terça-feira, 26 de abril de 2016

O que me incomoda nas comemorações do 25 de Abril...

Adoro comemorar o 25 de Abril. Acho que tem toda a pertinência que assinalemos com dignidade e ambiente festivo esta data. Penso que a Assembleia da República é o local indicado para as solenes cerimónias oficiais. Gosto de ver os Palácios de Belém e de S. Bento abertos ao público. Aprecio imenso que se cante a Grândola, Vila Morena e o Hino Nacional. Aplaudo quem vai para a rua manifestar-se. Incomoda-me, e muito, que haja gente que se considere, em exclusivo, dono do 25 de Abril. Ou pelas cores que partidariamente ostentam, ou até pelo facto de o terem despoletado e defendido com coragem e risco imenso, a ninguém confiro o direito de se querer arrogar pai sozinho desta data. Nem pessoas, nem grupos, nem associações. O 25 de Abril é meu e é de todos, mesmo daqueles que dele discordam. Só assim o vejo, só assim o festejo. Património da nossa história, chateiam-me (é o termo) imenso os seus pretensos donos. Olhando para Salgueiro Maia e sua memória, não creio que ele quisesse seguir esta ideia de querer só para si o 25 de Abril que tanto ajudou a VENCER... Repito: não aceito que alguém se aproprie duma data que é de todos nós!... Não aceito. Pronto...

sábado, 23 de abril de 2016

Sábado maior...

Para muita gente minha amiga e para quem não conheço ou não vai à bola comigo, este sábado, para além de ser véspera de domingo, uma boa verdade, é antevéspera de uma segunda-feira de estalo. E que segunda-feira ela é! Feriado nacional. Isso já não é pouco. Mas ser dia das comemorações do 25 de ABRIL tem uma enorme importância e significado para todos nós, portugueses, ou no mínimo, para uma imensa maioria. Já o disse muitas vezes: o meu 25 de Abril só o percebi no dia 26, também em 1974, mas lá muito longe, na linha do caminho de ferro de Moçambique, ligação entre a Beira e Tete (Moatize). Tardiamente, mas foi o suficiente para, então, me ter nascido uma alma nova. Por tudo isto, por amar a liberdade, por fazer dela uma cartilha total, este sábado é especial, em momento de reflexão e de esperança em que Portugal saiba honrar, sempre, a memória de quem nos trouxe esta data feliz...

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Reformas, reformas, reformas...

Elas aí estão em versão que dizem ter média duração, isto é, até 2020. Vivendo em comunhão geral de bens com o Portugal 2020, o Plano Nacional de Reformas 2016 (que se deve conjugar com o Plano de Estabilidade e Crescimento), foi hoje aprovado em Conselho de Ministros. Ainda não o li em profundidade, nem com o cuidado que merece. Duas ou três linhas me espicaçam a curiosidade: saber se nele há efectiva COESÃO TERRITORIAL E SOCIAL e se a aposta na ferrovia contempla a ligação Aveiro- Salamanca a passar por Viseu pelo corredor de Lafões. Também me interessam as questões da educação, da justiça e da vertente social que importa preservar e ampliar. Ambicioso, quero ali VER uma perspectiva de futuro, deixando para trás temores de se andar sempre com a corda na garganta, corta-não-corta, ou as discussões que temos vivido tempo demais. Ouvindo o PR, Marcelo Rebelo de Sousa, fiquei um pouco mais descansado: ao dizer que houve ali realismo e bom senso, esta carimbadela é meio caminho para me sossegar. Falta agora a voz do papão que é União Europeia, via Comissão, que quer continuar a afundar-nos sem cuidar de saber que mais austeridade só apressa a nossa ida ao cangalheiro e esse é o contacto que não queremos, nem devemos fazer...

terça-feira, 19 de abril de 2016

Ensino pré-escolar...

Ouvi falar, por estes dias, o Ministro da Educação na necessidade e na sua vontade de, nos próximos anos, estender o ensino pré-escolar a todas as crianças dos três aos cinco anos, em processo que será feito de uma forma faseada. Gostei da ideia e espero vê-la em prática. Mas, ainda que cheire a uma certa confissão de vaidade (que seja!), pertenço a um concelho, Oliveira de Frades, onde essa questão não existe desde há anos. Está absolutamente resolvida, por intermédio da Câmara Municipal, da Misericórdia, numa certa altura, por projectos particulares um tanto em parceria com a autarquia local. Recordo isto com orgulho e com um pouco de medo do que vou revelar: antes de ali haver um parque de Jardins de Infância, topo de gama, que cobrem todo o município, fruto de várias candidaturas feitas há anos, partiu-se para soluções precárias, arrendando a CM garagens, casas privadas e outras instalações para criar os então chamados Jardins Autárquicos. Quanto ao pessoal, foi, em termos de recrutamento, um pouco estilo pesca à linha. E assim se viveu uns anotes. Devagar, entrou-se na rede pública e tudo mudou de figura: concursos, edifícios próprios e tudo o que mais foi necessário. Em matéria de transportes, mobilizaram-se todos os táxis do concelho e até viaturas particulares a quem se pagava o preço/km oficial, ou com acertos. Em alimentação, cedo se conseguiu pôr os pais a colaborarem antes de haver subsídios oficiais. Quando este vieram para o JI, deixando de fora, o dito ensino primário, muito antes de qualquer lei, todos os alunos passaram a ter acesso a uma refeição condigna. Isto começou há cerca de vinte anos, ou até antes. Conclusão: pisando o risco, avançou-se. Tendo receios, a aventura, pelo que vemos, foi muito bem sucedida. Durmo descansadíssimo agora, quando, nesses tempos, os sobressaltos eram mais do que muitos. Mas VALEU bem a pena...

segunda-feira, 18 de abril de 2016

BB - Brasil e BPI, melhor, MM, Muito Mau

Ontem, domingo, dei comigo, nestas terras do canto do mundo onde é bom o ar que se respira, a ficar meio atofegado: de repente, caíram-nos duas bombas em cima, uma vinda do Brasil e já algo esperada, outra saída, mais uma, da Banca de onde tantas asneiras nos vêm parar às mãos e aos bolsos, agora via BPI. Quando, naquele caso, a borrasca era previsível e a tempestade quase pode vir a caminho, no segundo, depois de um acordo Isabel dos Santos/Caixabanc, que tantas palmas motivou, nada fazia prever que se viesse a roer a corda, em atitude chegada de Angola. Num caso e noutro, são países lusófonos que muito nos dizem. Ao Brasil, são laços de "família" que nos unem, sendo tido como um irmão. A Angola, não é bem assim, mas também as ligações são muitas e já foram muitas mais quando o petróleo ali era ouro. Estes BB não nos deixam sossegados. No Brasil, teme-se que a política descambe para o torto, que torto foi este processo. No BPI, pode acontecer que sejamos nós, os contribuintes, a pagar mais uma barracada. Logo, estes BB são muito mais MM. Agora, num caso e noutro, é esperar para ver. Mas, falando por nós, pelos nosso irmãos brasileiros e por quem gosta de ter uma Banca segura, não ficamos muito descansados. Antes pelo contrário...

domingo, 17 de abril de 2016

O medo de uma página em branco

Por feitio, por afazeres, por gosto, por vontade, tenho frequentes vezes uma ânsia que me impele a escrever. Mas dou sempre comigo a viver momentos de angústia quando tenho pela frente uma página em branco. Dizem os cantores, os artistas e os pisadores de palco que esse estado de alma vive-se sempre que há uma nova vez, nem que seja esse uma parte de um milhão de espectáculos em que se enfrenta o público. Fico mais descansado comigo mesmo. Hoje, como de tempo não posso dizer nada, que não há novidades nesta Primavera-Inverno, digo apenas isto: a vida é também ela uma página em branco que vamos preenchendo cada dia que passa. No final, está o livro acabado. Sabemos mais ou menos o que têm sido as páginas anteriores, nunca podemos saber o que vem a seguir. Ainda bem que assim é. Estas incertezas são a chama que nos anima a acendê-la cada vez mais e melhor. Assim, sei que o meu SLB estava ontem ainda em primeiro e não sei se amanhá recupera esse bom lugar. Também não sei se o GDOF se segura no Campeonato de Seniores, como eu quero e desejo. Se isso não acontecer, Oliveira de Frades continuará a sua pedalada, mas essa falha não deixará de ser sentida...

sábado, 16 de abril de 2016

Recordar um texto sobre a Rainha D. Amélia em Lafões, escrito em 2012, quando ontem a Confraria dos Gastrónomos de Lafões e a CM de S. Pedro do Sul evocaram estes momentos históricos

D. Amélia2 D. Amélia, uma rainha entre a perfeição e a crítica mordaz A S. Pedro do Sul veio quatro vezes a Rainha D. Amélia, sempre recebida em ambiente de festa e com honras de primeira página. Depois de ter afirmado a sua importância, como já dissemos, na edição anterior, viu mesmo que uma nossa terra tomasse o seu próprio nome: as então Caldas de Lafões, que, de uma penada, em novo registo, mudaram de designação. Num bem rasgado trabalho publicado em “Terras de Lafões, nº 1, 2010”, o Dr. António Moniz (Palme) assinala características que aqui repescamos, em traços gerais, que muito nos ajudam a compreender esta Rainha e o contexto em que viveu. Se muitas outras fontes nos foram úteis, esta tem uma notória vantagem: foi escrita por quem, na primeira pessoa, pelos seus laços familiares com uma das Casas onde foi acolhida, teve acesso privilegiado a estas deslocações a S. Pedro do Sul e Beira Alta protagonizadas pela Rainha, sobretudo ela, e mesmo pelo Rei D. Carlos e seus filhos, os Príncipes D. Luís Filipe e D. Manuel. Em matéria de recolha de dados, aqui há a segura convicção de que são fidedignos, por quem os divulga e pela forma como o faz. Ao falarmos desta Rainha, nascida em solo inglês, por vicissitudes que tiveram a ver com facto de seus pais não estarem nas boas graças dos novos poderes franceses, temos de referir que a esta pátria vem a voltar e é aí que trava conhecimento directo com seu futuro marido, o então Príncipe D. Carlos, que, destinado a desposar alguém que estivesse ligado à Inglaterra ou à Alemanha, opta, dizem que por amor, ainda que a contrariar interesses estratégicos de seu país, Portugal, por querer casar com D. Maria Amélia Luísa Helena de Orleães. Conseguiu esse seu intento. No ano de 1886, o nosso penúltimo Rei, falecido tragicamente em 1908, foi de abalada oficial até França, sendo que o registo matrimonial foi lavrado no Castelo de Eu e o contrato nupcial em Paris, no cartório do Tabelião Lansquet. Se este casamento uniu as Casas reais portuguesa e francesa, esta, até por esse facto e pelo impacto que este acontecimento teve em França, haveria de ter de partir, uma vez mais, para o exílio. Assim aconteceu, sendo escolhida, de novo, a Inglaterra. Já no lugar de Rei e Rainha, D. Carlos e D. Amélia, por morte de D. Luís em 1889, passariam por tempos e episódios de bastante dureza e muita complexidade política. Foi o Ultimatum, foi um sistema de rotatividade de partidos que acabaria por minar a própria monarquia, foi a força crescente do Partido Republicano, foram as más línguas, foi todo um conjunto de factores adversos que levariam a posições extremas: por um lado, temos um Rei que gosta de caça e do mar, das aventuras, das viagens e que, no meio desses seus desejos, tem de se dedicar à governação de uma nação em evidente estado de degradação; por outro, há uma Rainha que, ou por vocação intrínseca, ou como forma de escape para muitos dissabores que viveu, ou por um e outro destes aspectos, confere um lugar de destaque a causas sociais e assistenciais ( ver “ Notícias de Lafões” de há quinze dias), à arte da pintura e do desenho, ao Museu dos Coches que também fundou, ao mesmo tempo que tinha de desempenhar o seu papel de esposa de rei e mãe de príncipes. Mas havia ainda a força corrosiva dos mexericos, essa arma que ia dando cabo daquela união, tal a violência dos argumentos invocados, tal a ferocidade com que eram tecidas essas conversas e descrições escritas, tal o impacto que poderiam vir a ter – e talvez isso tivesse acontecido – na própria vida familiar do casal real. Se, na ânsia de fazer bem, a Rainha D. Amélia enveredava por essa agitada vida social, logo os seus detractores iam buscar uma dose enorme de boatos (?), como aquele que a associou à fama de algumas traições, quer aqui por Lafões, em que se fala de alguma ligação mais atrevida com o Conselheiro José Vaz, no seu Solar de Lourosa, como nos relata Eduardo Nuno Oliveira, em “Lafões, terra e gentes, Avis-Viseu, 2008”, quer, em Lisboa, com Mouzinho de Albuquerque, que, como pedagogo, dava aulas ao príncipe herdeiro, agora no dizer do Dr. António Moniz (Palme). Com línguas tão afiadas, é certo que desses rumores se não livrou a Rainha D. Amélia, até porque não eram lá muito boas as relações, a esse nível, com o Rei, como para aí se comenta. Seja como for e descontando esta ideia de estarmos a tratar de temas que têm tudo para alimentar revistas cor-de-rosa e nunca para servir de lastro a um jornal como este “NL”, o certo é que se sabe que D. Amélia e os Príncipes, mais vezes, e D. Carlos, com menos frequência, estiveram em S. Pedro do Sul em várias ocasiões. As casas dos Marqueses de Reriz, da Baronesa de Palme e de Forno Telheiro foram, com essas altas visitas, convertidas em Paços Reais. Em cada uma dessas vindas, era grande a azáfama em receber bem e com estrondo quem aqui aparecia, deixando para trás a cidade de Lisboa, a capital das decisões e de todos os ataques que atrás acabámos por descrever. O campo era, assim, o palco para se desviarem desse ambiente e esquecer tamanhas agruras. E S. Pedro do Sul tinha, nessa linha de pensamento, a magia das águas quentes das Termas e a arte gastronómica, a que se associava também a tauromaquia da Família Casimiro. Nas bocas do mundo andaram alguns jantares, como aquele que teve “ementa” francesa, a 5 de Janeiro de 1895, nas instalações dos Marqueses de Reriz, um outro dado pelo Visconde de Mira Vouga, na sua Casa, que foi, anos mais tarde, o Colégio de S. Tomás de Aquino, sem esquecer as idas a Lourosa, talvez algo mais às escondidas, para estar com o Conselheiro José Vaz. Se até os arreios eram motivo de interesse especial, pessoalizando-os, para serem usados nos cavalos em que faziam equitação os Príncipes D. Luís Filipe e D. Manuel, diz-nos o Dr. António Moniz (Palme) que ficou célebre, e guardado como relíquia preciosa, um dos penicos usados pela Rainha numa dessas estadias. Cientes de que cada uma dessas peças era um bocadinho da história real portuguesa, percebe-se, à vista desarmada, que esse cuidado em as preservar tenha sido uma constante. Repegando nas corridas tauromáquicas, fazemo-lo apenas para deixar registado alguns de seus nomes: as lides a cavalo estiveram ao cuidado de Manuel Casimiro Almeida e Adelino Raposo; no toureio apeado, intervieram Rafael Peixinho, Sebastião Silva (Chispa), José dos Santos e Saldanha. Entre os forcados amadores, dois eram oriundos de S. Pedro do Sul – Manuel Badalo e José Vinagre. Com estas viagens, a Rainha D. Amélia associou-se, para sempre, à nossa história local. Mas, a um nível mais alto, há a destacar outros importantes passos de sua atribulada vida, que, por exemplo, mesmo por entre desgostos vários, teve ainda vontade e força para colaborar com os Aliados na 2ª Grande Guerra, nas fileiras da Cruz Vermelha, o que lhe valeu ter recebido a distinção “Royal Red Cross”, atribuída pelo Rei de Inglaterra, D. Jorge V. Repousando no Panteão de S. Vicente desde 1951, S. Pedro do Sul não a pode esquecer. Porque a história não se apaga, nem se deve deixar de lado. Carlos Rodrigues, in “ Notícias de Lafões”, 2012

terça-feira, 12 de abril de 2016

Fora de tempo II

Fora de tempo, anda também a morte que, em Oliveira de Frades, a minha terra, levou mais duas pessoas ainda muito novas: a Ana Maria Vasconcelos Correia, com uma daquelas doenças de meter medo, que partiu aos 31 anos; e o João António Ferreira Ribeiro, aos 53 anos, em virtude de um acidente de trabalho. Fora de tempo foi também a morte de António Fernandes Martins Bastos, o Tó Bastos, de Paredes Velhas - Cambra, com 59 anos, que se finou na Suíça e foi hoje sepultado na sua terra natal. Fora de tempo anda sempre a marcha da morte que nunca pára, correndo demais para o nosso gosto. Mas é assim a vida. RIP, meus Amigos!...

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Fora de tempo...

Fora de tempo anda o tempo, que nos traz chuva, neve e frio, quando já deveria estar a dar-nos um calorzinho primaveril. Fora de tempo, andam os ministros que ameaçam dar umas bofetadas, em tempo que dever ser de paz. Fora de tempo, andam os bancos que nunca encontram o tempo de ajudarem a economia. Fora de tempo, anda o meu País que teima em deixar fugir a nossa massa para o Panamá e outros esconderijos a jeito de quem não se importa de, fugindo do tempo da solidariedade, nos oferecer o tempo da continuada e desastrosa fuga de impostos. Fora de tempo, anda a classe média que paga todos os outros "fora de tempo" que dão cabo de todos nós. Fora de tempo, anda o tempo, ele mesmo e todos nós...

domingo, 10 de abril de 2016

Olhar para o despovoamento do Interior, Uab, 2013

DESPOVOAMENTO À LUZ DE AMARTYA SEN SAMI – Trabalho final Carlos Tavares Rodrigues - I - Introdução No tema que vamos desenvolver, em trabalho final de SAMI, 2012/2013, pretendemos abordar a questão de despovoamento acentuado do interior de Portugal, analisando as suas causas segundo as ideias de Amartya Sen, uma vez que estas assimetrias e as desigualdades verificadas podem muito ter a ver com fenómenos de privação e outros factores que tem vindo a referir na sua vasta obra em torno destas questões de desenvolvimento. Metodologicamente, servir-nos-emos de fontes diversas de índole qualitativa e de estatísticas e de estudos quantitativos, assim dando corpo àquilo que Cook e Reichardt nos mostraram como boas hipóteses para aprofundar as ciências sociais, adoptando como paradigma, segundo estes autores, aquilo que nos permita perceber este mundo e identificar o que se nos afigura mais relevante. Por querermos fazer deste “Despovoamento à luz de Amartya Sen” uma possível porta para algo muito mais vasto e profundo, em termos de futura tese, aplicando-o a este nosso País, é nas ideias colhidas em pensadores nacionais, com uma ou outra incursão de autores estrangeiros, que nos vamos centrar. Por se associar o interior ao mundo rural, é nesta realidade sociológica que vamos navegar. No entanto, não desconhecemos, nem desvalorizamos o facto de, também nos centros históricos de muitas das nossas cidades, mesmo nas grandes áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, este fenómeno se estar a verificar. Para nos situarmos no objectivo que queremos desenvolver, é de zonas rurais que vamos falar, incidindo a nossa atenção nas ondulações de seu povoamento ao longo dos anos. Por razões de ordem cronológica, partimos das décadas de 50/60 do passado século XX, por entendermos que estas são as épocas em que este fenómeno mais se tem vindo a acentuar. - II – Ponto de partida As dinâmicas territoriais e populacionais portuguesas assentam na profunda assimetria, que tem origem numa fatia da zona litoral com alta densidade de habitantes contraposta à maioria de um espaço que se despovoa e se desertifica progressivamente. O ângulo de visão de que partimos para tentar explicar estas agudas disparidades regionais, mais do que as vermos como resultado de políticas públicas, por acção ou por omissão, leva-nos a pensar que se devem à existência de privações sociais, à pobreza, à falta de horizontes para se poderem desenvolver capacidades individuais, entre outros motivos, pelo que é pertinente relacionarmos tudo isso com as teses defendidas por Amartya Sen nos seus estudos. Com o paradigma de Cook e Reichardt, ao falarmos de despovoamento com que nos confrontamos e na perspectiva que o fazemos, estamos perante a escolha do que é para nós mais relevante: a opção pelas teses de AS. Como estamos em crer que as razões que estão na base dessa fuga das populações têm razões de fundo, afirmamos que optamos, manifestamente, por um estudo ligado a uma sociologia participante ou comprometida (Josué de Castro, 1975), por nos considerarmos envolvidos nesta mesma situação, tendo em atenção a região de onde somos originários. Perante um caldo de culturas que levaram às opções a fazer, o despovoamento é uma espécie de corte entre aquilo que se não tem com a vontade de mudar de vida, de aspirar a uma outra cultura. Podendo ver nestas fugas das gentes do interior para o litoral algo parecido com o espírito de aventura ou com a cópia de comportamentos anteriores, rejeitamos, em grande parte, estas ideias porque pensamos que só se abandonam as raízes por motivos muito profundos. E para estes Amartya Sen tem muitas explicações. A este propósito, João Oliveira Correia da Silva, numa análise ao livro de Sen, “Desenvolvimento como liberdade”, em programa de Doutoramento da Faculdade de Economia do Porto, entre diversas formas de privação citadas, fala na falta de cuidados de saúde, de saneamento básico e água potável, de uma educação eficaz, de um emprego rentável, de segurança económica e social, de liberdades políticas e direitos cívicos (em parte da época a que nos referimos, esta era também uma evidente privação, por estarmos em pleno Estado Novo), aspectos que se encaixam muito bem nos argumentos que temos em vista. Por outro lado, sendo necessário ir para além de uma categorização territorial, “… Em Portugal, a distinção entre espaços urbanos e rurais não corresponde somente a uma mera categorização territorial, na verdade, ela significa, antes de mais, uma forte assimetria socioeconómica que tende a persistir na sociedade portuguesa” (Carmo, Renato Miguel do – Capital social e policentrismo: para uma análise reflexiva das políticas públicas, CIES, ISCTE, 2008, p. 6), está visto que este caminho do despovoamento se associa à desigualdade de condições de recursos. No campo que estamos a desbravar, há até uma dupla desigualdade, uma na comparação geral no interior/litoral, outra, a da menor frequência escolar por parte das raparigas, bem evidente em anos anteriores e ainda a continuar a ser, em muitas comunidades, um problema por resolver de forma satisfatória. É que diz-nos AS, a discriminação das mulheres, também frequente no interior, leva a que se agravem as condições de subsistência nessas regiões, por não terem rendimentos suficientes e as mulheres nem sequer acederem ao mercado de emprego. Tornando este quadro mais negro, a falta de alfabetização, mais notória no sector feminino, como vimos, faz acrescer razões para o despovoamento que estamos a tratar. Antes, porém, de avançarmos, vejamos alguns indicadores quantitativos que mostram como o território português é profundamente assimétrico, sendo que estas divisões também se verificam a uma outra escala, como descreve Angus Maddison (2008), ao reflectir sobre as desigualdades e diferenças de ordem global num crescente aumento de disparidades. Como cada caso é um caso, em Portugal temos este panorama parcial: a) – Comparando cinco distritos da Região Centro, quanto aos anos de 1950, 60 e 70, as linhas que separam a evolução demográfica no litoral e no interior são notórias: 1 – Distrito de Aveiro : 1950 – 483155 habitantes; 1960 – 524576, + 8.57%; 1970 – 545230, + 3.94%. 2 – Coimbra ( Com litoral e interior) : 1950 – 438535; 1960 – 433656, - 1.11%; 1970 – 399380, - 7.90% 3 – Viseu : 1950 – 494628; 1960 – 482416, - 2.47%; 1970 – 410795, - 14.85% 4 – Guarda: 1950 – 307677; 1960 – 282606, - 8.15%; 1970 – 210720, - 25.44% 5 – Castelo Branco: 1950 – 324577; 1960 – 316536, - 2.48%; 1970 – 254355, -19.64% Fonte: Evolução da população na Região Centro (1950/1976), CCRC, Coimbra, 1982 A escolha desta região e destes anos foi intencional: no eixo Oceano Atlântico/Fronteira com Espanha, temos o litoral e o interior apresentados na sua plenitude, de uma forma transversal. Por outro lado, de 1960 em diante, sensivelmente, assiste-se a um dos fluxos migratórios mais acentuados da nossa sociedade. Como hipotéticas razões para estas disparidades, de entre os cinco tipos de liberdades instrumentais de Amartya Sen, em “Desenvolvimento como liberdade”, as políticas, os dispositivos económicos, as oportunidades sociais, inclinamo-nos, nestas vagas de despovoamento, bastante para duas delas: os dispositivos económicos e as oportunidades sociais, que escasseiam cada vez mais no interior. Foi por se quebrarem esses elos que as pessoas partiram em busca de bem-estar que, nas suas terras de origem, viam não ser muito viável. Para além daqueles números apresentados assim a seco, que são o resultado e não a explicação, há seres humanos em sofrimento, há índices de desenvolvimento humano que se mostram, porventura, bastante arrasadores. Com um poder central forte e autoritário, o que se contrapõe muito às ideias de AS, também a sociedade civil, adaptando as perspectivas de Kousis (2000) e de Boele et al (2001), de certa forma transplantadas para este nosso contexto, se não encontra nem suficientemente organizada, nem activa quanto à defesa dos interesses que estavam em jogo: a sobrevivência de uma região, sempre a perder gente e importância, o que compromete o futuro destas terras e das comunidades que as constituem. Rematando este capítulo, podemos dizer que “… A geografia da densidade populacional demonstra uma forte concentração de população no litoral do continente, sobretudo no litoral-atlântico de Viana do Castelo a Setúbal e no litoral algarvio. A evolução da distribuição da população demonstra simultaneamente uma tendência para a litoralização da ocupação do território e uma ligeira deslocação do centro populacional do centro do Continente para o sul… “ (Retrato territorial de Portugal, 2004 – INE, Ano de edição, 2005). Neste mesmo estudo e continuando a sua análise, há indicadores que provam o nível de desigualdades e um deles é a evolução do PIB e do PIB per capita, em 2002/2003, por mais que isto seja, na perspectiva de Sen, bastante redutor, por achar que o desenvolvimento não se esgota em números, antes se caracteriza pelo bem-estar, pela qualidade de vida, que não são propriamente componentes das vidas destas zonas do interior. Ainda que assim seja, dão-nos uma ideia dos quadros que estamos a querer caracterizar: - Portugal: Per capita – 0.9; PIB – 1.6 - Norte: Per capita, menos 0.3; PIB – 0.3 positivos - Centro : 0.7 e 1.3, respectivamente - Lisboa: 1 e 2 Com estes rendimentos bastante díspares, é suposto que as pessoas migrem à procura de melhores dias e de sustentabilidade familiar para o presente e, sobretudo, em horizontes de futuro, que pretendem melhor para seus filhos e descendentes. Perdida assim a geração actual, as que lhes sucedem ou esquecem as origens, ou fazem delas apenas um lugar de férias e recordações, salvo se regressarem em fim de vida, e, por isso, o despovoamento é de muito difícil reversão. - III - Partir por não estar bem O despovoamento do interior também bastante se deve à crise da natalidade. Não é neste factor, porém, que se encontram todas as razões para essa situação. Aliás, Portugal, a esse nível, como um todo, não tem perdido habitantes. Não é, então, essa a via a seguir, até porque a grelha de análise, reportada a Amartya Sen, impõe-nos que prossigamos por outras explicações. Como o desenvolvimento, ainda que escasso, se encontra mal distribuído, é neste aspecto que vamos descobrir os factores para as disparidades existentes. A este propósito, diz-nos António Simões Lopes, que muito tem aprofundado estas questões numa perspectiva regional, que “… Tem vindo a assistir-se há decénios e tem-se denunciado a depauperamento progressivo de certas regiões do país, bastante bem identificadas, porque o desenvolvimento não lhes chega e as populações emigram à sua procura, do que resulta um processo cumulativo de desequilíbrios… “ (Lopes, António Simões - Encruzilhadas do desenvolvimento: falácias, dilemas, heresias, 2006, CES, UC, p.52) Como veremos a seguir, este autor de uma obra fundamental para a compreensão destas temáticas mostra-se bastante seguidor de Sen e da noção de que é preciso fazer chegar o processo de desenvolvimento às pessoas nos seus lugares, assim como todas as suas componentes, entre as quais os bens e serviços que satisfaçam as necessidades e que permitam ter acesso às oportunidades de realização da pessoa humana. É precisamente isto que falha no interior e daí o seu despovoamento. Dado que, se analisarmos certos dados, logo vemos que há escassez de meios, é destes que vamos agora falar: olhando para o sector dos acessos à saúde, no ano de 1981, um outro aspecto que muito sensibiliza AS, eram bem díspares os números em causa quanto a acessibilidade a esses serviços: - Consulta em postos dos SMS por 1000 habitantes: Continente – 299.8; Distrito de Aveiro – 260.5; Coimbra – 243.3; Castelo Branco – 190.7; Guarda – 190; Viseu – 163. - Pela mesma ordem territorial, a mortalidade infantil distribuía-se deste modo: 21.81; 19.44; 15.60; 22.61; 28.96 e 27.77 # Fonte: Jornadas da Beira Interior, Volume II, Jornal do Fundão, 1986 Neste mesmo estudo, Fernando Dias de Carvalho, médico, acrescentava: “… E não tenhamos veleidades. O progresso na saúde e na assistência terá pouco significado se simultaneamente não melhorarem também as condições de vida das pessoas e não arrancar em simultâneo também um projecto bem estruturado de criação de infraestruturas sanitárias adequadas. É preciso também melhorar a alimentação, a água e os esgotos. E não descurar nunca a educação em trabalho tenaz para mudar algumas mentalidades… “ (p.43) Na mesma linha de denúncia, também Gabriel Raimundo (1986: p.105), nesse mesmo trabalho, esclarecia que “… A aberração mais flagrante está no isolamento a que são votadas as populações do interior… “. Sem grande esforço, facilmente podemos associar estas preocupações àquilo que Amartya Sen vem defendendo e que aqui pretendemos enfatizar. No seguimento desta lógica, Peter Evans (2002) - Simpósio sobre o desenvolvimento como liberdade de Amartya Sen: capacidades colectivas, cultura «Desenvolvimento como liberdade de Amartya Sen, Peter Evans, 2002 - refere que Sen, em «Desenvolvimento como liberdade», baseia a sua argumentação quanto ao desenvolvimento em termos de “…expansão das capacidades das pessoas para a vida e valores que apreciam…”. Depreende-se das carências atrás citadas que essas capacidades não podem ir mais longe, facto que leva ao abandono de suas próprias terras. Continuando com Evans, o desenvolvimento depende da eliminação da opressão, aqui com um significado mais mitigado, após a instauração da democracia em Abril de 1974, da possibilidade de poder aceder à educação básica, aos cuidados de saúde, às redes de segurança social, direitos diversos, com ênfase na aplicação do direito das mulheres, de modo a criar a possibilidade de escolhas sociais, que Sen, depois de estas terem sido recusadas por outros autores (devido ao teorema da impossibilidade de Arrow), veio a fazer despertar. Também, de novo com António Simões Lopes, a figura de Sen se agiganta a ponto de ter dito que “… A atribuição do Nobel a a Amartya Sen veio dar efectiva dignidade ao conceito de desenvolvimento que este autor coloca liminarmente ao nível da liberdade, com carga moral e ética dominante; sendo certo que os tempos têm levado precisamente a algum esquecimento dos pressupostos morais e éticos, expressos e enfatizados desde sempre, nem só desde Adam Smith. O desenvolvimento, diz AS, pode ser visto como o processo de alargamento e aprofundamento das liberdades reais e substantivas das pessoas; e, visto desta forma, a atenção passa a ter de se dirigir para os fins que tornam o desenvolvimento importante, em vez de simplesmente se dirigir para os meios, alguns meios, que, entre outros, desempenham papel relevante no processo… “ (Lopes,2006, p.45 e 46) Pegando em “Indicadores de mercado de trabalho, 2002” (Anuário, INE, 2005), são evidentes as diferenças por regiões, com prejuízo para o interior, o que põe em causa princípios de igualdade e equidade, que Sen tanto destaca. Vejamos esses valores em euros, quanto a ganhos médios mensais: - Portugal: 813 euros; Continente: 815; Baixo Vouga: 743; Baixo Mondego: 765; Pinhal Litoral: 738; Pinhal Interior Norte: 588; Dão-Lafões: 647; Pinhal Interior Sul: 578; Serra da Estrela: 598; Beira Interior Norte: 628; Beira Interior Sul: 668; Cova da Beira: 605; Oeste: 679 e Médio Tejo: 696 Face a estes desníveis, põe-se em causa algo de essencial, como acentua AS: “… Aquando da avaliação das disparidades socais, a perspectiva da capacidade aponta para a relevância da existência de uma desigualdade de capacidades… “ (Sen, Amartya – A ideia de justiça, Almedina, Coimbra, 2010, p. 320). Como estas situações geram efeitos em cascata, sempre que numa certa época os montantes dos ganhos do trabalho, entre outros factores, são tão díspares, a tendência caminha no sentido do agravamento desses quadros. Se, em 2002, assim estavam estas tabelas escalonadas, os seus efeitos não deixam de se fazer sentir a jusante: a um interior já assim discriminado sucede-se um espaço mais despovoado, mais desprovido de massa crítica, mais desertificado, sendo que os conceitos de despovoamento e desertificação, ainda que se cruzem, não são a mesma coisa. Na combinação das diversas componentes da sociedade, descritas por Iain Attack (Quatro critérios de desenvolvimento da legitimidade das ONGs, Dublin, 1999), com as necessárias adaptações, nestas questões do desenvolvimento das diversas regiões, temos também como possíveis e desejáveis interventores o Estado, a iniciativa privada e a sociedade civil. Paralelamente, também em Attack se nota que nestas temáticas são necessários um bom envolvimento e engajamento de todos estes actores para que as acções a empreender e a levar a cabo surtam o devido efeito. Mas há, todavia, um senão bem relevante: a existência de entraves, já aludidos, que impedem a descolagem destas zonas e das pessoas em concreto, pelo que “… A superação destes problemas é central no exercício do desenvolvimento. A acção individual é essencial nesse sentido, mas a sua liberdade de acção é condicionada pelas oportunidades sociais, políticas e económicas. Existe uma complementaridade entre acção individual e agenciamentos sociais” (Silva: “Desenvolvimento como liberdade”). Assim sendo, só a mudança dos paradigmas e de políticas podem fazer com que estas disparidades se ultrapassem e, com isso, o êxodo rural pode ser, senão travado, pelo menos atenuado. Para se poderem atenuar os efeitos nefastos deste despovoamento, só a acção concertada de diversos agentes, os acima citados, será capaz de fazer atingir outros objectivos, os opostos a este actual estado em muitas regiões. Num longo caminho, cheio de pedregulhos, em “Democracy as a Universal Value” de AS, de 1999, este autor declara que só em democracia, num governo através da discussão, com participação das pessoas em raciocínio público, tal será viável. Conferindo um destacado papel à democracia, põe em evidência a sua importância intrínseca e constitutiva para a vida humana e consequente bem-estar (Sen, 2009), pelo que é essencial, mas não suficiente, para que se consiga chegar ao desejado repovoamento, uma espécie de miragem, por enquanto, muito embora, mais abaixo, se apontem algumas pistas de sinal contrário a estes. Introduz também aqui uma outra variável, que muito poderá contribuir para defender novas políticas e novas práticas sociais: a liberdade de imprensa (Sen, 2009), que aponta como um outro pilar de todo este complicado processo. Entretanto, já se vai falando numa luz ao fundo do túnel, que é a da pensada segunda ruralidade, a de “… Um campo plural e diverso, mais espaço de consumo do que de produção, cheio de novos actores, do homem «rurbanus», de uma nova estratificação social que conduzirá o mundo rural para a fusão do campo e da cidade… “ (António e Maria Covas – Um Portugal desordenado: a caminho da 2ª ruralidade, Universidade do Algarve, 2012) Este novo sistema, segundo estes autores, compreenderá um território complexo, onde se notem unidades de paisagens, de locais de alguma produção, de pólos culturais, com um arrojado “governo” local. Como já começa de haver quem salte a terreiro com propostas de satelização do território, onde se cruza o campo com modernas cidades, em que se perspectivem acessos a níveis de mais elevados do que aqueles que referimos, pode ser que este panorama, um dia, venha a mudar de figura, do que, por enquanto, muito duvidamos. - IV - Outras carências estruturais em matéria de disparidades sociais Como forma de, usando uma experiência pessoal, no sentido de Josué de Castro (Sete palmos de terra e um caixão), que perfilha a ideia de um sociologia não neutra, ressalvando a devida distância, trazer aqui mais referências a situações de acessibilidades absolutamente diferenciadas, basta dizer que, em grande parte da zona que habito, que fica a cerca de 40 quilómetros de Aveiro e outros tantos de Viseu, sendo hoje servida pela A25, muitas das infraestruturas essenciais a qualquer desenvolvimento só aqui chegaram nas décadas de sessenta e setenta do século passado, ou mesmo já na sua parte final. Sem vias de acesso capazes, as ligações eram feitas em estradas de terra batida, quando não apenas pela antiga via romana, os telefones só apareceram por volta de 1970, a electrificação em meados de setenta, sendo que, em matéria de estabelecimentos de ensino, surgiram os colégios particulares em 1962, com apenas o antigo 5º ano (9º actual) e a saúde concentrava-se toda nos velhos hospitais das Misericórdias e em médicos particulares, muito poucos, por sinal. O abastecimento de água da rede pública só foi ligado já em finais desse mesmo século, ou mesmo nos inícios do século XXI. Com estes curtos exemplos, quisemos apenas mostrar quanto tem faltado a esta gente do interior para que se cumpra aquilo que Amartya Sen defende como crucial, prioritário e imprescindível a qualquer processo de desenvolvimento humano. Se este autor ainda pode aceitar, como ele chega a dizer, algumas desigualdades, como as de rendimentos diferenciados, jamais acha toleráveis as desigualdades de oportunidades de género, daí o seu apelo à atenção a dar aos direitos das mulheres, heranças, etnicidade e outras. Podemos juntar a esta sua categórica postura aquela que a Declaração do Milénio veio também a consagrar: o compromisso com a justiça, com a igualdade e com os direitos humanos. Por seu lado, o Relatório do Desenvolvimento Humano, de 2005, encara de frente a necessidade de acudir ao mundo rural, porque “ … Viver numa área rural é, em muitos países, um marcador de desvantagem. As taxas de pobreza são mais elevadas e o acesso aos serviços é menor”, o que aumenta a cadeia das desvantagens face ao resto da sociedade. Assim, aquilo que expressámos no primeiro parágrafo deste capítulo, mesmo com um cunho demasiado pessoal, atesta isto mesmo. Para ilustrar a noção das questões que se levantam quanto aos rendimentos, atente-se nestes números que tentam caracterizar o PNB per capita relativamente à média nacional. Para um índice de 100, anote-se o que aconteceu, desde 1938 a 1994, em dois dos distritos onde são visíveis as mazelas das verbas baixas: - Anos 1938 – 1947 – 1955 – 1960- 1965 – 1970 – 1976 – 1980 – 1985(a) – 1994(b) - Guarda – 72.9; 75.5; 73.7; 69.5; 68.7; 67.4; 72; 75.2; 61.4; 67.3 (a e b) - Viseu – 77.1; 78.9; 75.5; 70.4; 68.5; 66.6; 72.4; 75; 55.5; 58.4 (a e b), com a) e b) a serem valores médios do continente - In (Amaro, António Rafael - Economia e desenvolvimento na Beira Alta: dos finais da monarquia à II Guerra Mundial, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2006) Na leitura de AS, por estas tabelas se notam os motivos que fizeram com que as populações deste interior português acabassem por engrossar a fileira das migrações, das saídas em massa de suas zonas de origem. Sem meios, o que se acentuou, com carácter negativo, a partir dos anos sessenta, com uma curta recuperação em duas etapas, 1976 e 1980, por isto se vê que as razões para sair eram cada vez mais prementes. Diz-nos este autor de uma tese de Doutoramento sobre estas regiões, que “… A desigualdade de tratamento e o abandono, por parte do poder central, apareciam, portanto, como nucleares na explicação para a falta de progresso na Província” (Amaro, 2006, p. 424). Constata-se aqui também um termo que tem feito moda na nossa política de povoamento, aquela que distingue Lisboa da “Província”, entendida esta com um certo carácter depreciativo em termos sociais, culturais e do desenvolvimento que estamos a tratar. A certa altura, ser da “Província” era em si mesmo um selo que marcava diferenças e que Amartya Sen, se conhecesse esta discriminação, não deixaria de condenar. Assim, ao invés de se falar em cooperação, como é defendido por JP Richards e J. Heard (2005), muito embora numa outra perspectiva ligada às ONGs, muitas vezes dividem-se as opiniões e, por aquela via da desvalorização de meios e formas de vida, pouco se faz para um trabalho solidário e cooperativo, que se impõe em todas as ocasiões e circunstâncias. Para se avaliar quanto Portugal se tem vindo a esvaziar para os grandes centros do litoral e para Lisboa, em particular, registe-se o crescimento do número de Casas Regionais que se instalaram na capital, sobretudo no século XX. Quando se instalou a República em Portugal, ampliou-se um movimento, o da criação de casas regionais, sobretudo em Lisboa, que retrata parte do êxodo rural a que nos estamos a referir: assim, apareceram ali as Casas de Lafões, 1911, das Beiras, de Tondela, da Sertã, Pampilhosa da Serra, Arganil, Figueiró dos Vinhos, Alvaiázere, Castanheira de Pera, Penacova, Tábua, Ferreira do Zêzere, Tomar, Castro Daire, Ponte de Lima, Valença, Paredes de Coura, Cerveira e Arcos de Valdevez, entre muitas outras, sendo que, ainda há muito poucos anos, se organizou a Associação das Casas Regionais em Lisboa. No Porto, a Casa da Beira Alta. Despojados do pouco que tinham nos locais de origem e frente a uma nova desigualdade, que AS não deixaria de criticar, a de não serem já cidadãos da sua terra e também não se sentirem iguais a quem agora tinham junto de si, tentam arranjar nestas Casas a forma de aí, no mínimo, terem um espaço onde possam conviver e reviver recordações e costumes, mas sem nunca deixarem de serem vítimas de mais um certo grau de discriminação e do aproveitamento de suas debilidades quanto aos trabalhos que lhes facultavam. Uma outra forma de se verem algo como excluídos eram os próprios locais e o tipo de habitação que encontravam: escorraçados, regra geral, ou para os bairros da lata, ou para as quintas e seus anexos, nos arredores da cidade, esta é para os novos desenraizados apenas o espaço do ganha-pão. Se, na zona de onde partiram, não tinham condições de bem-estar e desenvolvimento, ali também essas condições não eram propriamente obtidas, pelo que se nota que “… O rendimento e a liberdade de viverem bem e por muito tempo divergem” (AS) neste seu novo círculo social. Como para Sen as igualdades formais têm de ser apoiadas em liberdades substantivas, estas continuam a faltar porque estes novos deslocados não conseguem escolher o modo de vida e fazer as coisas que apreciam, antes, têm de se agarrar, muitas vezes, àquilo que lhe impõem, se quiserem sobreviver nestas formas adversas de existência pessoal também sem sentido. Com pouco tempo e espaço para si mesmos, era nas referidas Casas Regionais que mitigavam as suas fraquezas, convertendo-as em uma certa apresentação de sucesso aparente perante os seus companheiros de jornada e de discriminação, porque, ao menos, ainda podiam usufruir daquela qualidade de convivência entre iguais. Também na grande urbe de Lisboa, que tinha aparecido como um escape para a fuga à falta de oportunidades iniciais, não havia hipóteses para consagrarem mais uma das ideias de Amartya Sen, quando nos diz que “… A liberdade de escolher a vida que queremos pode ser algo que contribui significativamente para o nosso bem-estar” (Sen, 2010, p 58), assim como “… Pôr o foco de atenção nas vidas reais, quando se trata de avaliar da existência de justiça, é algo que trará consigo muitas implicações de longo alcance no que toca à natureza e ao alcance da ideia de justiça” (Idem, p. 14). Nem uma coisa nem outra ali estavam a acontecer: sem possibilidade de escolher o que quer que fosse, imperava a lei da sobrevivência no sentido social do termo, não tanto na perspectiva literal e não se realizava a justiça que lhes devia ser feita. - V - Uma passagem pelo sector cultural Sem podermos confundir crescimento com desenvolvimento, que são conceitos complementares, há dados relativos a valorização de sectores diversos que não podem deixar de serem aqui trazidos: como indicadores, são reveladores de informação, porque apontam, dão a conhecer, revelam, mostram sinais e outros contributos (Hermano Carmo), pelo que o seu conhecimento funciona como forma de melhor se conhecer uma dada comunidade. Como pretendemos, com este trabalho, pôr em evidência, na visão de Amartya Sen, a diferença existente entre zonas rurais despovoadas e grandes centros com demasiada concentração populacional, aquilo que se passa em respostas culturais é um índice que nos pode ajudar a compreender as razões discriminatórias que levam as pessoas a fugirem de onde essas valências não existem. Uma destas relaciona-se com o número de obras contidas em várias bibliotecas, assim distribuídas, apenas nas zonas que mais têm chamado a nossa atenção e opção, a Região Centro, em comparação com médias nacionais: - Portugal: 22602; Continente: 22649; Centro: 17562; Baixo Vouga: 16203; Baixo Mondego: 29513; Pinhal Litoral: 13471; Pinhal Interior Sul: 12110; Pinhal Interior Norte: 12246; Dão-Lafões: 16433; Serra da Estrela: 11236; Beira Interior Norte: 11513; Beira Interior Sul: 17667; Cova da Beira: 15867; Oeste: 11965; Médio Tejo: 12860 # In “Anuário estatístico da Região Centro”, 2004, INE, ano de edição 2005 Colocados assim estes números, pouco podem dizer: só que, se os olharmos em termos comparativos, logo vemos que as médias de Portugal quase são o dobro de algumas Unidades Territoriais, tais como a Serra da Estrela e a Beira Interior Norte. Como frisa Amartya Sen, a relação entre recursos, realizações, bens, potencialidades, riqueza económica, capacidade para vivermos como gostaríamos não pode, com esta disparidade, vir a ser correctamente obtida. Aliás, na sua obra “Desenvolvimento como liberdade”, entre as potencialidades elementares que cita, como a mortalidade prematura, a subnutrição, as doenças crónicas, o desemprego, entre outras, lá se faz também uma referência explícita à iliteracia (e esta expressa-se também através da rede bibliotecária e sua má afectação aos espaços nacionais) como determinante, com carga negativa, no desenvolvimento que assim se não pode ter. Ao lermos o Relatório de Desenvolvimento Humano de 2012, muito embora incida muito na vertente ambiental e na sustentabilidade, estão patentes muitas noções essenciais a estas temáticas. Assim, ali se afirma que “… O desenvolvimento humano consiste no alargamento das liberdades e capacidades de pessoas para viverem vidas que valorizam e têm motivos para valorizar. Trata-se de alargar as escolhas…”. A par desta frase, que AS subscreve, por certo, em toda a sua amplitude, ali se consagra também a noção de partilha, ao que acrescentamos a da distribuição equitativa, facto que, havendo tanta disparidade no acesso aos livros, como acabámos de citar, se não verifica e é mais uma causa para o despovoamento do interior. Um outro campo que AS gosta de colocar em cima da mesa, em termos de justiça, que associa a desenvolvimento, equidade, e capacitação, é o da razão e da emoção (Sen, 2010), sendo que a primeira se constrói pelo conhecimento e acesso às respectivas fontes, como a das obras escritas, o que, quanto a distribuição capaz, não está assegurada. A razão vem muito na ordem directa daquilo que se lê, se adquire, se torna conhecimento interiorizado e consciente. Se faltam os recursos e meios, incluindo estes das bibliotecas e seus materiais, se os rendimentos per capita são tão diferenciados, sendo que o seu crescimento – conceito que então também muito interessa a AS – ajuda a expandir a capacidade das pessoas, não sendo, no entanto, parâmetro fundamental (Evans, 2002), sempre que estes factores não estão presentes no processo de desenvolvimento, caminha-se para a condenável desigualdade, que, nesta nossa análise, leva ao tão citado despovoamento. Cabendo a François Perroux uma boa análise da diferença entre crescimento e desenvolvimento, este a encaixar aquele, não deixa de querer “… Um desenvolvimento para todos os homens e para cada homem…” (Perroux, François – Ensaio sobre a filosofia do novo desenvolvimento, FCG, Lisboa, 1981, p. 26), o que se relaciona muito com a nossa leitura destas situações e dos argumentos que AS defende, que estamos a enquadrar no esquema da leitura que fazemos do tema que aqui trazemos: o despovoamento perigoso para o equilíbrio nacional que se pretende e, mesmo, para a sua sustentabilidade, porque, faltando as pessoas, até o ambiente se desequilibra, avançando a desertificação, outra face deste dilema com que nos confrontamos. Como começámos este capítulo com uma dimensão cultural, cabe aqui continuarmos com François Perroux, quando, a seu respeito, alguém declara que “… O desenvolvimento aparece, pois, no extremo de uma tensão criadora do saber e do valor que a UNESCO tem por missão favorecer e valorizar (M.A. Sinaceur)” (Idem, idem). Sem termos dados para sabermos se esta gente do interior é pobre, no duro sentido dessa realidade, cremos que, extrapolando, podemos aceitar que está muito perto dessa situação e, a nível cultural, valorizando, no entanto, os seus saberes intrínsecos e de muito valor, isso talvez seja uma realidade palpável. Pegando num raciocínio muito assertivo de Abhijit V. Banerjee e Esther Duflo e numa sua referência a AS, ali se esclarece que “… a pobreza conduz a uma intolerável desperdício de talento…” (Abhijit V. Banerjee e Esther Duflo, A economia dos pobres –repensar de modo radical a luta contra a pobreza global, Círculo de Leitores, Lisboa, 2012, p.21). Encaixa aqui o nosso raciocínio: não aceder a bens culturais é criação de pobreza e os seus resultados aparecem depois, sobretudo no corte das capacidades que importa valorizar. É que, como dizem estes autores, a pobreza não é apenas não ter dinheiro, “…é não ter a capacidade para realizar o potencial de cada um como ser humano… “ (Idem, idem). E, se não há vias para acesso ao conhecimento essa forma de pobreza é bem grave para a calarmos. Nesta linha de orientação, entre os vários princípios de “Intervenção social e sustentabilidade” (Hermano Carmo), a área cultural e suas garantias não podem ser esquecidas, interligadas, por exemplo, com o campo social, onde se fala em qualidade de vida integral dos cidadãos, de todos os cidadãos e igualdade de oportunidades. Num tempo em que se fala tanto em resiliência, esta pode ser a força que leva a desenvolver capacidades que possam evitar sucumbir à primeira contrariedade que apareça. Só que, no que se refere ao despovoamento, esta mesma resiliência tem limites por mais que se queira ver nela a chave da solução para muitos problemas. Quase a terminarmos este nosso trabalho, que visa descrever, em linhas muito gerais e pouco aprofundadas, o que está a acontecer ao interior despovoado, AS fala muito em privação e, nesta, em condições e sentimento, o que gostamos também de enfatizar. Alude, frequentemente, a desigualdade e pobreza, sem nunca confundir estes temas, mas vendo correlação entre eles, o que nos parece que sucede nesta temática. Aliás, “… com a desigualdade social agravada nos últimos vinte anos” (Carmo, Hermano – Cultura política e educação para a cidadania: breves reflexões, 2012), também, como acrescenta, com a falta de coesão social e de orientação colectiva, tudo se agrava neste contexto. Este mesmo autor aponta então para a necessidade de uma responsabilidade que cabe, cada vez de uma forma mais acentuada, à sociedade civil e, muito importante, à educação para a cidadania. Ora, aqui está uma sugestão que Amartya Sen muito usa, associando-a à concessão de direitos substantivos, pelo que estes pontos se revelam como fundamentais em todo e qualquer processo de desenvolvimento, muito mais neste caso em que há que vencer as difíceis barreiras das muitas desigualdades existentes. Cabe aqui uma palavra especial para o campo das políticas públicas e, a este propósito, AS escreve: “ … A elaboração de políticas depende de várias influências que estão para além das noções prevalecentes do que devia ser feito. A política é uma função da organização política e depende de vários factores, incluindo a natureza do governo, as origens do seu poder e as forças exercidas por outras organizações… “ (Sen, Amartya – Pobreza e fomes: um ensaio sobre direitos e privações, Terramar, Lisboa, 1999, p.38). Aqui está o cerne da questão: o despovoamento do interior requer, para ser combatido, acção governamental e muita sociedade civil à mistura, interventiva e criativa. Enquanto não forem dados passos gigantescos, nessa área, esta chaga social e ambiental, por tabela, não desaparecerá. VI – Conclusões Quisemos com este trabalho encetar, se for possível e viável, uma grande escalada no conhecimento deste fenómeno, que muito nos preocupa, do despovoamento. Se é de gente com privações que se fala quando se parte para a sua abordagem, a erradicação destas desigualdades é um imperativo político e de consciência. Com terras sem gente, facilmente se caminha para a desertificação territorial e daí à falta de sustentabilidade, a todos os níveis, vai apenas um curto passo. E isso é que pode ser fatal para o necessário e global equilíbrio de que precisamos para sermos um país com futuro. Porém, sem a equidade e a justiça nesse equilíbrio não chegaremos a bom porto. A opção por Amartya Sen, sendo uma escolha racional, está a converter-se, pelo que sentimos, em campo também emocional. Fizemos este trabalho com gosto. Mas sabemos que tem falhas e uma delas tem a ver com a impossibilidade que tivemos em aceder a b-on, porque faltou-nos um “Plugin” qualquer e vimos sempre recusada a abertura desse importante meio. Uma coisa é certa: quando, e se isso acontecer, partirmos para a Tese, esse problema estará resolvido, por muito que custe. Assim, tentámos seguir a via de fontes credíveis para não defraudarmos nem o trabalho nem a nossa consciência. - VII – Bibliografia Amaro, António Rafael, Economia e desenvolvimento na Beira Alta: dos finais da monarquia à II Guerra Mundial, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2006 Anuário estatístico da Região Centro, 2004, INE, ano de edição 2005 Attack, Iain, Quatro critérios de desenvolvimento da legitimidade das ONGs, Dublin, 1999 Banerjee, Abhijit V. e Duflo, Esther, A economia dos pobres – repensar de modo radical a luta contra a pobreza global, Círculo de Leitores, Lisboa, 2012, p.21 Boele, Richard; Fabrige, Heike; Wheeler, David, “Shell, Nigeria and the Ogoni. A study in unsustainable development (…)”, 2001 Carmo, Hermano – Cultura política e educação para a cidadania: breves reflexões, 2012 Carmo, Renato Miguel do – Capital social e policentrismo: para uma análise reflexiva das políticas públicas, CIES, ISCTE, 2008, p. 6 Castro, Josué de, Sete palmos de terra e um caixão, 1975 Cook e Reichardt, Métodos Cualitativos y Cuantitativos en Investigación Evaluativa Covas, António e Maria, Um Portugal desordenado: a caminho da 2ª ruralidade, Universidade do Algarve, 2012 Evans, Peter, Simpósio sobre o desenvolvimento como liberdade de Amartya Sen: capacidades colectivas, cultura «Desenvolvimento como liberdade de Amartya Sen», 2002 Evolução da população na Região Centro (1950/1976), CCRC, Coimbra, 1982 João Oliveira Correia da Silva, “Desenvolvimento como Liberdade” de Amartya Sen, Universidade do Porto Jornadas da Beira Interior, Volume II, Jornal do Fundão, 1986 Lopes, António Simões - Encruzilhadas do desenvolvimento: falácias, dilemas, heresias, 2006, CES, UC, p.52 Perroux, François – Ensaio sobre a filosofia do novo desenvolvimento, FCG, Lisboa, 1981, p. 26 Relatório do Desenvolvimento Humano, 2005 Relatório do Desenvolvimento Humano, 2012 Retrato territorial de Portugal, 2004 – INE, Ano de edição, 2005 Richards, JP e Heard, J., “European Environmental NGOs: Issues, resources and strategies in Marine Campaigns”, 2010 Sen, Amartya, A ideia de justiça, Almedina, Coimbra, 2010, p. 320 Sen, Amartya, “Amartya Sen's Capability Approach, Democratic Governance and Japan’s Fukushima Disaster”. http://www.japanfocus.org/-Sachie-MIZOHATA/3648 Sen, Amartya, “Missing women: social inequality outweighs women’s survival advantage in Asia and north Africa”. http://www.sas.upenn.edu/~dludden/GenderInequalityMissingWomen.pdf Sen, Amartya – Pobreza e fomes: um ensaio sobre direitos e privações, Terramar, Lisboa, 1999, p.38

sábado, 9 de abril de 2016

RI 14 a olhar pela paz

RI 14 mostra acções de paz Há dias, por obra de um feliz acaso, descobrimos em Viseu, no Palácio do Gelo, uma exposição organizada pelo RI 14, com um sugestivo título: “ O Regimento de Infantaria 14 nos novos conflitos”. Com material vistoso, com uns militares extremamente atenciosos e dedicados à sua missão de nos informarem, por lá deambulámos uns minutos. Vimo-nos metidos em operações de paz, essencialmente. Passo a passo, estivemos perante fotografias, descrições de teatros de operações, simulação de militares equipados para as diversas funções, viaturas, armamento, documentos e outros materiais explicativos. Recuámos 44 anos, quando aquela mesma Unidade, o sempre RI 14, muito embora já tenha passado por outras designações, nos acolheu para ali darmos instrução, nessa fase com vista à partida para África então em guerra. Sentimos como que um aperto de coração, de sinal positivo, tantas são as mudanças, em finalidade, destas duas épocas, a nossa e esta de agora: a diferença abismal entre funções humanitárias e bélicas! De repente, viajámos até Timor, Bósnia-Herzgovina, Kosovo, Afeganistão. Em todos estes espaços de conflito e de tentativas de pacificação posteriores, o RI 14 tem estado activamente presente, nestes anos do século XXI, desde 2001 até aos nossos dias. Pode adiantar-se que, em 2016, ali se encontra em fase de aprontamento o 2ª Batalhão de Infantaria Mecanizado de Rodas, que tem vindo a fazer a sua formação neste Quartel de Viseu. No citado Palácio do Gelo, foi um pouco de tudo isto que esteve patente ao público de 19 a 27 de Março, a merecer francos elogios e uma atenção especial. Espicaçados por esta iniciativa, passamos para uma fase de querermos saber mais sobre esta Unidade Militar. Entre a variadíssima informação existente, aconselhamos vivamente que se leia uma magistral obra, “ O 14 de Infantaria”, edição do RI 14, do ano de 2009, disponível, por exemplo, na Internet em “repositório comum. rcaap, pt/bitstream... “. Por entre esse emaranhado de fontes, ficámos a saber que a Comarca de Viseu, em 1639, tinha 96 Companhias, que em 1808 ali chegou o RI 11, que, de 1829 a 1834, havia o Quartel da Ribeira com o Regimento de Caçadores da Beira Alta, que tivemos o RI3, de 1835 a 1837, o BI19, de 1837 a 1841, o BI 24, 1841-1842, para, neste ano, aparecer o RI 14. Com participação activa em muitos cenários, de 1845 a 1847 andou metido na Revolta da Maria da Fonte, do lado governamental, de 1914 a 1918, interveio na 1ª GG, com um Batalhão em Angola, de 1940 a 1944, esteve, no âmbito da 2ª GG, nos Açores e, novamente, em Angola, passando pela Índia, 1957-1958 e por África, de 1961 a 1974. Numa tão longa história, nestes tempos modernos, há a registar várias parcerias locais deste RI 14, que, por tudo isto, e pela relevância social e económica que tem na cidade de Viseu e no nosso distrito, não pode, nunca, ser olhado de lado, nem com displicência. Antes pelo contrário. Para dele darem testemunho, há milhares e milhares de jovens que podem desempenhar essa tarefa de conhecimento. Na primeira pessoa, pertencemos nós também a esse enorme grupo. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, Março, 2016

quarta-feira, 6 de abril de 2016

O nosso mundo em livro pela pena de António Bica

António Bica canta a nossa ruralidade em novo livro Em “ Os dias e as sombras” faz-se uma agradável viagem pelas nossas memórias, costumes e tradições que o tempo vem querendo apagar, mas que há sempre quem, dotado de saber e de afectividade por estas vivências populares, a que junta uma sensibilidade muito especial, as faz vir ao de cima e as coloca ao nosso dispor: é assim com António Bica, advogado em Lisboa, saído, como confessa com visível gosto e entusiasmo de uma aldeia, Paços de Vilharigues, que tanto transporta em seu coração e lhe serviu para a escrita de mais um livro, este que aqui se assinala. Partindo dessas origens, os contos aí estão para nos fazerem reviver esses seus tempos de outrora. Para dar a conhecer esta sua obra, em segunda edição retocada, “ Os dias e as sombras”, com a chancela da Modocromia, escolheu um lugar já com boa carga simbólica, ainda que de curta existência, a Galeria Leituras (In)esperadas, em Vouzela. Aconteceu esta sessão na noite do dia 12, em casa bem à altura do acontecimento que ali se realizava. Se mais lugares houvera, mais gente ali estaria. Em fim de noite muito bem passado, cheio de emoções, de boa música e muitas considerações culturais, pessoais e literárias, o Grupo Ars Nova, de Manhouce, capitaneado por Alexandrino Matos, professor, a quem coube ainda falar do trabalho em causa, explicando o livro, seu significado e importância, trouxe-nos uma actuação de encher a alma e a levar-nos para o mundo da magia musical com quatro requintadas vozes femininas. Quanto à descrição feita em redor destas evocações escritas, para além de ler alguns excertos, Alexandrino Matos pôs em evidência o cidadão interessado nestas causas que é o seu autor. Para falarem da obra, usaram ainda da palavra Rui Ladeira, como Presidente da Câmara Municipal, que bem soube mostrar o seu grande contentamento pelo facto de António Bica ter escolhido esta terra para esta finalidade, quando tanto por ela tem feito desde sempre, na Cooperativa, de que foi destacado dirigente, nos órgãos autárquicos que integrou e nas funções culturais e políticas que tem desempenhado ao longo de sua vida muito e bem preenchida, neste caso, na vertente da defesa das nossas raízes o que é de relevar e aplaudir. Coube a António Moniz de Palme abordar a vida do escritor ali em destaque, ele que o conhece desde os bancos do Liceu em Viseu, por terem sido colegas de turma do 1º ao 7º ano dessa época. Trouxe para a atenta plateia muitos episódios desses e doutros tempos, pondo sempre em evidência o humanismo e o saber do autor de “ Os dias e as sombras”. Como autor do prefácio e da decoração da capa, bem mostrou estar por dentro daquilo que ali disse. Maria Esther, da Editora, disse quanto a alegrava estar ali em cerimônia tão simples e tão emotiva, o que honra o trabalho de pôr na rua mais este trabalho. Na condução da “ordem do dia”, Maria Carmo Bica, ao distinguir as funções ali a desempenhar das suas ligações familiares, por ser sobrinha, não escondeu a emoção que ali sentia e não era para menos. Numa viagem que já fizemos pelo livro, notámos que são diversos os pontos geográficos referidos, com destaque para as nossas terras, mas ainda para a raia fronteiriça, para Coimbra, Viseu, Lisboa, Alentejo, em descrições de fino recorte literário que prendem o leitor do princípio ao fim. Com personagens de ficção, mas a retratarem as nossas gentes, muitos são os temas ali presentes: as traquinices infantis, os trabalhos do campo, as agruras da fome e do pé descalço, o milagre de quem estuda, a fuga para Lisboa para carregar caixotes como marçanos, a vida militar, os costumes, as profissões, a descrição ao pormenor das ceifas, das regas, do linho, das vindimas, dos moinhos, das sementeiras, das ementas, do pão que era sempre pouco, da História nacional e mundial, enfim, um vasto painel de quadros de vida rural que, em termos e conceitos, são um primor de repositório patrimonial que muito valoriza o nosso saber. Por ter ainda conhecido uma das personagens concretas e aqui chamada pelo seu nome, o Padre João Garcia, confesso que muito prazer pessoal me deu esta sua evocação, pondo nos píncaros da lua o bom homem que foi esse humilde e digno sacerdote, ex- colega de Salazar, mas com quem não ia muito à sua missa, como se pode ver numa breve alusão à sua posição pública aquando das eleições presidenciais em que intervieram Américo Tomás e Humberto Delgado, cabendo a este General as preferências de nosso conterrâneo da Ponte – Reigoso. Com este desabafo de ordem pessoal, está de parabéns António Bica e Lafões muito mais enriquecido culturalmente. Carlos Rodrigues, In “ Notícias de Vouzela”, 2016

terça-feira, 5 de abril de 2016

Uma verdade com dois sentidos...

Eu sei que não é fácil confessar isto, mas, em nome de meus valores, tenho de desabafar: corre mundo a notícia de um conterrâneo ( e amigo meu), o Idalécio Oliveira, de Queirã-Vouzela, estar envolvido no escândalo do Panamá, referente a lavagem de dinheiro, de fuga ao fisco, de busca de esconderijos para fortunas pessoais e empresariais. Não posso negar essas acusações. Mas também ainda as não posso comprovar, muito embora, pelo seu estilo de vida, haja fortes probabilidades de isso ter acontecido. Agora, aqui chegado, vem ao de cima a outra parte da verdade que eu conheço - a sua capacidade e interesse empresarial em investir na sua terra, a cordialidade que demonstrava nos contactos havidos, a sua alegria em ver crescer a sua e nossa região. Fico-me com esta vertente. A outra, a da escala mundial, mostrando uma outra sua costela, deixo-a para uma reflexão mais profunda. Sendo enorme e quase desgovernado o seu barco, fácil lhe foi encontrar um ancoradouro, mesmo que tenebroso. Essa é mesmo outra história: o Idalécio com quem falei algumas vezes ( e que teve casa à beira de uma "minha")vejo-o com os olhos daqui. E esses dizem-me que, sendo um homem bom daqui, mas destemido e aventureiro, se venceu em muitos casos, também se deixou inebriar por outros. Apenas isso...