sexta-feira, 30 de março de 2018

Povoamento em Lafões

Lafões habitado desde há milhares de anos Nas crónicas que temos vindo a escrever sobre a região de Lafões, passámos duas ou três em deambulações pelas questões da natureza e do território em si mesmo. Tudo isso é importante, mas pouco compreensível se não prosseguirmos estas longas viagens falando das pessoas. São estas, em primeiro lugar, que nos interessam. Elas e, sobretudo, as comunidades em que se integram e onde desenvolvem o seu dia-a-dia. Metamo-nos, então, por esses caminhos, o que não será tarefa nada fácil, mas é para isso que servem as fontes, os testemunhos, os exemplos de quem por aqui foi andando e nos foi deixando, no cumprimento da interminável lei da vida. Nas escolhas dos espaços a habitar, ou a usar como campo de passagens ainda que um tanto breves e ligeiras, como aconteceu com os primeiros povos, em diáspora permanente, que aqui buscaram víveres e riquezas, Lafões teve tudo para atrair esses nossos antepassados. Filhos de gente que veio de tantos lados, o mar por perto, o clima convidativo, os rios, mormente o Vouga, com potencialidades para navegação, os empurrões sucessivos que as populações sofriam por essa Europa fora, em função das variações do clima e das contingências sociais e políticas das diferentes épocas, foram os factores e elementos que às nossas terras fizeram chegar esses primeiros e os outros habitantes. Num misto de insegurança e resguardo das suas identidades, não é de estranhar-se que, primeiramente, optassem pelo alto dos montes, desde que, ao seu lado, houvesse água, sempre necessária à vida de ontem, de hoje e de amanhã. Na busca dos vestígios das maiores permanências, desde logo nos deparamos com os pontos de maior altitude e visibilidade estratégica como pousos a escolher. A história ainda hoje anda às aranhas para encontrar as marcas e a datação de quem nos antecedeu. Em regra, sempre que se faz uma qualquer descoberta, esta aponta para tempos cada vez mais recuados. Muito possívelmente, esta nossa zona nos reserva, a esse nível, boas e agradáveis surpresas. Assim, tudo quanto agora possamos afirmar pode, dentro de tempos, ser desmentido, por novos factos e conclusões diversas. Por exemplo, em 2015, Nadia Drake . na National Geographic, depois de tanto se ter falado no austrolopiteco, vem colocar-nos em cima da mesa a hipótese do “homo naledi” como outra das muitas pistas a serem seguidas. Sem deixar de afirmar que este processo de criação de conhecimento está muito longe do seu fim (e alguma vez o estará?), lança deixas para que aumentemos a carga infindável de ciência e de dúvidas. O que têm estas reflexões a ver com a história de Lafões? Tudo e nada. Tudo, porque muito do que pudermos dizer pode ser destruído a qualquer momento por outras evidências. Nada, se tudo isso se passar ao lado das nossas e outras teses referentes a estes territórios. Se é variada a literatura científica em que se trata destes e doutros aspectos da vinda e vida de nossos antepassados, difícil é escolhermos e fazermos opções quanto à necessidade de encontrarmos boas (as melhores) respostas para tantas incertezas com as quais, infelizmente, teremos de continuar a conviver. “ Por terras de Viriato – Governo Civil, Museu Nacional de Arqueologia, 2000” apontam-se nomes que muito deram e têm dado a estas matérias relativas ao homem beirão, a saber: Leite de Vasconcelos, Amorim Girão, Santos Rocha, José Coelho, Vera Leisner, Leonel Ribeiro, Celso Tavares da Silva e Castro Nunes. Permita-se-nos que, no que toca a Lafões, aqui citemos Jorge Adolfo Marques, pelos seus múltiplos contributos nos últimos anos. E outras personalidades, muitas outras, de certeza, como haveremos de ir descobrindo e citando. Para que se produzam obras com peso e rigor, verdade e autenticidade, são usados mecanismos científicos que pouco têm variado ao longo dos anos, a não ser pelos acrescentos que as novas teccnologias vão permitindo trazer ao de cima. A evolução do crânio, o bipedismo, a fala, os tipos de alimentação, as ferramentas pensadas e criadas por cada comunidade humana, os fósseis encontrados, os sinais onde se nota mão do homem são as peças sem as quais nada pode ser descrito e apresentado ao público como sustentável e credível. Pelas nossas bandas, os castros, as grutas (poucas), as antas, as pinturas e símbolos rupestres são aquilo que nos faz saber que é antigo o povoamento destas terras de Lafões. Para Nabais, Rodrigues e Martinho (1991) – Oliveira de Frades, edição da Câmara Municipal – nada acontece por acaso, quando nos dizem que “... Não podemos esquecer-nos, no entanto, de que múltiplos factores condicionam a presença e a permanência das populações num tempo e num lugar concretos. Não se vive no vazio. Se os nossos contemporâneos buscam a melhoria das suas condições de vida, aqueles que nos antecederam radicaram-se neste solo porque nele encontraram razões para viver... “ (p. 35). Por isso, se fixaram, primeiro nos altos dos montes, na Várzea (Reigoso) e noutros sítios de características semelhantes. Por sua vez, João Carlos de Senna- Martinez e Ivone Pedro ( Por terras de Viriato), falam num período de um “desenvolvimento de uma rede florescente de povoamento, p. 119”, o dos tempos do bronze final, citando, entre outros exemplos, o Castro de Nossa Senhora da Guia (Baiões). Já Ivone Pedro e João L. Inês Vaz nos trazem, na mesma obra, os povoados do Cabeço do Couço e Paços de Vilharigues (Vouzela) e Castro da Cárcoda (S. Pedro do Sul) como pertencentes à Idade do Ferro. Nesta viagem de milénios por Lafões, muitas serão as referências a estes temas das opções por sítios para se vir, viver e ficar. É isso que nos irá ocupar tempos sem fim, aos poucos e até aos solavancos. Veremos. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, Março 2018

segunda-feira, 26 de março de 2018

Floresta e madeiras

A floresta e as madeiras em debate As nossas florestas e matas mostram-nos, em quase todo o lado, quadros de tristeza, de negrume e, agora, de um sentimento de vazio em função dos cortes, em massa, de árvores que estão a ser feitos um pouco por todo o lado. Ao olharmos para elas, sentimos como que um sentimento de uma orfandade muito especial: falta-nos qualquer coisa insubstituível. Se Lafões é assim, desde o mar à Serra da Estrela as variações são muito poucas, para não dizermos nenhumas. Nesta imensa catástrofe, nada ficou como dantes. A opinião de quem trabalha nestes sectores Muito ligada a estes sectores, a família Machado começa de sentir alguns apertos (como nos relatou Sérgio Machado, da terceira geração), mas ainda sem problemas de maior. Com o corte de madeiras verdes fechado, neste momento trabalham apenas madeiras queimadas. Fazem ainda limpezas de várias áreas. Só que o valor comercial dessas madeiras é muito reduzido ou quase nulo. Com a desvalorização em curso e a racionalização nos postos de recolha, tudo se agrava. Não obstante estes condicionamentos, ainda têm conseguido os produtos de que precisam a nível nacional, mas as exportações para a Espanha estão na estaca zero. Frisa que deveriam existir incentivos às plantações em vez de tantas limitações. Fala nisto, disse-nos, até para não fazer desanimar os produtores florestais. Por sua vez, Laurindo Almeida, construtor civil, adiantou-nos que ainda não teve dificuldades em obter madeiras para as suas obras, servindo-se de serrações da região. No entanto, por se tratar de produtos queimados, já se notam alguns sinais de pinho “azulado”, sinal da sua menor qualidade, quando comparada com as árvores verdes. Com alguma capacidade em armazenagem, por ora, tem o problema resolvido, mas, no futuro, podem surgir alguns problemas. Mais ou menos afinado pelo mesmo diapasão, Miguel Marinha, da Teaga, alega que ainda não teve falta de matérias-primas. Teme, porém, que com as partes não ardidas a ficarem desertas também de árvores, haja, amanhã, reflexos negativos nas quantidades e nos preços, que podem vir a disparar. Para Carlos Cruz, da Casanova quanto a madeiras, de momento, ainda as vai conseguindo. O pior está na obtenção dos aglomerados e derivados, sectores em que se notam atrasos nos prazos de entrega e alguns custos mais caros. Dá, assim, duas explicações de sinal contrário. Por um lado, a construção civil vive uma boa onda, mas, em sentido inverso, a eventual falta de material pode acarretar problemas bem desagradáveis. Focado muito nos mercados de Lisboa e Porto, consome largos milhares de m2 em placas e uma a duas centenas de m3 em madeiras. Se estes materiais escassearem, não deixará de sentir dificuldades, que terá de vencer. Ainda há quem exporte Em Fataunços, José Carlos e José Manuel, pai e filho, ainda conseguem exportar para Espanha o fruto do seu trabalho: a madeira serrada e aparelhada. Nestes momentos, trabalham apenas também com pinheiro e eucalipto queimados. Até agora, ainda não tiveram problemas em escoar o resultado de seu esforço, que passa por comprar, cortar, serrar e encaminhar para os mercados. Dentro do país, enviam madeira para Estarreja, Águeda, Sever do Vouga, Oliveira de Frades e outras terras. Lá fora, é Espanha que absorve as suas matérias-prima. Trabalham na sua empresa sete pessoas, mas sentem que podiam absorver mais força manual, mas não aparece ninguém. 30 ou 40 toneladas por dia é quanto ali se produz. Paralelamente, operam ainda na área das lenhas, sobretudo de carvalho, mas esta componente bastante marginal em relação aos seus objectivos prioritários. Em termos de qualidade, tudo a bom nível. No dia em que aparecer furada a madeira de pinho e eucalipto, então há que rever tudo isso. Por enquanto, as preocupações, a esse nível, estão bem controladas. Nesta viagem pelo mundo das madeiras em tempos de pós-incêndio, o panorama ainda se vai mantendo em linha de conta com a qualidade que se deseja. Mas o futuro pode trazer mensagens bem piores. Oxalá que não. Outras pistas Para Pedro Pinhão, da Toscca, “é inquestionável que a indústria transformadora de madeira se vai debater no futuro próximo com escassez de matéria prima” Entende que a madeira queimada ainda pode ser usada, mas quanto ao seu ramo tal é impossível.. A seu ver, “existe espaço para floresta de lazer, de reserva, de pedagogia e também de produção. O nosso problema é a ausência de gestão, desordenamento generalizado e absentismo. Com pena a TOSCCA, cada vez mais dependente de importação de matéria prima e provavelmente menos competitiva em termos internacionais, está a procurar áreas para florestar em países como o Brasil, pois em Portugal não existem áreas que viabilizem investimento com massa critica para gerar abastecimento futuro: Nada fazer significa que não teremos madeira para o futuro próximo. È pena…. A floresta tem o seu tempo, ciclos de renovação lentos e nós (se não agirmos correctamente) perdemos a sustentabilidade.” Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, 22 Março 2018

domingo, 18 de março de 2018

Lafões, antes do homem a natureza

Lafões com a natureza a ser mãe do território NLafões, 4jan18 A terra que habitamos é esta e não outra. Esse é o seu melhor capital, porque insubstituível, porque impossível de ser deslocalizado. Esta vantagem ninguém no-la tira. A do capital móvel e volátil vem e vai, chega por boas marés, abandona-nos quando o mar está revolto. A nossa natureza, talhada para nós e para quem nos visita, ou para aqui vem e fica, fez o seu trabalho e que bom que ele é! Diferente de tudo quanto tenha sido feito noutro local, marca-nos e segue-nos por todo o lado. Por ser nossa esta paisagem e, sobretudo, por ser obra de um deus maior e criativo, amigo destas paragens, é com gosto que a temos como coisa e causa nossa. Encaixados entre um norte quase duriense e um sul meio mondeguino, neste meio termo, temos feito a nossa vida. A bacia hidrográfica do Rio Vouga, com os paralelos 40º 33’ e 40º 57’ norte e 7º33’ e 8º35’oeste, é uma de nossas grandes referências. Como assegura Cristina Maria Cordeiro de Carvalho Rodrigues ( “Termas: risco de inundação – 1960/2001, FLUC, 2009), somos filhos das formas de relevo mais elevadas com origem no Maciço Hespérico e das mais suaves filiadas na Orla Mesocenozóica Ocidental. Com uns pais e umas mães com nomes tão esquisitos, não é de estranhar-se que aqui vivam gentes tão diversas, o que é a nossa maior riqueza. É essa variedade natural que molda todos os nossos tempos, os passados, os presentes e os vindouros. Mas o nosso mestre maior, Aristides de Amorim Girão, é muito mais incisivo que nós na caracterização deste nosso território, dizendo nas suas “Antiguidades pré-históricas de Lafões, UC, 1921”: … “ Pois bem! Lafões fica em pleno coração da Beira Alta e constitui uma região encravada na bacia hidrográfica do Vouga, onde representa a zona mais acidentada, de variadíssimos aspectos, é certo, mas formando um todo homogéneo e correspondente portanto a uma verdadeira região natural. Por isso, este abençoado rincão, que já alguém chamou «a terra mais portuguesa de todo o Portugal», constitui para nós uma pequena pátria-mãe, numa afirmação bairrista que deve ser a pedra basilar de todo o patriotismo… “ (P.2). Com um clima (ver Cristina Rodrigues, 2009) que apresenta uma temperatura média anual, entre 1931 e 1960, tomando como referência a área territorial do Rio Vouga e, mais concretamente, as Termas de S. Pedro do Sul, que anda em redor dos 12.7º C e uma amplitude térmica anual de 12.3º, os mínimos encontram-se em plena Serra do Caramulo, com -7º, em Dezembro e Janeiro e uma humidade do ar de 84% na mesma zona serrana, subindo para os 90% em S. Pedro do Sul. Afirma-se nesse estudo que os meses mais chuvosos são os que medeiam entre Outubro e Abril, em que, por regra, ocorre 75% da precipitação anual, que anda pelos 1323/1387 mm. Com influências climáticas que nos chegam do Oceano Atlântico que atenuam o ar mais agreste das áreas montanhosas, estamos como que metidos numa estufa que nos confere um certo conforto a este nível. Nas entranhas da terra, na falha tectónica que parece vir de Chaves para Sul, havendo quem a localize entre Verin e Penacova, as Termas estão nela contidas, continuando pela Ribeira de Ribamá o seu percurso, dando origem à formação de altas temperaturas que nos fornecem um dos nossos bens mais preciosos: as águas quentes termais. Dizem os estudiosos dessas questões geológicas que estas vêm no seguimento das da citada “aqua flaviae”, das de Vidago e várias outras fontes do mesmo género. Sendo esta uma matéria para uma análise mais profunda, de modo a conhecermos melhor as nossas profundezas, estas referências já nos dão uma ideia do solo que pisamos, rico em granitos, xistos, grauvaques e quartzitos. Um bom e minucioso ponto de apoio para se estudar estas matérias tem no Professor Martim Portugal ( de Oliveira de Frades) o seu coordenador e foi editado, em 2003, pela Universidade de Coimbra, sob o título “Geologia de engenharia e os recursos geológicos”. Nesta vasta obra, em que participaram vários autores, são abordados aspectos que, pela sua profundidade, muito podem interessar quem pretenda ir mais a fundo nestas questões: desde as rochas ditas normais aos minérios (incluindo volfrâmio e até urânio), de tudo ali se vê um pouco. Quanto ao que diz respeito a este nosso território, é elemento de grande valor, aqui se deixando esta nota. Diga-se que Lafões tem nos seus conterrâneos, ambos da Universidade de Coimbra, os Professores Aristides Amorim Girão e, mais recentemente, Martim Portugal, um pilar científico que, pelo conhecimento destas paragens, muito valoriza as suas investigações Falando agora em mais pormenores da bacia hidrográfica do Rio Vouga, a 3ª maior no panorama nacional, temos como seus afluentes, na margem direita/norte, os Rios Caima, Mau, Arões, Teixeira, Varoso, Sul e Mel, isto da foz para a nascente e apenas confinado, em parte, ao território lafonenense; na margem esquerda, há os Rios Águeda, Marnel, Zela, Ribeira de Ribamá, Rio Troço e Ribeira de Brazela. Para cada um destes cursos de água correm muitos outros, pelo que esta é uma teia que não se fecha nestas indicações. Se nos debruçarmos sobre as suas respectivas bacias, verificaremos que a lista aumenta de uma forma considerável… (Continua) Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, Janeiro, 18

sábado, 17 de março de 2018

Um olhar para um interior a ficar às moscas

A participação em políticas territoriais - Conferência, Universidade de Aveiro, “ A participação em planeamento do território e políticas públicas”, 23 e 24 de Fevereiro, 2017 - Contributo de Carlos Tavares Rodrigues -1 - Questão prévia: “ Quem nos perguntou onde gostámos de nascer e viver?” ---- Ver a luz do mundo num espaço que as políticas públicas do Estado Novo já tinham marcado como zonas em declínio em favor das grandes metrópoles do litoral ---- Logo, qualquer discussão para fazer reverter esta situação precisa de ir buscar armas e argumentos de peso que a História já nos negou durante décadas ---- Assim, a participação em planeamento do território já não consegue eliminar mazelas antigas e feridas que deram cabo do nosso tecido social ---- Mas, por outro lado, também não podemos atirar a toalha ao chão e, vendo tudo perdido, deixar andar -2 ---- Entra-se, assim, na pertinência desta Conferência: - 1 – Se outros nos impuseram soluções centralizadas, saibamos nós construir outros métodos de fazer política de planeamento territorial. - 2 – Nesta medida, apresentemos alguns exemplos institucionais e outros mais ligados às dinâmicas das nossas comunidades ********** - No primeiro caso, falemos das Comissões de Acompanhamento na elaboração dos PDM, PGU e PU, entre outros instumentos de planeamento municipal e respectivos processos Um exemplo de uma participação vinda de cima para baixo, em termos de legislação enquadradora, mostra bem o pendor centralista que se pretendeu com essas Comissões. Para darmos um exemplo bem distante de experiências pessoais vividas nesse âmbito, fomos até Celorico da Basto (2011) e citemos os intervenientes, a esse propósito, nas operações relativas à revisão do seu PDM – Administração Regional Hidráulica do Norte, Direcção Geral de Energia e Geologia, Autoridade Florestal Nacional, Estradas de Portugal, DREN, IGP – Instituto Geográfico de Portugal, Assembleia Municipal, Câmara Municipal, CM de Amarante, CM de Mondim do Basto, CM de Fafe, CCDRN. Não compareceram: ANPC, ARS Norte, DREconomia – Norte, DRAP N, Turismo de Portugal, DR Cultura N, IGESPAR e CM de Felgueiras. Uma forma mitigada de partcipação pública em torno dos PDM é aquela que passa pela possibilidade de recurso directo em matéria de impugnação e a declaração do pedido de ilegalidade das normas. É notório naquele exemplo de Celorico de Basto uma forma de participação mas com fraco impacto externo, isto é, com poucos reflexos no tecido social das diversas comunidades, que passam ao lado destas questões. Como forma de atenuar estas falhas, temos as divulgações na Imprensa, as Conferências, as reuniões públicas para divulgação desta temática, a fase da Discussão Pública oficial, sendo que as publicações em DR do regulamento e das versões reduzidas das plantas de ordenamento e de condicionantes ficam muito aquém das necessidades de divulgação que seria necessário proporcionar às populações a que se destinam. O mesmo raciocínio de pode aplicar aos PU, PP e outros instrumentos afins. Para Júlia Maria Lourenço (2003), em Portugal tivemos dois grandes momentos em que estes documentos de gestão do território foram bastante empolados – os Ante-Planos Gerais de Urbanização, a partir de 1934, e os PDM, nos anos 80 e 90, muito por pressão dos fundos comunitários. Mas, em qualquer destes casos, a participação pública “ fica reduzida à sua expressão processual... “ P. 44 Nestas áreas, cabe aqui uma referência aos vários estudos de impacto ambiental e aos inquéritos diversos sobre programas a implementar. De qualquer modo, têm sempre uma vertente governamental que lhes retira a função essencial de qualquer participação pública que se deseja viva e participante. Aliás, a CRP nos Artº 26 fala no direito pessoal à capacidade civil e à cidadania, no Artº27, à liberdade, no Art. 45º ao direito de reunião e de manifestação e no Art. 48ª, muito em concreto, à participação de todos os cidadãos na vida política, sendo que o Art. 52ºalude às acções populares. Para João Ferrão (2012), o ordenamento do território é função pública do Estado e sua tarefa fundamental. Logo, a ele se deve exigir a participação activa de todos os seus cidadãos. Nesta medida, as políticas públicas são uma questão de consciência política e de cidadania, como acentuam Liliana Oliveira e Anabela Carvalho em “ Envolvimento e participação dos cidadãos na ciência em Portugal e na Espanha” – Universidade do Minho, 2012. Já Ricardo Alexandre Azevedo Condesso e Fernando Condesso anotam muito especialmente que o princípio da participação nas “ Características e princípios gerais da política e do direito do planeamento territorial em Portugal” deve ser bem e profundamente aplicado. Se estas são algumas das muitas reflexões oficiais sobre participação pública, a sua maior demonstração aplicada processa-se mais na esfera da sociedade civil. ***************** - Neste segundo plano, peguemos nos GAL e nos programas LEADER, formas de planeamento de proximidade e de parcerias locais diversas. Óscar José Rover e Maria Adosinda Henriques, na sua “ A gestão democrática em debate: o programa LEADER e a sua relação com a sociedade civil local” (www. ces.uc.pt....) abordam aspectos que, desde logo, nos fazem sentir que a participação pública se torna, eventualmente, mais efectiva, por haver uma autonomia local na definição de estratégias e projectos e uma ligação aos actores sociais. Deste modo, essa participação, na organização de cada processo de desenvolvimento, é bem aceite e até estimulada. Por outro lado, a constituição das Associações que concretizam no terreno este programa parte, de imediato, com uma boa vertente popular, na medida em que entidades locais e autarquias devem conviver em regime de uma certa paridade, o que potencia a necessidade de diálogo e divulgação de cada projecto. Falando duma realidade que bem conhecemos, a ADDLAP, anotemos um de seus focos de acção que foram os Centros Rurais, por exemplo, em que a participação popular teve um papel determinante na escolha dos projectos a concretizar. Para além do LEADER, muitos outros exemplos de real participação pública têm a ver com a sociedade civil, em termos de associações, de grupos de debate e pressão, assim como é determinantes o papel da comunicação social e, mais recentemente e com uma grande acutilância, das redes sociais. Para além destes meios, a entrada em cena de redes de investigação, do trabalho académico, das acções em cooperação entre diversos agentes são uma forma de participação pública que ganha cada vez mais força e interesse. Importantes são ainda os Museus e os Centros de Interpretação, tal como os diversos fóruns de políticas públicas, como aquele que resulta do trabalho de Maria de Lurdes Rodrigues e Pedro Adão e Silva, 2012, ISCTE –Lisboa, em que se advogam os princípios da articulação entre a teoria e a prática, o acesso ao conhecimento e competências transversais e a promoção de um ambiente pluralista e diversificado, citando-se Al Gore e a sua ideia de que o debate público e racional das ideias políticas foi e continua a ser essencial na construção da democracia. Por sua vez, Paulo Neto e Maria Manuel Serrano (2015), anotam a preocupação constante em termos de auscultação e colaboração com as diversas entidades e agentes da região do Alentejo, no seu caso, cabendo aos actores locais a tarefa de conceberem os seus planos de acção. Num caminho que tem sido lento, “ ... De nada vale mudar as leis se não se mudar de vida. E mudar de vida significa, sobretudo, e no caso que esatmos a apreciar, mudar de cultura e de mentalidades quanto ao urbanismo que o País tem e quanto ao urbanismo que o País devia ter... “ (Fausto de Quadros, in 2º Colóquio Internacional – Um código de urbanismo para Portugal? – Actas, Livraria Almedina, Coimbra, 2003, 9.35). Esta conclusão, passados treze anos, ainda tem aqui plena razão de ser, não obstante se terem ampliado as formas e meios de partcipação pública, como o GEOTA e outras associações. A terminar, em Vouzela, está em curso um processo de participação pública num projecto de intervenção territorial de longo alcance – a criação do Parque Natural Vouga – Caramulo, que este Município está a dinamizar.

quarta-feira, 7 de março de 2018

A história e S. Pedro do Sul

Nlafões3set15 Viajar pela história de S. Pedro do Sul Perdidas nos muitos quilómetros de documentos que se encontram guardados a sete chaves no Arquivo Nacional Torre do Tombo (ANTT), há sempre pérolas ali encontradas que fazem as nossas delícias e são uma forma de melhor conhecermos o nosso passado. Grande parte dele – o da pré-História - não está dentro daquelas instalações, mantendo-se firme por aqui ou então a ter merecido a cobiça de quem, caçando esses tesouros, os transportou consigo, ou, por outro lado, os fez divulgar num qualquer museu. Neste último caso, valha-nos a vantagem dessa opção. É de papéis ou outro género de testemunhos escritos que vamos falar, que foram esses que ali encontrámos, entre muitos outros, e que aqui registamos sem muitas considerações, da forma que se segue: - 1245 – Bula de Inocêncio IV, dirigida ao Prior de Grijó, pedindo-lhe que resolva as questões em que são intervenientes os bispos de Coimbra e Viseu acerca das igrejas de S. Pedro do Sul e outras, existente nos documentos eclesiásticos, 1102-1365, Sé de Coimbra. Com esta cidade com notável prepoderância nestas alturas, a Sé e o Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra estendem a estas nossas terras os seus poderosos e absorventes tentáculos a todos os níveis. - 1528 – D. João III (ver Livro 52 da sua Chancelaria) manda apartar a vila de Gafanhão da jurisdição e limite da terra de Lafoens, por ser importante o seu crescimento. Deduz-se que estava então em franco progresso, que a fazia credora dessa emancipação, com prejuízo para o administração do concelho lafonense. - 1718 – Carta em que o Rei D. João V faz mercê e doação ao Senhor Dom Miguel, na pessoa de seu filho, o Duque de Lafões, D. Pedro, para que venha a ter na sua posse a terra e concelho de Lafões, que compreendia duas vilas, as de Vouzela e S. Pedro do Sul, com todas as respectivas implicações, como se pode ler no Livro 10 da Chancelaria daquele rei, D. João V. Este ducado veio a possuir, através de seus detentores, notáveis contributos na história de Portugal, nomeadamente, no combate às Invasões Francesas, no Batalhão Académico e noutros postos e funções, assim como, num período negro em perseguições, no âmbito do processo que envolveu os Távoras, chegou a pensar-se que havia ligação do Duque à propalada conjura destinada a derrubar D. José I. Provou-se depois que esse boato tinha pouco fundamento, pelo que foi ilibado das acusações que lhe faziam. Pior sorte tiveram os seus familiares, o Duque de Aveiro e os Távoras em si, que foram dizimados de todo, tendo-se queimado suas propriedades e raspado os brasões que lhes diziam respeito. - 1751 – Carta de D. José I enviada ao Conde de Resende D. António José de Castro, confirmando-lhe a doação por sucessão das terras de Bemviver, Sul, e da Quinta de Roriz, tal como se relata no Livro 15, da sua Chancelaria. - 1761 – Alvará atribuído a D. Rodrigo António Lopes de Carvalho Fonseca Camões de Lencastre, concedido por D. José I, com mercê do senhorio dos coutos de Abadim e Negrelos, de que foi donatário seu avô, presumindo nós próprios, com pedido de ressalva para eventual falha que estejamos a cometer, de que se trata de domínios existentes nesta nossa Região (Livro 4) Estes foram apenas uns curtos apontamentos extraídos um pouco ao acaso, o que mostra bem a riqueza em informação que o ANTT encerra nas suas modernas instalações, situadas na Cidade Universitária de Lisboa, que merecem uma atenção meticulosa no sentido de se irem colher muitas e muitas mais fontes, para com elas se ligarem os respectivos nós e se escrever a história deste concelho, tão rico e tão diverso na sua essência. Mas essa é operação que requer outra atenção e tempos infindos para se não perder pitada das Chancelarias e outras origens documentais, algumas delas ainda não acessíveis mas a caminho dessa disponibilização total. Diga-se que, na esfera da divulgação científica, foram dados passos gigantescos, indo-se ainda no início, quanto à oferta de digitalização online, o que vem dar uma acessibilidade incomparável a estas preciosidades. No limite, aqueles quilómetros e quilómetros de folhas estarão ao nosso alcance qualquer dia. Vindo longe esse momento, ele surgirá de certeza. Ou pelo menos assim o cremos. Carlos Rodrigues

terça-feira, 6 de março de 2018

Tratamentos termais a retomarem apoios oficiais

Até que enfim! Desde os primeiros anos da crise que os tratamentos de saúde em espaços termais estavam interditos. Grossa asneira foi essa! Agora, finalmente, as respectivas compensações vão voltar a ser aceites, o que se saúda e se aplaude, por razões de bom senso, boa justiça, bom equilíbrio territorial e visão alargada em termos de desenvolvimento. Vejamos: a maioria das Termas, como as de S. Pedro do Sul, na zona de Lafões, estão localizadas no Interior. Logo, quem perdeu com essa medida restritiva foram as comunidades destas terras, a que se acrescentam Chaves, Vidago/Pedras Salgadas, Alcafache, S. Gemil, Ó, Monfortinho, Gerês e tantas outras localidades mais. Mas, além disso, quem muito fica a ganhar são os doentes que têm nestes tratamentos um alívio para seus achaques. Ter visto isto é olhar por todos nós. Ainda bem!...

quinta-feira, 1 de março de 2018

300 anos do Ducado de Lafões, 1718/2018

Título do Duque de Lafões com trezentos anos A 13 de Fevereiro de 1718, D. João V, um mãos largas, como se viu pela obra que mandou erguer no Convento de Mafra, premiou seu familiar e afilhado, Dom Pedro Henrique de Bragança, com uma prenda de encher o olho e as algibeiras, oferecendo-lhe o título oficial, e pela primeira vez, de Duque de Lafões. Assinalam-se, agora em 2018, trezentos anos desse acto solene, que viria a ser confirmado por carta de 5 de Novembro desse mesmo ano. Nascia então a figura do nosso 1º Duque. Numa história que se foi construindo ao longo destes três séculos, esta realidade jamais deixou de fazer parte do nosso dia a dia. Era seu pai D. Miguel de Bragança que já detinha este ducado, por tradição, e que, por sua vez, era filho legitimado do rei D. Pedro II, a partir de uma relação extra-conjugal com D. Ana Armanda de Vergé. Tendo-se casado D. Miguel com D. Luísa Casimira de Sousa Nassau e Ligne, filha única da 5ª Condessa de Miranda, 2ª Marquesa de Arronches, 29ª Senhora da Casa notabilíssima de Sousa, tendo ainda muitos morgados e padroados, como se nota em “ Inventário de Lisboa, 1719, Norberto de Araújo, fasc. VIII, CML, 1950”, tudo se vinha a conjugar para a edificação de um enorme império senhorial e territorial. Com uma continuidade que ainda perdura, muito embora de uma forma algo simbólica, que a República, a partir de 1910, extinguiu estes cargos e distinções da monarquia, ao Ducado de Lafões se associou, sobretudo num vasto período de alguns séculos, um invejável património, tendo mesmo sido uma das grandes casas reais de então. Se do lado paterno havia alguns pergaminhos, o grosso da coluna, em bens, gera-se na fonte materna de D. Pedro Henrique de Bragança, que vem a herdar os morgados pertencentes à Casa de Arronches, passando a ser o I Duque de Lafões, III Marquês de Arronches, VII Conde de Miranda, Senhor do Concelho de Lafões e das villas de Miranda, Corvo, Folgosinho, Soza (Vagos), Podentes, Vouga, Oliveira do Bairro, assim como detentor das Comendas de S. Vicente de Vila Franca de Xira, Santa Maria da Golegâ, Nossa Senhora das Olhalhas, Santa Maria da Marmeleira, da Alcaidaria-Mor de Tomar, dos dízimos dos moinhos da Ilha da Madeira e de muitos outros haveres nos Açores, em Braga, no Porto, na Guarda, em Coimbra, em Évora, Aveiro, Gouveia, bem como se tornou Regedor das Justiças da Casa da Suplicação, entre outros cargos e funções. No meio deste universo patrimonial, Lafões ocupa um lugar de destaque e entra na alta roda da riqueza do seu primeiro Duque com título oficial dado pela própria casa real. Como D. Pedro faleceu sem deixar descendentes, veio a suceder-lhe (1761) seu irmão D. João Carlos de Bragança Sousa e Ligne, talvez o mais destacado dos nossos Duques de Lafões. Para começar, tropeçou logo na teimosia do rei D. José I, por pressão do Marquês de Pombal, em conceder-lhe o título (2º Duque) em causa. Sem ficar de cara à banda, amuado e a lamentar-se, D. João Carlos fez desta desventura o ponto forte da sua vida e da sua formação. Armado de uma grande força de vontade de viajar e continuar a aprender, ele que cursara direito canónico em Coimbra, parte para a Europa e deste vasto continente faz mais uma universidade da sua vida. Aventureiro, foi para a Inglaterra, onde o seu Royal Society o elegeu como sócio. Daqui, deu um salto para a Áustria, onde lutou contra os exércitos de Frederico II da Prússia na Guerra dos Sete Anos. Conviveu ainda com artistas, músicos e a fina flor das academias por onde andou, o que, mais tarde, lhe viria a ser muito útil. Nunca contente com os lugares que foi conhecendo, a ânsia da descoberta atirou-o para a Suíça, Itália, França, Egipto, Trácia, Grécia, Frígia, Lídia, Tessália, Mesopotâmia, Prússia, Polónia, Suécia, Dinamarca e Lapónia, entre outros locais. Verdadeiro cavaleiro andante, cada viagem foi aproveitada para acrescentar novos saberes à sua já cultura enciclopédica. Tudo isso lhe deu bagagem acrescida, no plano da ciência e do conhecimento, na hora do seu regresso a Portugal, o que veio a acontecer já no reinado de D. Maria I, a Viradeira, como veremos numa próxima edição. Cheio de garra, a sua vida ainda vai dar muito que falar... (Continua) Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, 1 Mar2018