sábado, 17 de março de 2018

Um olhar para um interior a ficar às moscas

A participação em políticas territoriais - Conferência, Universidade de Aveiro, “ A participação em planeamento do território e políticas públicas”, 23 e 24 de Fevereiro, 2017 - Contributo de Carlos Tavares Rodrigues -1 - Questão prévia: “ Quem nos perguntou onde gostámos de nascer e viver?” ---- Ver a luz do mundo num espaço que as políticas públicas do Estado Novo já tinham marcado como zonas em declínio em favor das grandes metrópoles do litoral ---- Logo, qualquer discussão para fazer reverter esta situação precisa de ir buscar armas e argumentos de peso que a História já nos negou durante décadas ---- Assim, a participação em planeamento do território já não consegue eliminar mazelas antigas e feridas que deram cabo do nosso tecido social ---- Mas, por outro lado, também não podemos atirar a toalha ao chão e, vendo tudo perdido, deixar andar -2 ---- Entra-se, assim, na pertinência desta Conferência: - 1 – Se outros nos impuseram soluções centralizadas, saibamos nós construir outros métodos de fazer política de planeamento territorial. - 2 – Nesta medida, apresentemos alguns exemplos institucionais e outros mais ligados às dinâmicas das nossas comunidades ********** - No primeiro caso, falemos das Comissões de Acompanhamento na elaboração dos PDM, PGU e PU, entre outros instumentos de planeamento municipal e respectivos processos Um exemplo de uma participação vinda de cima para baixo, em termos de legislação enquadradora, mostra bem o pendor centralista que se pretendeu com essas Comissões. Para darmos um exemplo bem distante de experiências pessoais vividas nesse âmbito, fomos até Celorico da Basto (2011) e citemos os intervenientes, a esse propósito, nas operações relativas à revisão do seu PDM – Administração Regional Hidráulica do Norte, Direcção Geral de Energia e Geologia, Autoridade Florestal Nacional, Estradas de Portugal, DREN, IGP – Instituto Geográfico de Portugal, Assembleia Municipal, Câmara Municipal, CM de Amarante, CM de Mondim do Basto, CM de Fafe, CCDRN. Não compareceram: ANPC, ARS Norte, DREconomia – Norte, DRAP N, Turismo de Portugal, DR Cultura N, IGESPAR e CM de Felgueiras. Uma forma mitigada de partcipação pública em torno dos PDM é aquela que passa pela possibilidade de recurso directo em matéria de impugnação e a declaração do pedido de ilegalidade das normas. É notório naquele exemplo de Celorico de Basto uma forma de participação mas com fraco impacto externo, isto é, com poucos reflexos no tecido social das diversas comunidades, que passam ao lado destas questões. Como forma de atenuar estas falhas, temos as divulgações na Imprensa, as Conferências, as reuniões públicas para divulgação desta temática, a fase da Discussão Pública oficial, sendo que as publicações em DR do regulamento e das versões reduzidas das plantas de ordenamento e de condicionantes ficam muito aquém das necessidades de divulgação que seria necessário proporcionar às populações a que se destinam. O mesmo raciocínio de pode aplicar aos PU, PP e outros instrumentos afins. Para Júlia Maria Lourenço (2003), em Portugal tivemos dois grandes momentos em que estes documentos de gestão do território foram bastante empolados – os Ante-Planos Gerais de Urbanização, a partir de 1934, e os PDM, nos anos 80 e 90, muito por pressão dos fundos comunitários. Mas, em qualquer destes casos, a participação pública “ fica reduzida à sua expressão processual... “ P. 44 Nestas áreas, cabe aqui uma referência aos vários estudos de impacto ambiental e aos inquéritos diversos sobre programas a implementar. De qualquer modo, têm sempre uma vertente governamental que lhes retira a função essencial de qualquer participação pública que se deseja viva e participante. Aliás, a CRP nos Artº 26 fala no direito pessoal à capacidade civil e à cidadania, no Artº27, à liberdade, no Art. 45º ao direito de reunião e de manifestação e no Art. 48ª, muito em concreto, à participação de todos os cidadãos na vida política, sendo que o Art. 52ºalude às acções populares. Para João Ferrão (2012), o ordenamento do território é função pública do Estado e sua tarefa fundamental. Logo, a ele se deve exigir a participação activa de todos os seus cidadãos. Nesta medida, as políticas públicas são uma questão de consciência política e de cidadania, como acentuam Liliana Oliveira e Anabela Carvalho em “ Envolvimento e participação dos cidadãos na ciência em Portugal e na Espanha” – Universidade do Minho, 2012. Já Ricardo Alexandre Azevedo Condesso e Fernando Condesso anotam muito especialmente que o princípio da participação nas “ Características e princípios gerais da política e do direito do planeamento territorial em Portugal” deve ser bem e profundamente aplicado. Se estas são algumas das muitas reflexões oficiais sobre participação pública, a sua maior demonstração aplicada processa-se mais na esfera da sociedade civil. ***************** - Neste segundo plano, peguemos nos GAL e nos programas LEADER, formas de planeamento de proximidade e de parcerias locais diversas. Óscar José Rover e Maria Adosinda Henriques, na sua “ A gestão democrática em debate: o programa LEADER e a sua relação com a sociedade civil local” (www. ces.uc.pt....) abordam aspectos que, desde logo, nos fazem sentir que a participação pública se torna, eventualmente, mais efectiva, por haver uma autonomia local na definição de estratégias e projectos e uma ligação aos actores sociais. Deste modo, essa participação, na organização de cada processo de desenvolvimento, é bem aceite e até estimulada. Por outro lado, a constituição das Associações que concretizam no terreno este programa parte, de imediato, com uma boa vertente popular, na medida em que entidades locais e autarquias devem conviver em regime de uma certa paridade, o que potencia a necessidade de diálogo e divulgação de cada projecto. Falando duma realidade que bem conhecemos, a ADDLAP, anotemos um de seus focos de acção que foram os Centros Rurais, por exemplo, em que a participação popular teve um papel determinante na escolha dos projectos a concretizar. Para além do LEADER, muitos outros exemplos de real participação pública têm a ver com a sociedade civil, em termos de associações, de grupos de debate e pressão, assim como é determinantes o papel da comunicação social e, mais recentemente e com uma grande acutilância, das redes sociais. Para além destes meios, a entrada em cena de redes de investigação, do trabalho académico, das acções em cooperação entre diversos agentes são uma forma de participação pública que ganha cada vez mais força e interesse. Importantes são ainda os Museus e os Centros de Interpretação, tal como os diversos fóruns de políticas públicas, como aquele que resulta do trabalho de Maria de Lurdes Rodrigues e Pedro Adão e Silva, 2012, ISCTE –Lisboa, em que se advogam os princípios da articulação entre a teoria e a prática, o acesso ao conhecimento e competências transversais e a promoção de um ambiente pluralista e diversificado, citando-se Al Gore e a sua ideia de que o debate público e racional das ideias políticas foi e continua a ser essencial na construção da democracia. Por sua vez, Paulo Neto e Maria Manuel Serrano (2015), anotam a preocupação constante em termos de auscultação e colaboração com as diversas entidades e agentes da região do Alentejo, no seu caso, cabendo aos actores locais a tarefa de conceberem os seus planos de acção. Num caminho que tem sido lento, “ ... De nada vale mudar as leis se não se mudar de vida. E mudar de vida significa, sobretudo, e no caso que esatmos a apreciar, mudar de cultura e de mentalidades quanto ao urbanismo que o País tem e quanto ao urbanismo que o País devia ter... “ (Fausto de Quadros, in 2º Colóquio Internacional – Um código de urbanismo para Portugal? – Actas, Livraria Almedina, Coimbra, 2003, 9.35). Esta conclusão, passados treze anos, ainda tem aqui plena razão de ser, não obstante se terem ampliado as formas e meios de partcipação pública, como o GEOTA e outras associações. A terminar, em Vouzela, está em curso um processo de participação pública num projecto de intervenção territorial de longo alcance – a criação do Parque Natural Vouga – Caramulo, que este Município está a dinamizar.

Sem comentários: