações os preceitos da mais estreita fraternidade e terão por norma este princípio – Por todos e por Lafões”. Apontavam-se as suas finalidades, que se cingiam, sobretudo, a estes factos: “ … unir os esforços de todos os associados, incessantemente velar pelos interesses dos mesmos e da região e promover os seus progressos morais, materiais e económicos”. Como em todas as organizações humanas de carácter associativo, que se desenvolveu bastante com a Revolução Liberal de 1820, se concretizou na Constituição de 1822, com o seu conceito jurídico e social relacionado com estes temas, se ampliou na República de 1910, tendo cristalizado com o Estado Novo, para rebentar em força com o 25 de Abril de 1974, também este Grémio não foi imune às quesílias que, normalmente, surgem. Por razões da mais variada índole, quando o homem quer emperrar qualquer empreendimento, isso acontecerá quase de certeza. Neste caso, em 1915, o desentendimento teve origem, curiosamente, nos convites a fazer, sendo que um deles viria a recair sobre a filha do Dr. Afonso Costa, um fervoroso republicano, apoiada por uns, rejeitado por outros, para incendiar os ânimos de então, quando o comboio já circulava em grande pela Linha que todos tinham defendido, felizmente. Mas os problemas seriam ampliados ao tratar-se do poder, que, às vezes, mina os espíritos, mesmo os mais sensatos. Por essa altura, criam-se dois blocos: um liderado pelo Capitão António Ferreira Neves, outro, por Alfredo Augusto Ferreira e Benjamim Rodrigues Costa. Deste braço-de-ferro, saiu vencedora esta segunda opção, o que motivou, desde logo, uma aberta cisão: saem Joaquim Rodrigues Lourenço, José Bento Gonçalves de Almeida, David Saul da Costa, Manuel Rodrigues de Abreu e António Ferreira Neves, que fundam o Grémio Beira Vouga, o Grémio Beirão de 1917 e a futura Casa das Beiras, de 1933. Ou seja: a mãe, Casa de Lafões, iria dar à luz uma filha que, por estranho que pareça, era espaço bem maior e onde essa progenitora se situava. Paradoxo? Nem por isso. É que, em 1911, um desejo concreto e bem definido fora cimento bem mais sólido que qualquer interesse mais diluído, como era este de uma grande Beira, do mar à serra, do Oceano a Espanha. Há, porém, um velho provérbio que nos diz que “ o bom filho à casa torna”, facto que se cumpriu com vários dos dissidentes, que ao solo inicial acabariam por regressar, nomeadamente Joaquim Rodrigues Lourenço, alguns anos mais tarde, homenageado na sua terra-natal, Quintela de Ventosa, onde tem um Largo com seu nome desde 1951. Passou um ano sobre a primeira Acta de Reunião de Direcção, em 9 de Outubro de 1912, em que estiveram presentes Manuel Rodrigues de Abreu, Joaquim Ribeiro, Benjamim Rodrigues Costa e António Rodrigues Portinha…. Em matéria de Estatutos, podem citar-se alterações em 1915, 1917, 1926, 1927, 1928, 1931, 1979….. Neste emaranhado de acontecimentos, em 1924, o Governo Civil de Lisboa autoriza o funcionamento da sociedade de recreio Grémio Lafonense, pedindo-se que para ali seja enviado um exemplar do BI e de outro qualquer distintivo usado pelos sócios e que se comunique qualquer mudança de Sede, ou de corpos gerentes. Por outro lado, devem as portas ser franqueadas aos funcionários dessa Repartição ou qualquer agente de autoridade, sempre que tal se justificar. Assiste-se aqui a um crescente apetite das entidades oficiais em controlar estes movimentos da sociedade civil, postura que se acentua depois de 1926 e, sobretudo, de 1933 com o advento do Estado Novo. Já agora, deve anotar-se que, em virtude do disposto no Artº 11º do Decreto-Lei nº 29332, de 8 de Dezembro de 1938(?), acaba o Grémio e começa a Casa de Lafões, como atesta a Secretaria do Governo Civil de Lisboa em 4 de Setembro de 1939. Num campo de acção que sai de Lisboa para a região de origem, em 1940, parte-se para as Termas de S. Pedro do Sul, a fim de participar nas Festas do Oitavo Centenário da Fundação da Nação Portuguesa, colocando-se uma lápide na velha piscina, em homenagem a D. Afonso Henriques, 1º Rei de Portugal, que ali passou algum tempo de sua vida, em várias ocasiões. Em 1946, 47, 57 e 59, apoiam-se Cortejos de Oferendas em favor dos hospitais das Misericórdias de Oliveira de Frades e S. Pedro do Sul. No ano de 1951, como já dissemos, procedeu-se, em Quintela-Ventosa-Vouzela, ao destaque da entrega ao regionalismo por parte de Joaquim Rodrigues Lourenço, ali se registando, em designação toponímica, o seu nome para a posteridade, no Largo principal da aldeia, ainda ali bem presente, aliás. Com activas participações em eventos culturais e sociais de grande significado, são de relevar os Congressos Beirões, o 1º Colóquio Regional de Turismo e Termalismo de Lafões, no centro ideal, as nossas Termas, as maiores agora da Península Ibérica, uma organização que teve na sua génese, formatação e desenvolvimento um decisivo contributo do nosso Amigo e Sócio, o Dr. Carlos Matias. É ainda de referir-se a acção levada a cabo no Conselho Superior de Regionalismo. Por sua vez, em 1938, cria-se a Comissão de Beneficência e Auxílio aos Desempregados da Região de Lafões, enquanto em 1925 se inscreve a CL na Federação Portuguesa das Colectividades de Cultura e Recreio, tendo-lhe sido atribuído o nº 17. Cinco anos após esta decisão associativa, esquecem-se mágoas e diferendos, quando se entra no seio do Grémio Beirão/Casa das Beiras. Em campanhas de solidariedade, apoia-se a luta dos agricultores de Lafões quanto à defesa dos seus vinhos verdes, mormente em 1929 e 1932. Quando eram escassos os meios e formas de comunicação, já os responsáveis deste Grémio e Casa se dedicavam à edição de Boletins e Jornais, onde o regionalismo era nota dominante: Apareceu, em primeiro lugar, o “ Porvir de Lafões”…… …………………………………………………………………………………………. II - A actualidade vista à luz dos anos setenta em diante É inegável que, em termos de causa, o regionalismo, tal como fora vivido e apreciado durante décadas, se viria a ressentir dos novos fenómenos sociais. O primeiro abalo sofreu-o com outros pólos de migração, sobretudo essa Europa de sessenta em diante que suga a grande força activa das nossas gentes, fazendo com que a esponja, que era Lisboa, perdesse a primazia das deslocações. Mesmo assim, lá foi resistindo. Mas a machadada determinante, que quase abafou toda a costela regionalista, adveio com o avanço dos transportes e com a melhoria das vias de comunicação, mormente o IP5 e o actual A25, a sucederem-se ao A1. Desde então, Lisboa fica quase à mão de semear e a Casa de Lafões deixa de ser o porto de abrigo, o coração maternal, a praça da aldeia, que se visita, agora, com bastante facilidade. Acabara-se o desterro de viver na capital e, sobretudo, nos arredores, por anos e anos a fio, sem pôr pé em chão de origem. Acabara-se o tempo das despedidas em lágrimas, dos acenos de adeus prolongados e sonoros, ao ver o velho comboio partir, ou os carros de praça, esses mensageiros da estrada que uniram Lafões e Lisboa por métodos que a polícia perseguia, mas que as pessoas, que a eles acorriam, tanto elogiavam. Os Poças, os Arinhos, os Florindos, o amigo Zé “Galo”, a passar, neste momento, por uma grande tristeza familiar, e tantos outros, bem merecem o nosso muito obrigado. Mais tarde, muito mais, vieram os “Expressos” e então ainda se agrava mais a crescente distância entre os lisboetas-lafonenses e a sua Casa de Lafões. Com os auto-estradas, pronto, soou a campainha de alarme, à medida que a mobilidade crescia a uma velocidade estonteante, para não falarmos já da televisão, das novas tecnologias, das Internet e seus pares. São estas as razões que levaram às mudanças de paradigma e de filosofia desta nobre Instituição. Face a este novo contexto e à necessidade de dar vida a uma herança que se não pode perder, entenderam os seus vários responsáveis, todos eles - e ainda bem - e cada um à sua maneira, mas com uma boa cartilha comum, insuflar novo ar, renovar o sangue que nos corre nas veias e empurrar para a frente este projecto que agora faz cem anos. Nasceram assim os encontros e almoços no berço que todos une, acentuaram-se as idas a Lisboa de associações e grupos locais, criou-se uma nova esfera de intercâmbio, olhou-se um e outro espaço, curiosamente, de uma outra maneira: a capital perdeu a sua auréola de um mundo à parte, acima dos outros, Lafões perdeu a vergonha e apresentou-se ali de cara levantada, de igual para igual. Se recuarmos alguns anos atrás, todos somos testemunhas de quanto de” admiração” se tinha, no Verão, pelos nossos lisboetas. Enfeitava-se a aldeia, melhorava e aprimorava-se a gastronomia e culinária, vestia-se uma roupa melhor, para não parecer mal, evitava-se até o cruzamento com essa gente de fato bem cheiroso, sempre que se entendia que se não estava à altura de um diálogo a dois, sendo “conveniente” manter uma certa distância… Hoje, a esse nível, tudo mudou. Ao vermos quem chega e quem está, não se nota qualquer sinal distintivo. Nem na roupa, nem nos temas a tratar, nem nessa postura de um ponto acima, outro abaixo. Regressando às novas programações, eis-nos a ver Lafões na Feira Popular, no Teatro da Trindade, na Praça do Comércio e ruas da Baixa, nos Restauradores, no Rossio e muito mais na Praça da Figueira, na Rua da Madalena, em frutuoso diálogo com a Junta de Freguesia, sobretudo a partir da dedicação e visão de seu Presidente, Jorge Ferreira, no Monsanto e tantas outras zonas que se ganharam para a causa do regionalismo renovado. A Sede passou a ser palco privilegiado para Conferências, Palestras, lançamento de livros, actuações de grupos diversos, convívios, torneios de cartas e afins, sendo ainda, como que a resistir a tudo isto, um ponto de encontro de saudade de gerações que não perdem o hábito de ir com regularidade à Rua da Madalena. Por assim ser, esta Casa tem toda a legitimidade para estar viva, de pé e mesmo em força. Justificam-se, deste modo, outros e novos caminhos que se estão a procurar. Regionalistas quanto baste? Temos dúvidas. Suportes essenciais ao desbravar de pistas novas para sobreviver e prosperar, são isso tudo e muito mais: aos poucos até passam a saber que Lafões afinal existe e ali se mostra diariamente. Essas outras culturas que por aqui desfilam, o rock, as danças latinas e de salão, o forró, as febres de sexta à noite, a “metálica” pesada, afinal, são linguagens que trazem mundividência ao nosso regionalismo e lhe rasgam novos horizontes, numa troca onde todos ficam a ganhar. São a globalização ao vivo e a cores. III - E agora o futuro Aqui chegados, carregados de certezas, não deixamos também de estar repletos de dúvidas, até medos, porque, se o futuro a Deus pertence, cabe também aos homens engendrar os seus contornos. E esta Casa de Lafões tem de saber que esta regra é de ouro e não pode ser esquecida. Impõe-se que, em conjunto, possamos agarrar no presente para virmos a ter um futuro melhor, que deve radicar na tradição de cem anos, mas também de ser capaz de alavancar os tempos que aí vêm, misturando-lhe a modernidade e as exigências de uma época que, olhando para trás, precisa é de pisar trilhos de um devir que ninguém conhece, mas que vai aparecer, de certeza . É nossa convicção que “ A noção de identidade colectiva pode englobar ao mesmo tempo a imagem consciente que uma sociedade alimenta de si mesma e a imagem inconsciente que poderá ter idealizado ou recalcado” ( in “ O futuro da Europa…”, 2002) e esta verdade leva a que pensemos que o futuro passa por reavivar estas componentes de cada ser humano, criando um projecto de valores-chave onde encontramos, de certeza, o apego às raízes. Saindo de uma postura reivindicativa para um espaço de são e vivo regionalismo dos inícios do século XX, nos alvores de uma República agitada, mas prenhe de cidadania, a Casa de Lafões é um cimento que evita a pulverização de sentimentos de pertença e também um “tampão” contra os efeitos de uma globalização, cada vez mais galopante, que quer pôr toda a gente a entoar as mesmas e únicas canções, deixando de lado o nosso Hino, e a comer maçãs de um só calibre, quando as nossas árvores teimam em primar pela diferença e pela qualidade pura de um chão que nos é tão querido. Cada região dá aquilo que de melhor tem. Lafões não foge a essa regra. Assim, ofereceu a Lisboa gente e saber, braços e vontade, querer e vida, ambição e trabalho, criação e empreendedorismo, pelo que é chegada a hora - e este é o local certo! – de tributarmos a nossa homenagem a todos aqueles que, por circunstâncias várias, para aqui vieram, aqui se entregaram de alma e coração aos seus ofícios e desejos, aqui constituíram família e fizeram desta terra, Lisboa, uma terra de ninguém e de todos, uma terra dos outros e de nós mesmos. Este foi o passado e não deixa de ser o presente. Mas seria miopia ficar por aqui, de braços cruzados, a gozar louros conseguidos com sangue, suor e lágrimas, a bater palmas, ou a chorar sobre leite derramado. A ir-se por esse caminho, seriam cem anos ganhos por esses nossos queridos antepasssados (bem haja, Pai, pelo tempo que estiveste na “Portugal e Colónias”) e perdidos, por inércia de nossa parte, por falta de consideração por quem nos legou este património tão humano, tão vasto e tão rico. Mas não é isso que esta Casa quer fazer. Está-lhe na massa do sangue nunca enjeitar responsabilidades futuras, por mais difíceis que sejam. Carlos Rodrigues, 2011